É a Volta de Cristo de Maneira Invisível?

O que a liderança das Testemunhas de Jeová ensina

Indiscutivelmente, a doutrina central da religião das Testemunhas de Jeová é o ensino de que Cristo se tornou invisivelmente “presente” no ano de 1914. A crença cristã tradicional, conforme declarada nas primeiras confissões conhecidas como o Credo dos Apóstolos e o Credo Niceno, é que Cristo “virá novamente para julgar os vivos e os mortos.” Em contraste, a liderança das Testemunhas de Jeová ensina que Cristo nunca retornará ou virá à terra literal, pessoal ou corporalmente. Em vez disso, o que os cristãos entendem como a Segunda Vinda realmente começou em 1914 como uma “presença” invisível na qual Cristo começou a governar no céu como rei sobre toda a terra:

Desde 1914 vivemos no período da parousía, ou presença, de Cristo. Embora a sua presença como Rei do Reino de Deus seja invisível, o cumprimento de profecias a torna evidente.1

Conforme os líderes das Testemunhas de Jeová tem apontado repetidamente, seu fundador Charles Taze Russell ensinou que a Segunda Vinda era na verdade um período da presença invisível de Cristo: “Na década dos 1870, Charles Taze Russell e seus companheiros estudantes, não sectários, nas Escrituras inspiradas, discerniram que a segunda vinda de Cristo seria invisível aos olhos humanos, em espírito, e que esta vinda iniciaria o período conhecido como sua “presença” ou parousia (em grego).”2 Um artigo publicado em 1993 afirmou confiantemente que essa presença invisível já estava em andamento:

Ele está invisivelmente presente para ‘subjugar no meio de seus inimigos’, governando ativamente como Rei para cumprir esta ordem profética. (Salmo 110:2) Já faz uns 79 anos que os humanos na Terra têm sentido os efeitos da invisível presença régia de Cristo.3

De acordo com a doutrina atual da organização, Cristo não vem pessoalmente à terra, nem mesmo no julgamento final:

Ele não precisa se mover fisicamente para ‘vir’. Antes, ele ‘vem’ no sentido de fixar a sua atenção na humanidade ou em seus seguidores, muitas vezes para julgamento. Assim, em 1914 ele ‘veio’ para iniciar a sua presença como Rei entronizado. (Mateus 16:28; 17:1; Atos 1:11) Em 1918, ele ‘veio’ como mensageiro do pacto e começou a julgar os que afirmavam servir a Jeová. (Malaquias 3:1-3; 1 Pedro 4:17) No Armagedom, ele ‘virá’ para executar o julgamento sobre os inimigos de Jeová.4

Atente-se que a posição dos líderes das Testemunhas de Jeová não é que Cristo esteja na terra, numa forma ou modo invisível. No conceito deles, Cristo não está na terra, mas simplesmente está no céu como um ser espiritual. Assim, a “presença” dele não é só invisível, mas também figurativa. Jesus jamais voltará realmente à terra.

Neste artigo, examinaremos a doutrina das Testemunhas de Jeová de que a Segunda Vinda de Cristo deve ser entendida como uma presença invisível dele com referência ao início de seu governo sobre toda a terra como rei. Em nosso próximo artigo, examinaremos o sistema cronológico da organização pelo qual ela interpreta a Bíblia para ensinar que o governo de Cristo como rei sobre toda a terra começou em 1914.

A Parousia: Vinda ou Presença?

O principal argumento que se ensina às Testemunhas de Jeová em apoio à doutrina de que a segunda vinda de Cristo é um evento invisível no céu diz respeito à palavra grega παρουσία (parousia), que duas das citações já apresentadas mencionaram. Esta palavra é encontrada 24 vezes no Novo Testamento, a maioria delas com referência a Cristo (Mat. 24:3, 27, 37, 39; 1 Cor. 15:23; 1 Tess. 2:19; 3:13; 4:15; 5:23; 2 Tes. 2:1, 8; Tiago 5:7, 8; 2 Pedro 1:16; 3:4, 12; 1 João 2:28). Uma ocorrência refere-se ao futuro surgimento do “homem que é contra a lei” (1Tes 2:9, veja também 2:8), enquanto seis ocorrências são sobre assuntos mundanos referentes aos seres humanos (1 Coríntios 16:17; 2 Coríntios 7:6, 7; 10:10; Fil. 1:26; 2:12). Em praticamente todas as versões bíblicas, esta palavra é traduzida como “vinda”, exceto em dois lugares (2 Cor. 10:10; Fil. 2:12), onde é corretamente traduzida como “presença”. Na Tradução do Novo Mundo (TNM), por outro lado, é traduzida como “presença” uniformemente em todas as 24 ocorrências. A organização fez desse entendimento da palavra parousia a pedra angular de seu argumento para uma “presença” invisível de Cristo.

De certa forma, esse debate em torno de tradução pode ser considerado dispensável. A liderança das Testemunhas de Jeová já admitiu que estar presente requer a vinda ou chegada: “Embora a presença de Jesus subentenda necessariamente a sua chegada ao local em que está presente, a tradução de pa·rou·sí·a por “vinda” dá toda a ênfase à chegada, obscurecendo a subsequente presença que segue à chegada.”5 Essa reclamação de obscurecer a “presença que segue à chegada” é estranha, pois geralmente quando falamos de alguém “chegando” entendemos que a pessoa vai permanecer presente pelo menos por um período de tempo.

Embora a palavra parousia seja corretamente traduzida como “presença” em alguns lugares no Novo Testamento (2 Coríntios 10:10; Fil. 2:12), na maioria, senão em todas as outras ocorrências, e em todas as que se referem a Cristo no futuro, é mais bem traduzida como “vinda” ou mesmo “chegada” (como se faz em quase todas as versões bíblicas modernas). Por mais de um século, a erudição bíblica reconheceu um uso específico da palavra parousia de relevância direta para a futura parousia de Cristo no Novo Testamento. No início do século vinte, Adolf Deissmann discutiu a “luz de novos textos” lançada sobre o uso da palavra parousia no Novo Testamento: “Do período ptolomaico até o segundo século DC podemos rastrear a palavra no Oriente como uma expressão técnica para a chegada ou a visita do rei ou do imperador.”6 Esse uso de parousia como termo técnico para a chegada ou visita de uma figura real é afirmado em todas as obras de referência lexical padrão (que listam e definem as palavras no Novo Testamento grego).7

Estranhamente, a liderança das Testemunhas de Jeová mencionou esse uso em algumas de suas publicações, porque os autores achavam que isso apoiava sua ênfase na parousia como denotando a presença de uma pessoa e não apenas sua chegada. Por exemplo, uma publicação da organização observou: “Outros léxicos explicam que a palavra pa·rou·sí·a denota ‘a visita dum governante’. Portanto, não se trata apenas do momento da chegada, mas da presença desde a chegada.” 8

Este uso técnico de parousia para se referir à visita de uma figura da realeza se encaixa claramente no contexto de seu uso no Novo Testamento para o retorno futuro de Cristo. Jesus “virá” como o Filho do Homem (Mat. 24:27, 37, 39), a figura da profecia de Daniel que recebe “um domínio eterno” e um “reino … que nunca será destruído” (Dan. 7:13, 14). De acordo com Paulo, após a parousia de Cristo, “ele entrega o reino a Deus o Pai” depois de reinar até que todas as autoridades adversárias sejam destruídas (1 Cor. 15:23, 24). Pedro falou sobre “o poder e a vinda [parousia] de nosso Senhor Jesus Cristo”, visto que ele e os outros apóstolos foram “testemunhas oculares de sua majestade” (2 Ped. 1:16).

A Parousia: um longo período ou um evento repentino?

As Testemunhas de Jeová encaram a parousia como um longo período (agora de mais de um século, já que afirmam que ela começou em 1914) de vida relativamente normal que conduz ao cataclísmico julgamento divino. Durante a parousia, só os espiritualmente despertos (as próprias Testemunhas de Jeová) estão cientes disso, enquanto que para todos os demais é normal até o fim. Esta teoria de uma parousia que passa despercebida depende de algumas peculiaridades na interpretação que elas fazem do Sermão do Monte, o discurso de Jesus sobre a futura destruição do templo de Jerusalém e o fim da era. Especificamente, sua interpretação depende de como abordam os versículos de Mateus 24 que usam a palavra parousia (que não aparece em nenhum lugar dos Evangelhos fora desse capítulo).

O “sinal” de sua parousia (Mat. 24:3) 

De acordo com Mateus, os discípulos de Jesus lhe perguntaram: “Dize-nos, quando acontecerão essas coisas? E qual será o sinal da tua vinda [parousia] e do fim dos tempos?” (Mat. 24:3). A liderança das Testemunhas de Jeová interpreta este “sinal” pelo qual os discípulos pediram como algo que os capacitaria a reconhecer que Jesus estava presente, embora não pudessem vê-lo pessoalmente. “Sem dúvida, a pa·rou·sí·a não é literalmente visível a olhos humanos. Se fosse, por que despendeu Jesus tanto tempo, como veremos, dando a seus seguidores um sinal para ajudá-los a discernir essa presença?”9 Este argumento presume que o “sinal” que os discípulos pediram e que Jesus forneceu, referia-se a um ou mais eventos ou fatos que seriam evidentes durante o período da “presença” de Cristo. Todavia, os relatos paralelos da pergunta dos discípulos em Marcos e Lucas contradizem totalmente esta interpretação:

“… E qual será o sinal de que tudo isso está prestes a cumprir-se?” (Marcos 13: 4).

“… E qual será o sinal de que [essas coisas] estão prestes a acontecer” (Lucas 21:7).

Este é um dos vários lugares onde a interpretação do Sermão do Monte pelos líderes das Testemunhas de Jeová falha em considerar todos os três relatos dos Evangelhos e outros trechos relacionados (Mateus 24 e 25; Marcos 13; Lucas 21:5-36; veja também Mateus 10:17-22, 39; Lucas 12:35-48; 17:22-37).10 Tanto em Marcos quanto em Lucas, está claro que o “sinal” que os discípulos pediram deveria ser um indicativo de que os eventos sobre os quais Jesus alertou estavam “prestes” a ocorrer. Assim, o sinal deveria preceder os eventos em questão, e não estar ocorrendo enquanto os eventos estivessem supostamente ocorrendo no céu e invisíveis na terra.

O relâmpago e a parousia (Mat. 24:27)

Na segunda ocorrência de parousia em Mateus 24, Jesus fez uma analogia entre sua futura parousia e o relâmpago:

“Assim, se alguém lhes disser: ‘Ele está lá, no deserto!’, não saiam; ou: ‘Ali está ele, dentro da casa!’, não acreditem. Porque assim como o relâmpago sai do Oriente e se mostra no Ocidente, assim será a vinda do Filho do homem.”(Mat. 24:26-27).

O sentido comum da declaração de Jesus aqui é que quando o Filho do Homem vier, não haverá necessidade de alguém anunciar o fato, porque será óbvio para todos. A interpretação deste versículo pela liderança das Testemunhas de Jeová vira o significado das palavras de Jesus de cabeça para baixo: A presença invisível do Filho do Homem não ficará escondida porque as Testemunhas de Jeová estarão empenhadas em espalhar a mensagem:

Ao contrário, não haveria nada a esconder quanto a Jesus ter vindo como Rei, no começo da sua presença régia. Conforme Jesus predisse, lampejos da verdade bíblica continuam a raiar sobre grandes regiões em todo o globo, do Oriente ao Ocidente. Deveras, as Testemunhas de Jeová, como hodiernos portadores de luz, mostram ser a ‘luz das nações, para que a salvação [de Jeová] venha a existir até a extremidade da terra’. — Isaías 49:6.11

Aqui está um exemplo do mau hábito dos líderes das Testemunhas de Jeová de enxergarem a organização deles dentro da Bíblia. É a vinda repentina e gloriosa do próprio Filho do Homem que é representada pela imagem do relâmpago, como as palavras de Lucas tornam ainda mais claro:

“Porque, como o relâmpago ilumina desde uma extremidade inferior do céu até à outra extremidade, assim será também o Filho do homem no seu dia.” (Lucas 17:24).

Os dias de Noé e a parousia (Mat. 24:37-39) 

As duas últimas ocorrências da palavra parousia em Mateus 24 aparecem num trecho em que Jesus usou Noé e o dilúvio como analogia:

Como foi nos dias de Noé, assim também será na vinda do Filho do homem. Pois nos dias anteriores ao dilúvio, o povo vivia comendo e bebendo, casando-se e dando-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca; e eles nada perceberam, até que veio o dilúvio e os levou a todos. Assim acontecerá na vinda do Filho do homem. (Mat. 24:37-39)

A liderança das Testemunhas de Jeová argumenta que, nesses versículos, Jesus comparou o período de sua parousia com o tempo de Noé antes do Dilúvio. “Podemos lembrar-nos de que Jesus, ao tecer um paralelo entre sua presença e os “dias de Noé”, declara que no tempo de Noé as pessoas “não fizeram caso” até que lhes sobreveio a destruição aquosa, e “assim será a presença do Filho do homem”.”12 O argumento aqui presume que Jesus estava comparando diretamente a parousia ao período antes do Dilúvio, e não ao próprio Dilúvio.

Jesus não usou a expressão “os dias de Noé” para se referir a um período dentro da vida de Noé que levou ao Dilúvio. Se alguém quisesse fazer da parousia um período específico paralelo aos “dias de Noé”, então seria necessário tratar “os dias de Noé” como um período de centenas de anos, incluindo toda a vida dele antes e depois do Dilúvio. Claramente, esse não era o ponto de Jesus. Em vez disso, seu ponto era que “a vinda do Filho do Homem” pegará as pessoas de surpresa, da mesma forma que o Dilúvio pegou as pessoas de surpresa. (Mat. 24:39-44; veja também o trecho paralelo em Lucas 17:26 -30).

A Vinda de Cristo: Visível ou Invisível?

A principal base, teologicamente falando, para a liderança das Testemunhas de Jeová negar uma segunda vinda literal de Cristo é a sua doutrina de que Jesus não foi ressuscitado fisicamente dos mortos. Segundo as Testemunhas de Jeová, Cristo desistiu de sua vida humana para sempre como o preço de “resgate” e, portanto, não poderia retomar a vida humana incorporada em sua ressurreição. Visto que agora ele vive como uma criatura espiritual angelical no céu, ele não voltará pessoal, corporal ou visivelmente à terra. Em dois artigos anteriores desta série, mostramos que a Bíblia não ensina a interpretação da liderança das Testemunhas de Jeová sobre a morte de Cristo como um resgate e que a Bíblia ensina claramente que Jesus ressuscitou dos mortos com a imortalidade em um corpo humano glorificado.13

Ainda que as Testemunhas de Jeová estivessem certas em pensar que Jesus não ressuscitou dos mortos em um corpo humano, esta premissa não provaria que ele não estava voltando visivelmente à terra. Afinal, os líderes das Testemunhas de Jeová admitem que Cristo apareceu várias vezes aos seus discípulos em forma humana visível, embora supostamente em um corpo temporário materializado apenas para a ocasião.

“O mundo não me verá mais” (João 14:19)

Para reforçar sua doutrina de que o mundo nunca veria Cristo, mesmo no final dos tempos, a liderança das Testemunhas cita João 14:19, que a TNM traduz da seguinte forma:

Em breve o mundo não me verá mais, contudo vocês me verão, porque eu vivo e vocês viverão.

Daí eles explicam: “Jesus havia prometido a seus apóstolos que voltaria e os levaria consigo para o céu. Eles o poderiam ver, porque seriam criaturas espirituais como ele é. Mas o mundo não o veria mais.”14 Esta interpretação depende de pontuar João 14:19 com uma vírgula antes da palavra “porque”, de modo que a declaração de Jesus: “eu vivo e vocês viverão” explica por que eles serão capazes vê-lo e o mundo não: tanto ele como eles viverão como espíritos no céu, onde poderão se ver. No entanto, a versão da TNM de João 14:19 é altamente incomum. Quase todas as versões bíblicas têm um ponto ou ponto e vírgula antes da palavra “porque” e dizem algo muito próximo do seguinte:

Dentro de pouco tempo o mundo já não me verá mais; vocês, porém, me verão. Porque eu vivo, vocês também viverão. (NVI)

Uma razão pela qual essa tradução deve ser aceita é que, no versículo imediatamente anterior, Jesus disse aos seus discípulos: “Não os deixarei órfãos; voltarei para vocês.” (João 14:18, grifo acrescentado). A declaração de Jesus aqui se refere claramente à sua vinda a eles após sua ressurreição (veja também João 20:19, 26), não à ida deles até Jesus no céu em um futuro distante. Além disso, Jesus disse-lhes que o veriam  em “pouco tempo”, o que novamente indica suas aparições na ressurreição para eles.

Assim, o ponto de Jesus em João 14:19 era que suas aparições na ressurreição não seriam eventos públicos. Ele não estava dizendo que nunca mais voltaria à terra.

“Este Jesus… virá da mesma maneira” (Atos 1:9-11) 

Um dos trechos mais preocupantes para a doutrina da liderança das Testemunhas de que Cristo nunca retornará à terra é o relato de Lucas sobre a ascensão de Jesus:

Tendo dito isso, foi elevado às alturas enquanto eles olhavam, e uma nuvem o encobriu da vista deles. E eles ficaram com os olhos fixos no céu enquanto ele subia. De repente surgiram diante deles dois homens vestidos de branco, que lhes disseram: “Galileus, por que vocês estão olhando para o céu? Este mesmo Jesus, que dentre vocês foi elevado ao céu, voltará da mesma forma como o viram subir.” (Atos 1:9-11)

As publicações da organização trataram desse trecho problemático várias vezes, inclusive nas notas de estudo de Atos na Bíblia de Estudo online da TNM. A explicação é que “as pessoas em geral não viram Jesus partindo. Somente os apóstolos ficaram sabendo que Jesus tinha deixado a Terra e retornado ao céu, para a companhia de seu Pai.”15

A explicação da liderança das Testemunhas de Jeová aqui simplesmente não procede. Os anjos estavam comentando sobre a maneira como Jesus voltaria, não quem iria “ver” seu retorno. Para entender a declaração dos anjos de maneira adequada, devemos deixar o contexto imediato nos informar sobre o que o “modo” ou maneira da partida de Cristo significou. Nada se diz sobre o tamanho do grupo ou as limitações de quem foi capaz de ver o que aconteceu. (Na verdade, só os apóstolos viram Jesus subir, mas o texto não faz abordagem alguma disso.) Em vez disso, o que se diz é que Cristo “foi elevado às alturas enquanto eles olhavam, e uma nuvem o encobriu da vista deles.” (Atos 1:9). Este é o “modo” que Jesus foi e, portanto, o modo como ele “virá” será o mesmo ao contrário:

– Cristo foi “para o céu”; ele “virá” do céu.

– Cristo foi elevado; ele será enviado para baixo.

– Ele foi encoberto em uma nuvem quando partiu; ele aparecerá de uma nuvem quando retornar.

– Ele foi tirado da vista humana; ele voltará à vista humana.

“O próprio Senhor descerá do céu” (1 Tes. 4:15-17) 

Talvez a referência mais conhecida à segunda vinda de Cristo nas epístolas de Paulo seja a que se encontra em 1 Tessalonicenses:

Dizemos a vocês, pela palavra do Senhor, que nós, os que estivermos vivos, os que ficarmos até a vinda [parousia] do Senhor, certamente não precederemos os que dormem. Pois, dada a ordem, com a voz do arcanjo e o ressoar da trombeta de Deus, o próprio Senhor descerá do céu, e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois disso, os que estivermos vivos seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, para o encontro com o Senhor nos ares. E assim estaremos com o Senhor para sempre. (1 Tes. 4:15-17, grifos acrescentados).

Paulo diz explicitamente que o Senhor (que obviamente é Jesus) “descerá do céu” (v. 16). Embora seja teoricamente possível que a Bíblia use essa linguagem figurativamente, não há razão para pensar que seja o caso aqui. De fato, Paulo é bastante enfático neste ponto, visto que ele diz que “o próprio Senhor” descerá, adicionando o pronome “próprio” (grego, autos) para dar ênfase. O ponto é que o Senhor não “descerá” por meio de mensageiros ou agentes, mas virá pessoalmente.

A descrição que Paulo faz da descida do Senhor reflete a antiga prática cultural de um governante que se aproxima de uma cidade em triunfo e é recebido por uma delegação que o acompanha até a cidade. Conforme já explicado, o próprio termo parousia, que Paulo usa aqui, era um termo técnico que se referia a um rei ou outro governante em visita oficial. A aproximação da figura da realeza seria tipicamente anunciada com fanfarra de trombeta, como Paulo afirma que ocorrerá quando o Senhor vier. Paulo então diz que nós, que ainda estivermos vivos naquele tempo, ‘encontraremos o Senhor nos ares’, o que, no contexto de uma entrada triunfal, retrata os crentes encontrando-se com o Senhor enquanto ele desce para acompanhá-lo à terra, assim como uma delegação de uma cidade faria para um rei que se aproxima.

“Cristo… aparecerá uma segunda vez” (Heb. 9:28) 

O texto final que consideraremos está no livro de Hebreus:

Se assim fosse, Cristo precisaria sofrer muitas vezes, desde o começo do mundo. Mas agora ele apareceu uma vez por todas no fim dos tempos, para aniquilar o pecado mediante o sacrifício de si mesmo. Da mesma forma, como o homem está destinado a morrer uma só vez e depois disso enfrentar o juízo, assim também Cristo foi oferecido em sacrifício uma única vez, para tirar os pecados de muitos; e aparecerá segunda vez, não para tirar o pecado, mas para trazer salvação aos que o aguardam. (Heb. 9:26-28, NVI, grifos acrescentados).

O significado deste trecho é bastante direto. Cristo “apareceu uma vez por todas” (pephanerōtai) para aniquilar o pecado e “aparecerá” (ophthēsetai) uma segunda vez para trazer a salvação para nós pela qual ele pagou em sua primeira vinda. O primeiro “aparecimento” de Cristo, é claro, foi em pessoa, corporalmente e visível. Seu segundo “aparecimento” também será em pessoa, corporalmente e visível. Ele será visto (ophthēsetai é uma forma futura passiva do grego horaō, ver). As palavras “uma segunda vez” deixam claro que esse futuro aparecimento será semelhante ao aparecimento que o antecedeu. Assim, ao contrário da doutrina da liderança das Testemunhas de Jeová, este trecho ensina explicitamente a ideia de duas vindas de Jesus Cristo.

PARA SABER MAIS

Aos leitores interessados em mais informações sobre como surgiu e se desenvolveu essa ideia da “presença invisível” de Cristo, bem como uma análise bíblica mais abrangente da validade disso, indicamos os seguintes artigos:

A origem e a natureza da doutrina da parousia de Cristo como uma presença invisível

Charles Taze Russell e o arrebatamento secreto

“Vinda” ou “Presença” — O Que os Fatos Revelam?

NOTAS

1 – “O Messias! O meio divino de salvação”, revista A Sentinela de 15 de dezembro de 2009, pág. 24.

2 – Livro Está Próxima a Salvação do Homem da Aflição Mundial! (Sociedade Torre de Vigia, 1976), pag. 282.

3 – “Lança-se luz sobre a presença de Cristo”, revista A Sentinela de 1º de maio de 1993, pág. 11.

4 – “O escravo fiel” passa pela prova!”, revista A Sentinela de 1º de março de 2004, pág.18.

5 – “Presença”, em Estudo Perspicaz das Escrituras (Sociedade Torre de Vigia, 1988, 2015, 2018), Volume 2, pág. 710. Este verbete no dicionário bíblico da Sociedade é a abordagem mais extensa do significado de parousia.

6 – Adolf Deissmann, Light from the Ancient East: The New Testament Illustrated by Recently Discovered Texts of the Graeco-Roman World (Luz do Antigo Oriente: O Novo Testamento Ilustrado por Textos Recentemente Descobertos do Mundo Greco-Romano), 2ª ed., Traduzido para o inglês por Lionel R. M. Strachan (Londres: Hodder & Stoughton, 1910), pág. 372 (veja as págs. 372–78).

7 – Bem recentemente, “παρουσία, etc.,” no New International Dictionary of New Testament Theology and Exegesis (Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Novo Testamento), 2ª ed. em inglês, revisada por Moisés Silva (Grand Rapids: Zondervan, 2014), Vol. 3, pág. 648 (647–57).

8 – “Vinda de Jesus ou presença de Jesus — qual?”, revista A Sentinela de 15 de agosto de 1996, pág. 11; veja também “A presença do Messias e seu governo”, em A Sentinela de 1º de outubro de 1992, pág. 16.

9 – “A presença do Messias e seu governo”, pág. 16.

10 – Para uma tabela comparando estes trechos em colunas paralelas, consulte Robert M. Bowman Jr., “Olivet Discourse and Parallels” [O Discurso do Monte das Oliveiras e Paralelos],

https://faiththinkers.org/olivet-discourse-and-parallels

11 – “Lança-se luz sobre a presença de Cristo”, em A Sentinela de 1º de maio de 1993, pág. 12.

12 – Verbete “Presença”, em Estudo Perspicaz das Escrituras (Sociedade Torre de Vigia, 1988, 2015, 2018), Volume 2, pág. 712.

13 – Robert M. Bowman Jr.,  “Is Jesus’ death a ‘corresponding ransom’?” (É a morte de Jesus um ‘resgate correspondente’?) e “Was Christ raised as an angelic spirit?” (Foi Cristo ressuscitado como um espírito angélico?). Estas são as partes 14 e 15 desta série, Respostas às Testemunhas de Jeová.

14 – Verbete “Volta de Cristo”, em Raciocínios à Base das Escrituras (Sociedade Torre de Vigia, 1985, 1989), pág. 434.

15 – “Atos dos Apóstolos, Notas marginais do capítulo 1”, na Tradução do Novo Mundo da Bíblia Sagrada (Edição de Estudo) (Sociedade Torre de Vigia, 2015, 2020), referente a Atos 1:11.

16 – Veja Robert M. Bowman Jr., “Is Jesus Michael the Archangel?” (É Jesus o Arcanjo Miguel?) nesta série, para mais informações sobre 1 Tessalonicenses 4.

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