“Vinda” ou “Presença” — O Que os Fatos Revelam?
Introdução
Na pergunta feita a Jesus em Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 3, “Qual será o sinal da tua vinda”, a palavra “vinda” é a tradução da palavra grega parousia. Parousia significa primariamente “presença”, mas hoje está bem estabelecido que no tempo de Jesus ela era também usada em outro sentido. Apesar disso, a liderança das Testemunhas de Jeová insiste que o único significado bíblico correto do termo é “presença”. Nisto eles evidentemente têm “interesses ocultos”.
A alegação que fazem de que a parousia de Cristo começou em 1914 e que desde aquele ano temos visto o sinal disso nos acontecimentos mundiais dá a entender que os discípulos de Jesus perguntaram por um sinal indicando que Cristo tinha vindo e estava invisivelmente presente, não por um sinal que antecederia a vinda dele, indicando a iminência desta. Conseqüentemente a Tradução do Novo Mundo da Bíblia Sagrada, da organização, traduz a pergunta em Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 3 da seguinte maneira:
“Diga-nos: Quando acontecerão essas coisas e qual será o sinal da sua presença e do final do sistema de coisas?”
A ideia por trás desta tradução é que a segunda vinda de Cristo consiste em duas fases, a primeira sendo uma presença invisível durante um intervalo até a segunda fase, a da revelação final da presença dele ao mundo na batalha do Armagedom. Esta ideia não se originou com a liderança das Testemunhas. Ela remonta à década de 1820, quando foi originalmente sugerida pelo bem conhecido banqueiro e expositor bíblico londrino Henry Drummond, que depois se tornaria um dos fundadores da Igreja Católica Apostólica, de Edward Irving. A teoria da “presença invisível” ou “vinda em duas fases”, mais conhecida hoje como teoria do “arrebatamento secreto”, foi logo aproveitada por outros expositores de profecias. Foi adotada não só pelos Irvinguitas como também pelos seguidores de John Nelson Darby, a Irmandade de Plymouth, através da qual se espalhou amplamente na Inglaterra, nos EUA e em outros países. Tornou-se muito popular especialmente entre os milenaristas, cristãos que acreditavam num milênio literal, futuro, na terra.1
Para muitos dos defensores da ideia da “vinda em duas fases” a palavra grega parousia tornou-se um ponto crucial da discussão. Geralmente se defendia que esta palavra se refere à primeira fase da vinda de Cristo, sua presença invisível “no ar”. Era comum afirmar-se que as palavras gregas ephiphánia, “aparecer”, e apokálypsis, “revelação”, por outro lado, aplicam-se à segunda fase da vinda, a intervenção de Cristo nos acontecimentos mundiais na batalha do Armagedom. Modificar a tradução da palavra parousia de “vinda” para “presença” altera radicalmente o sentido, não só da pergunta dos discípulos, como também da resposta de Jesus. Isto é ilustrado pelos argumentos defendidos em 1866 pelo Reverendo Robert Govett, o mais proeminente defensor inglês da ideia do arrebatamento secreto no século 19:
Se dissermos, ‘Qual é o sinal da Tua vinda?’ (Mat, xxiv. 3) então, … estamos perguntando pelo sinal do movimento futuro do Salvador desde os mais altos céus. Se dissermos, ‘Qual é o sinal da tua presença‘ estamos pedindo uma prova da existência secreta de Jesus no ar, depois de sua ação para com a terra ter sido suspensa por algum tempo.
Os discípulos perguntam, ‘Qual será o sinal da tua Presença?’ (versículo 3). Portanto, isto nos assegura que eles imaginavam que Jesus estaria secretamente presente. Não precisamos de um sinal para aquilo que se mostra abertamente.2
Estes argumentos apresentados em 1866 foram aproveitados por muitos outros expositores, entre eles Charles Taze Russell. Em 1876, sob a influência do adventista Nelson H. Barbour e seus associados, Russell adotou “presença” como o único significado aceitável de parousia para explicar como Cristo poderia ter vindo em 1874 (como tinha sido predito por Barbour) sem ter sido notado por alguém. A adoção deste conceito, portanto, deveu-se a uma predição fracassada e foi usada como um meio de explicar o fracasso dela em 1874. Esta explicação foi mantida pelos seguidores de Russell até o início da década de 1930, quando foi subitamente “descoberto” que a “presença invisível” de Cristo tinha começado em 1914 em vez de em 1874!
Todavia, essa ênfase em “presença” como sendo o único significado bíblico correto de parousia parece ter muito pouco apoio entre os tradutores da Bíblia. Na realidade, todos exceto um número bem pequeno de tradutores da Bíblia preferem as expressões “vinda”, “advento”, “chegada”, ou termos similares, em vez de “presença”. Um pesquisador e colecionador de Bíblias, que é Testemunha de Jeová, William J. Chamberlin, de Clawson, Michigan, EUA, verificou cuidadosamente como a palavra parousia é traduzida em Mateus capítulo vinte e quatro, versículos 3, 27, 37 e 39, em centenas de Bíblias diferentes desde o Novo Testamento de William Tyndale de 1534 até traduções publicadas tão recentemente como 1980, e ele elaborou listas extensivas do modo como 137 traduções deste período apresentam aqueles versículos. Um exame destas listas forneceu alguns resultados muito interessantes.
“Parousia” nas traduções da Bíblia
Antes da segunda metade do século dezenove poucos tradutores da Bíblia estavam evidentemente inclinados a traduzir parousia por “presença”. Dos tradutores ingleses do Novo Testamento, desde Tyndale no século dezesseis até Robert Young em 1862, Chamberlin encontrou apenas um tradutor, Wakefield, que no seu Novo Testamento (1795) usou “presença” como uma tradução de parousia em Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 39. Porém, mesmo Wakefield preferiu traduzi-la como “vinda” nos versículos 3, 27 e 37 do mesmo capítulo. Mais ainda, Daniel Scott em sua tradução de Mateus publicada em 1741 (New Version of St. Matthew’s Gospel [Nova Versão do Evangelho de S. Mateus]) apresenta a palavra “presença” nas notas, enquanto mantém a palavra “vinda” no texto principal.
No século dezenove, o primeiro a traduzir parousia em Mateus capítulo vinte e quatro como “presença” numa versão inglesa, foi provavelmente o Dr. Robert Young, em sua Tradução Literal da Bíblia Sagrada (1862), sendo a razão, como o título indica, a tentativa dele de apresentar os significados estritamente literais das palavras gregas, em lugar dos significados num idioma moderno. Dois anos depois, Benjamin Wilson, um dos primeiros líderes de um pequeno grupo religioso conhecido hoje como Conferência Geral da Igreja de Deus, publicou a The Emphatic Diaglott (1864), que também traduz parousia como “presença” em todas as 24 ocorrências no Novo Testamento.3
Daí, em 1868-1872, Joseph B. Rotherham publicou seu The Emphasized New Testament [Novo Testamento Enfatizado]. Mas foi só na terceira edição revisada em inglês, publicada em 1897, que Rotherham mudou sua tradução da palavra parousia de “vinda” para “presença”. Por quê? A razão que ele apresenta no Apêndice a essa terceira edição indica que ele tinha adotado, pelo menos em parte, a ideia da “vinda em duas fases”. Ele explica que a parousia de Cristo pode ser, não apenas um evento, mas também “um período – mais ou menos extenso, durante o qual certas coisas devem acontecer.” Sem dúvida, Rotherham foi influenciado em sua maneira de pensar sobre este assunto por sua amizade íntima com alguns escritores do jornal O Arco-Íris, da qual o próprio Rotherham se tornou editor durante os últimos três anos de sua vida.4
Outros tradutores do século dezenove que usaram “presença” para parousia em Mateus capítulo vinte e quatro em versões em inglês foram W. B. Crickmer (The Greek Testament Englished [O Novo Testamento Anglicizado], 1881), J. W. Hanson (The New Covenant [O Novo Pacto], 1884) e Ferrar Fenton, que começou a publicar as primeiras partes de sua tradução, The Bible in Modern English [A Bíblia em Inglês Moderno], em 1880.
No século 20, as versões em inglês que traduzem parousia em Mateus capítulo vinte e quatro como “presença” são A Concordant Version [Uma Versão Concordante] (1926), de A. E. Knoch, Bible Numerics [Bíblia Numérica] (2.ª ed. em inglês, 1935), de Ivan Panin, New World Translation of the Christian Greek Scriptures [Tradução do Novo Mundo das Escrituras Gregas] da Torre de Vigia (1950), o New Testament [Novo Testamento] de James L. Tomanek (1958), Restoration of Original Holy Name Bible [Bíblia Restauração do Nome Sagrado Original] (1968), Today’s English New Testament [Novo Testamento em Inglês de Hoje] (1972), de Donald Klingensmith e New Testament [Novo Testamento] do Dr. Dymond (1972; apenas em forma manuscrita).5 Outras traduções apresentam às vezes “presença” como o significado literal de parousia em notas de rodapé, mas preferem “vinda”, “chegada” (ou outras expressões do mesmo gênero) no texto principal.
Assim, com estas comparativamente poucas exceções, tanto tradutores antigos como modernos preferiram verter parousia por “vinda”, “advento”, “chegada”, ou algum termo similar em vez de “presença” nos textos que tratam da segunda vinda de Cristo. Eles fazem isto apesar do fato de todos concordarem que “presença” é o significado primário da palavra. Por quê? Será que é lógico acreditar que tantos peritos na língua original do Novo Testamento de alguma maneira não conseguiram encontrar o verdadeiro sentido do termo grego?
Que dizer das versões mais antigas do Novo Testamento, as versões Latina, Siríaca, Copta e Gótica, que foram feitas enquanto o grego koiné original do Novo Testamento ainda era uma língua viva? O que revelam estas sobre a maneira como aqueles tradutores antigos compreenderam a palavra parousia?
A palavra “parousia” nas versões mais antigas do Novo Testamento
É bem conhecido que a versão Vulgata Latina foi feita pelo grande erudito do quarto século Hieronymus, hoje mais conhecido como São Jerônimo. Ele realizou seu trabalho de tradução em fins do quarto século, começando com os evangelhos em 383 D.C. Curiosamente, em 20 das 24 ocorrências de parousia no Novo Testamento, Jerônimo escolheu a palavra latina para “vinda”, adventus, da qual deriva a palavra portuguesa “advento”. As quatro exceções são 1 Coríntios 16:17; 2 Coríntios 10:10; Filipenses 2:12 e 2 Pedro 1:16. Nestas ocorrências a Vulgata usa a palavra latina para “presença”, praesentia. Vale notar que apenas o último destes quatro textos se refere à parousia de Cristo. Em todas as demais dezesseis ocorrências onde parousia se refere à vinda de Cristo, Jerônimo preferiu a palavra latina adventus. Por quê? Evidentemente ele achou que em textos que tratam da parousia de Jesus Cristo a palavra significa “vinda” em vez de “presença.” Estava ele errado em pensar assim?
Na realidade, a Vulgata Latina não é a versão bíblica latina mais antiga. Ela foi precedida por numerosas traduções latinas, algumas das quais foram feitas no segundo século. Na verdade, a Vulgata de Jerônimo não era uma tradução e sim uma revisão destas versões latinas anteriores (embora comparadas com os textos originais em hebraico, aramaico e grego), uma revisão feita com o fim de produzir uma versão latina mais autoritativa do que a diversidade de versões latinas antigas. Estas versões mais antigas são designadas pelo nome comum de Bíblia Latina Antiga ou Vetus Latina (em latim). Assim como a Vulgata, estas versões também traduzem normalmente parousia por adventus. As cinco exceções (2 Coríntios 10:10; Filipenses 2:12; 2 Tessalonicenses 2:9; 2 Pedro 3:4, 12) incluem apenas dois trechos que tratam da parousia de Cristo. Portanto, assim como a Vulgata, as versões latinas antigas preferem traduzir parousia pela palavra adventus, fazendo isso em 15 dos 17 textos que se referem à parousia de Cristo.6 (Veja a tabela anexa, intitulada “A Palavra Parousia nas Mais Antigas Traduções Latinas do Novo Testamento”).
A palavra latina adventus significa literalmente “uma vinda para”, embora às vezes podia ser usada no sentido de “presença”. No entanto, nas versões latinas já mencionadas, a palavra adventus é evidentemente usada com o sentido de “vinda”, em contraste com praesentia, a palavra latina para “presença”.
A versão siríaca Peshitta foi feita no quinto século, mas assim como a Vulgata Latina foi precedida por versões mais antigas, conforme evidenciado, por exemplo, pelos manuscritos sírios Curetoniano e Sinaítico.7 Se, como geralmente se defende, a língua original de Jesus e de seus apóstolos era o aramaico, estas versões siríacas podem de fato refletir palavras usadas pelo próprio Jesus e pelos apóstolos, incluindo a palavra siríaca para parousia em Mateus capítulo vinte e quatro, me’ thithá!8 Do mesmo modo que a palavra latina adventus, me’thitá significa literalmente “vinda”, derivando de um verbo que significa “vir”.
A Versão Gótica foi produzida por Wulfila em meados do quarto século, sendo por isso ligeiramente anterior à tradução da Vulgata Latina. Esta versão traduz parousia pelo substantivo gótico cums, uma palavra parecida com a palavra inglesa “come” (vir). Significa, mui naturalmente, “vinda”.9
Portanto, a conclusão notável é que as versões mais antigas do Novo Testamento – produzidas quando o grego koiné ainda era uma língua viva e pelas mãos de tradutores, alguns dos quais conheciam aquela língua muito bem desde sua infância – preferiram verter o substantivo grego parousia por palavras que significam “vinda” em vez de “presença” em trechos que se referem à segunda vinda de Cristo. Eles fizeram isto apesar do fato de parousia ter como significado primário “presença” e ser traduzida desta maneira em outros lugares. A questão é: Por que razão eles traduziram a palavra como “vinda” quando se referia à parousia de Jesus Cristo, mas como “presença” quando se referia à parousia, por exemplo, do apóstolo Paulo (2 Coríntios 10:10; Filipenses 2:12)? Durante séculos isto permaneceu uma espécie de mistério, até que – no início do século vinte – novas descobertas possibilitaram que os eruditos modernos em Novo Testamento grego descobrissem a resposta para este enigma.
A PALAVRA PAROUSIA NAS MAIS ANTIGAS TRADUÇÕES LATINAS DO NOVO TESTAMENTO
Textos que usam parousia: | Vulgata (4.º século) | Latina Antiga (2.º século) | Pais da Igreja | (1.º ao 5.º século) |
Adventus | Praesentia | |||
Mateus 24:3 | adventus | adventus | muitas | nenhuma |
24:27 | adventus | adventus | muitas | nenhuma |
24:37 | adventus | adventus | muitas | nenhuma |
24:39 | adventus | adventus | muitas | Vitorino, d. 303 |
1 Cor. 15:23 | adventus | adventus | muitas | Agostinho, d. 430 |
16:17 | praesentia | adventus | nenhuma? | Ambrosiasto 5.º séc., et al. |
2 Cor. 7:6 | adventus | adventus | Ambrosiasto | nenhuma |
7:7 | adventus | adventus | Ambrosiasto | nenhuma |
10:10 | praesentia | praesentia | nenhuma? | Ambrosiasto |
Fil. 1:26 | adventus | adventus | Ambrosiasto | nenhuma |
2:12 | praesentia | praesentia | nenhuma? | Ambrosiasto |
1 Tess. 2:19 | adventus | adventus | Tertuliano d. 220 Ambrosiasto | nenhuma |
3:13 | adventus | adventus | Tertuliano Ambrósio d. 397 Ambrosiasto | nenhuma |
4:15 | adventus | adventus | muitas | nenhuma |
5:23 | adventus | adventus | Ireneu, d. 190 Tertuliano, em muitos lugares, et al | Tertuliano, em um lugar |
2 Tess. 2:1 | adventus | adventus | Tertuliano | nenhuma |
2:8 | adventus | adventus | Tertuliano Ambrosiasto et al | Ireneu Hilário, d. 367 et al |
2:9 | adventus | praesentia | muitas | Agostinho |
Tiago 5:7 | adventus | adventus | nenhuma | nenhuma |
5:8 | adventus | adventus | nenhuma | nenhuma |
2 Pedro 1:16 | praesentia | (falta) | nenhuma | nenhuma |
3:4 | adventus | praesentia | nenhuma | nenhuma |
3:12 | adventus | praesentia | (Pelágio) | (Auctor) |
1 João 2:28 | adventus | adventus | nenhuma | nenhuma |
O uso técnico da palavra parousia
Escavações feitas durante o século 19 nos locais das antigas colônias do mundo greco-romano trouxeram à luz centenas de milhares de inscrições em pedra e metal e textos em papiro, pergaminho e fragmentos de cerâmica.
Estes novos achados revolucionaram o estudo do idioma grego original do Novo Testamento. Descobriu-se que o grego do Novo Testamento nem era um “grego bíblico” especial, como alguns acreditavam, nem o grego literário, arcaico, usado por autores da época, mas era em grande parte influenciado pelo grego vernáculo usado por pessoas normais em casa e em qualquer lugar, a língua comum da vida diária, a forma falada do grego koiné.
As consequências desta descoberta para a compreensão do idioma grego original da Bíblia foram originalmente exploradas em detalhe por Adolf Deissmann, mais tarde professor na Universidade de Heidelberg (e depois na Universidade de Berlim), que começou a publicar suas descobertas em 1895. Outros eruditos, que se aperceberam da importância da descoberta, logo começaram a analisar os textos recém-encontrados. Lançou-se nova luz sobre a maneira como eram usadas e compreendidas muitas palavras gregas no tempo em que o Novo Testamento foi escrito.
Uma das palavras, cujo significado foi esclarecido pelos novos textos, foi a palavra parousia. As novas descobertas foram resumidas pelo professor Deissmann em 1908, em sua obra agora clássica Licht vom Osten (Luz do Oriente). A abordagem que ele fez da palavra parousia, que abrange várias páginas, começa com a seguinte explanação:
Ainda outra ideia central da mais antiga adoração cristã recebe luz dos novos textos, a saber, parousia [parousia], ‘advento, vinda’, uma palavra que expressa as esperanças mais ardentes de um S. Paulo. Podemos agora dizer que a melhor interpretação da esperança cristã primitiva da Parousia é o antigo texto sobre o Advento, ‘Eis, teu Rei chegou.’ [Mateus 21:5] Desde o período ptolemaico até o 2.º séc. D.C. conseguimos rastrear a palavra no Oriente como uma expressão técnica para a chegada ou a visita do rei ou do imperador.10
Em seguida o professor Deissmann apresenta muitos exemplos deste uso do termo. Por ocasião de uma visita oficial, real, deste tipo, como por exemplo, quando o imperador romano fazia uma parousia nas províncias do Oriente, “as estradas eram reparadas, multidões reuniam-se para prestar homenagem, havia procissões destes indivíduos vestidos de branco, toques de trombeta, aclamações, discursos, petições, ofertas e festividades.”11 Com freqüência se reconhecia uma nova era a partir da parousia do rei ou imperador, e cunhavam-se moedas para comemorá-la. Quando da visita ou parousia do Imperador Nero, por exemplo, em cujo reinado Paulo escreveu suas cartas para Corinto, as cidades de Corinto e Patras cunharam “moedas-advento”. Estas moedas trazem a inscrição Adventus Aug(usti) Cor(inthi), evidenciando que o adventus latino era usado como um equivalente do termo grego parousia naquelas ocasiões.12
Desde aquela época, a pesquisa adicional feita por numerosos eruditos, como os professores George Milligan, James Hope Moulton e outros, confirmou ainda mais as conclusões de Deissmann, que foi quem primeiro demonstrou este uso técnico de parousia.13 Este uso do termo explicou claramente o motivo de as versões mais antigas do Novo Testamento traduzirem-no por palavras que significam “vinda” em textos relacionados com a parousia de Jesus Cristo. Hoje, todos os léxicos e dicionários de grego indicam este significado da palavra, além de seu significado primário (“presença”), e existe um consenso geral entre os eruditos modernos de que parousia no Novo Testamento, quando usada para se referir à segunda vinda de Cristo, é usada em seu significado técnico de visita real.14
Será a vinda dele “uma visita de um rei”? Certamente que sim. A Bíblia apresenta repetidamente a parousia de Cristo como uma vinda “com poder e grande glória”, quando ele se sentar “sobre o seu trono glorioso” e for acompanhado por “todos os seus anjos”. (Mateus 24:30; 25:31) Uma poderosa “voz” de um arcanjo, “um grande som de trombeta”, e outros sinais notáveis contribuem adicionalmente para a descrição da parousia de Cristo como uma visita oficial, real, notada por todos e fazendo com que “todas as tribos da terra batam em si mesmas em lamento” ao vê-lo. A sua vinda não é de modo algum apresentada como uma presença invisível, secreta, que passa despercebida à grande maioria da humanidade – Mateus 24:27, 29-31; 1 Tessalonicenses 4:15, 16; Apocalipse 1:7.
O alegado apoio erudito
Em apoio de sua insistência em “presença” como o único significado aceitável de parousia na Bíblia, a liderança das Testemunhas de Jeová às vezes cita algumas traduções da Bíblia e ocasionalmente um erudito em grego. Todavia, é significativo que a maioria destas referências sejam obsoletas, datando de uma época em que o uso técnico do termo ainda era desconhecido.
Assim, a abordagem da palavra parousia, publicada na Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas – Com Referências, revisão de 1986, páginas 1516 e 1517 (Apêndice 5b), começa por citar quatro traduções da Bíblia que apresentam parousia como “presença” em Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 3, sendo que três delas (The Emphatic Diaglott, de Benjamin Wilson, a The Emphasized Bible, de J. B. Rotherham, e The Holy Bible in Modern English, de F. Fenton) foram produzidas antes da descoberta de Deissmann e de seus colegas. A quarta é a própria Tradução do Novo Mundo das Escrituras Gregas Cristãs da Torre de Vigia, de 1963! O artigo que vem em seguida é completamente dominado por uma citação do trabalho The Parousia [A Parousia], escrito pelo Dr. Israel P. Warren, que argumenta em defesa de “presença” como sendo o significado bíblico correto de parousia. Infelizmente, o trabalho do Dr. Warren data de 1879!15
Todavia, o artigo faz também referência a três léxicos do grego moderno. Indica-se que tanto A Greek-English Lexicon [Léxico Greco-Inglês] de Liddell e Scott, como TDNT (Theological Dictionary of the New Testament [Dicionário Teológico do Novo Testamento]) de Kittel/Friedrich apresentam “presença” como o significado de parousia. Mas por que não se diz aos leitores que estes mesmos dois léxicos explicam em seguida que parousia era também usada no sentido técnico de “visita de um rei”? Por que não se informa aos leitores que estes mesmos léxicos enfatizam que esta é a maneira como a palavra é usada no Novo Testamento quando se refere à parousia de Jesus Cristo? O último destes dois léxicos, TDNT, de fato só gasta algumas frases sobre o significado primário, “presença”. O resto do artigo, abrangendo 14 páginas no total, é uma abordagem do uso técnico do termo, demonstrando que é assim que a palavra é usada nos textos do Novo Testamento que tratam da parousia de Jesus Cristo! Quem lê a publicação da Torre de Vigia nunca saberia isto e é improvável que tivesse como descobrir. Uma argumentação que precisa fazer esse uso obviamente tendencioso da evidência é bem pouco recomendável.
Por fim, o léxico de Bauer é citado como dizendo que parousia “tornou-se o termo oficial para uma visita de uma pessoa de elevada posição, esp(ecialmente) de reis e imperadores que visitam uma província.” Curiosamente, esta declaração é citada como se desse apoio adicional à afirmação de que a Bíblia só usa parousia no sentido de “presença”, apesar do fato de o léxico de Bauer apresentar aqui o uso técnico do termo, a visita oficial de um rei ou imperador (ou uma pessoa de elevada posição).
Entretanto, existe um dicionário moderno de grego-inglês que parece dar certo apoio ao entendimento da liderança das Testemunhas de Jeová acerca da parousia de Cristo como um período de “presença invisível,” seguido por uma “revelação” final da sua presença na batalha do Armagedom. É o Expository Dictionary of New Testament Words [Dicionário Expositivo das Palavras do Novo Testamento], de W. E. Vine, que define o termo parousia da seguinte maneira:
PAROUSIA … denota tanto uma chegada como a consequente presença junto a … Quando usada para referir-se à volta de Cristo, no Arrebatamento da Igreja, significa não apenas a Sua vinda momentânea para buscar Seus santos, mas a Sua presença com eles, desde aquele momento até a Sua revelação e manifestação ao mundo.
Esta descrição de parousia soa muito parecida com a que os líderes das Testemunhas de Jeová defendem. Portanto, não é surpresa alguma constatar que a definição que Vine apresenta da palavra é extensamente citada na página 710 do dicionário bíblico da Torre de Vigia Estudo Perspicaz das Escrituras (Volume 2). Pode ser surpresa para alguns, porém, saber que Vine foi um dos mais árduos defensores da doutrina do “arrebatamento secreto” no século 20. Isto evidentemente o fez definir a palavra parousia de um modo que apoiasse seus conceitos teológicos. Contudo, isto só serviu para colocá-lo em conflito com os resultados da erudição moderna.
Conforme já se observou, a ideia do “arrebatamento secreto” teve seus defensores mais zelosos entre os seguidores de John Nelson Darby, chamados de Irmandade. Em 1847, uma divergência entre Darby e George Müller, o líder de um grupo da Irmandade em Bristol, Inglaterra, dividiu o movimento em dois: a Irmandade Exclusiva, liderada por Darby, e a Irmandade Aberta, que se alinhou com Müller. Embora o próprio Müller rejeitasse o conceito de “arrebatamento secreto”, o movimento da Irmandade Aberta aderiu à ideia e continuou a pregá-la. W. E. Vine, que nasceu em 1873, esteve associado com a Irmandade Aberta e parece ter estado desde sua juventude. Ele foi um grande erudito, e seu Dicionário é inestimável como manual para o estudo do Novo Testamento. Porém, sua definição da palavra parousia, foi evidentemente influenciada por sua aderência à doutrina do “arrebatamento secreto”, uma doutrina que ele deve ter estimado muito desde a juventude. Ele a defendeu em vários livros escritos em colaboração com um concrente, o Sr. C. F. Hogg, como por exemplo, The Epistles of Paul and the Apostle to the Thessalonians [As Epístolas de Paulo e o Apóstolo aos Tessalonicenses] (1914), Touching the Coming of the Lord [Alcançando a Vinda do Senhor] (1919) e The Church and the Tribulation [A Igreja e a Tribulação] (1938). Este último livro foi publicado como resposta ao ataque do Rev. Alexander Reese contra a ideia do “arrebatamento secreto”, no livro The Approaching Advent of Christ [A Aproximação do Advento de Cristo], publicado no ano anterior (1937). O bem conhecido exegeta e comentarista bíblico, professor F. F. Bruce, embora tendo os mesmos antecedentes religiosos do Dr. Vine, faz os seguintes comentários críticos a respeito do uso que Vine e Hogg fazem da palavra parousia em seu sistema escatológico:
Talvez o aspecto mais distintivo de Alcançando a Vinda tenha sido o tratamento que se deu à palavra parousia. Eles insistiram no sentido primário de ‘presença’ e interpretaram a palavra em seu uso escatológico como significando a presença de Cristo com Sua Igreja glorificada no intervalo que antecede Sua manifestação em glória….
Pode-se colocar em dúvida se esta interpretação de parousia faz jus ao sentido que a palavra tem no grego helenístico. Na verdade os autores apelaram ao léxico de Cremer em apoio de seu conceito; mas Cremer escreveu muito antes de o estudo de papiros vernaculares ter revolucionado nosso conhecimento da linguagem helenística comum.16
Portanto, a referência da liderança das Testemunhas de Jeová à definição de parousia do Dr. Vine não tem grande peso. Examinada com mais atenção, mostra ser basicamente tão obsoleta quanto as outras referências da organização.
O que mostra o contexto bíblico?
Quando uma palavra tem mais de um sentido, o contexto deve ser sempre considerado ao determinar como ela deve ser compreendida. Será que o contexto de Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 3, indica que o escritor usou parousia em seu sentido técnico ou em seu sentido primário? A liderança das Testemunhas de Jeová afirma que este último sentido, “presença”, é indicado pelo contexto. A Sentinela de dezembro de 1949 disse numa nota da página 186:
O fato que a chegada ou visita dum rei ou imperador era um dos sentidos técnicos de parousía não nega nem refuta que nas Escrituras Sagradas ela tem o sentido de presença com respeito a Cristo Jesus. Para mostrar o significado da palavra o contexto da Escritura é mais potente do que qualquer uso papíreo alheio da palavra de sentido técnico.
Concordamos que o contexto nas Escrituras é mais potente nessa circunstância. A questão é: Será que o contexto de Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 3, realmente mostra que os discípulos pediram um sinal que indicaria que Cristo estava presente, e não um sinal que indicaria que ele estava vindo? Existe alguma razão para acreditar que eles na verdade pensavam na vinda de Cristo como uma “presença invisível” que só poderia ser reconhecida por meio de um sinal visível?
Quando esta questão foi apresentada aos líderes das Testemunhas de Jeová, eles tiveram de admitir que os discípulos “não tinham ideia de que ele [Cristo] dominaria qual glorioso espírito desde os céus e, por conseguinte, não sabiam que a sua segunda presença seria invisível.”17
Se os discípulos não faziam ideia de que Cristo no futuro viria para estar invisivelmente presente, como poderiam ter pedido um sinal dessa presença invisível? Isto, por si só, mostra que Mateus não poderia ter usado parousia no sentido de “presença”. Evidentemente, eles pediram que Jesus lhes desse um sinal que anunciaria que a prometida vinda ou chegada de Cristo estava iminente. Eles queriam um sinal, não para tomarem conhecimento de algo que já estaria ocorrendo, mas um sinal que desse aviso antecipado que o evento desejado estava prestes a ocorrer, era de fato iminente. Sua linguagem, as palavras que usaram para fazer a pergunta, estariam em harmonia com esse desejo.
Que este é o entendimento correto é claramente confirmado pela maneira como Marcos registrou a pergunta deles. Na versão de Marcos, o pedido de um “sinal” refere-se apenas à destruição do templo. Certamente é impossível pensar que eles precisariam de algum “sinal” para convencê-los de que o templo tinha sido destruído ou que sua destruição estava acontecendo. Eles queriam alguma indicação antecipada desse evento!18
A maneira como Jesus respondeu à pergunta deles confirma isto totalmente. Depois de mencionar acontecimentos futuros que também incluíam a destruição de Jerusalém, Jesus, nos versículos 29 e 30, descreveu o sinal que acompanharia sua futura vinda “nas nuvens” e acrescentou:
Aprendei, pois, da figueira o seguinte ponto, como ilustração: Assim que os seus ramos novos se tornam tenros e brotam folhas, sabeis que o verão está próximo. Do mesmo modo, também, quando virdes todas estas coisas, sabei que ele está próximo às portas. — Mateus 24:32, 33, TNM.
Deve-se notar que Jesus não disse que quando eles vissem os ramos novos da figueira ficarem tenros e brotarem folhas, saberiam que “o verão está presente”. Estes sinais antecederiam o verão e provariam que ele está próximo. Similarmente, o sinal da vinda do Filho do homem provaria que “ele está próximo às portas”, e não invisivelmente presente. A comparação é entre o verão estar próximo e Cristo estar próximo. É evidente que Jesus disse a seus discípulos para estarem atentos a um sinal que iria anteceder sua chegada ou “visita real”, e não um sinal que viria depois de sua chegada e que mostrasse que ele estava invisivelmente presente. Portanto, a partir do contexto de Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 3, é muito claro que os discípulos pediram o sinal da vinda iminente de Cristo, não um sinal de sua presença. O contexto, portanto, apóia fortemente a conclusão de que Mateus usou a palavra parousia em sentido técnico, para significar a chegada ou visita de um rei ou alto dignitário.19
Também é notável que dos quatro escritores dos evangelhos, Mateus é o único que usa a palavra parousia, e isto só no capítulo vinte e quatro. Os quatro versículos que contêm o termo (3, 27, 37 e 39) têm paralelos em Lucas, mas em vez de parousia Lucas normalmente usa “dia” ou “dias”. Quando Jesus compara sua vinda com o relâmpago, que ilumina repentinamente com um clarão todo o céu visível, do leste ao oeste, ele acrescenta, segundo Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 27, “Assim será a vinda (parousia) do Filho do homem.” Lucas em vez disso, diz no capítulo dezessete, versículo 24, “assim será o Filho do homem no seu dia.” Assim, a parousia de Cristo e o dia (heméra) são usados de modo equivalente para se referir ao momento do aparecimento ou da revelação de Cristo. Isto se evidencia com ainda maior clareza na comparação que Cristo fez entre sua vinda e a vinda do dilúvio dos dias de Noé, quando os homens “não fizeram caso, até que veio o dilúvio; assim será a vinda [parousia] do Filho do homem.” (Mateus 24:37, 39) A versão de Lucas também acrescenta a destruição de Sodoma nos dias de Ló e diz: “do mesmo modo será naquele dia em que o Filho do homem há de ser revelado.” – Lucas 17:26-30.
É óbvio que aqui Jesus não está comparando a parousia com os períodos que antecederam o dilúvio e a destruição de Sodoma. É desta maneira que os líderes das Testemunhas de Jeová explicam isso, referindo-se à expressão “os dias do Filho do homem” em Lucas capítulo dezessete, versículo 26. Pelo contrário, Jesus evidentemente compara sua futura vinda com a vinda inesperada do dilúvio, e com a destruição súbita de Sodoma. Assim como aqueles dois acontecimentos, sua parousia será um acontecimento revolucionário, uma intervenção divina que mudará imediatamente a situação para toda a humanidade de uma maneira muito perceptível. A comparação entre Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 39, e Lucas capítulo dezessete, versículo 30, mostra que a parousia denota “o dia em que o Filho do homem há de ser revelado.” Portanto, o fato de se associarem “os dias de Noé” com “os dias do Filho do homem” em Lucas capítulo dezessete, versículo 26, significa apenas que assim como os homens nos dias de Noé foram subitamente apanhados desprevenidos em suas ocupações diárias, assim será também nos dias em que o Filho do homem for revelado. Sua intervenção repentina virá sem que nada tenha alertado as pessoas antecipadamente, colocando-as a par da verdadeira situação.
À primeira vista poderia parecer que a pergunta, “Qual será o sinal da tua vinda (parousia)”, em Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 3, não tem um paralelo claro no evangelho de Lucas. A pergunta dos discípulos, da maneira que é apresentada em Lucas capítulo vinte e um, versículo 7, parece estar relacionada apenas com a destruição do templo: “…qual será o sinal quando estas coisas [a destruição do templo, conforme os versículos 5 e 6] estão destinadas a ocorrer?” Contudo, um dos testemunhos manuscritos mais importantes do texto mais antigo dos evangelhos, o Códice D (Bezae Cantabrigensis), apresenta a pergunta de modo diferente, tornando-a muito semelhante à de Mateus 24:3, com uma importante exceção:20
Mateus 24:3: “Qual será o sinal da tua vinda [parousia]?”
Lucas 21:7: “Qual será o sinal da tua vinda [eleuseos]?”
Como se pode ver, a única diferença é que, segundo este manuscrito Lucas não usa parousia, mas éleusis, a palavra grega comum para “vinda”. O Dr. Schoonheim, depois de examinar cuidadosamente estas semelhanças, até conclui que, “Lucas 21:7, segundo [o Códice] D, apresenta uma tradição mais original”, pois é uma tradução do siríaco ou até do aramaico me’ thitha’ (“vinda”).21
Portanto, o contexto bíblico não apóia a afirmação de que parousia tem de ser traduzida como “presença” em Mateus capítulo vinte e quatro. O fato de os discípulos não imaginarem a vinda de Cristo como uma “presença invisível”, o modo como Jesus respondeu à pergunta deles, bem como os textos paralelos no evangelho de Lucas, todos mostram que essa tradução é insustentável. Em Lucas, fala-se da parousia de Cristo como o “dia” de Cristo, ou até como “o dia em que o Filho do homem há de ser revelado.” E, conforme é mostrado pelo Códice D, a palavra parousia também pode ser substituída pelo nome grego comum para “vinda”, éleusis. Paralelos similares podem ser encontrados em outros textos que falam da parousia de Cristo, nos quais são usados termos relativos à manifestação ou revelação de Jesus. Assim, em 1 João 2:28, o apóstolo exorta os cristãos a “permanece[r] em união com ele, para que, quando ele for manifestado [em grego, phaneróo], tenhamos franqueza no falar, e não sejamos envergonhados para nos afastar dele na sua vinda [parousia].”Aqui, João compara claramente a parousia de Cristo com o dia de seu aparecimento ou manifestação. Similarmente, o apóstolo Paulo ora para que os cristãos em Tessalônica possam ter os seus corações estabelecidos “inculpáveis na santidade perante o nosso Deus e Pai, na vinda [parousia] de nosso Senhor Jesus com todos os seus santos sagrados.” (1 Tessalonicenses 3:13) Esta vinda do Senhor com todos os seus santos sagrados ou anjos é mencionada também em Judas versículo 14 e em Mateus capítulo dezesseis, versículos 27 e 28, mas em vez de parousia, tanto Judas como Mateus usam formas de érchomai, o verbo mais comum para “vinda”, e relacionado com o substantivo éleusis. Todos os três textos referem-se à mesma ocasião, a vinda do Senhor com todos os seus santos para executar julgamento. Traduzir parousia por “presença” em 1 Tessalonicenses capítulo três, versículo 13, como faz a liderança das Testemunhas de Jeová, é ignorar esta inter-relação com outros trechos bíblicos paralelos.
Naquelas parábolas em que Jesus enfatizou a necessidade de os seus servos se manterem alertas e vigilantes, devemos observar que ele apresenta seu julgamento como o que vem em seguida à chegada do amo à casa. É a vinda ou chegada do amo que ele descreve, e não uma “presença invisível”. Não é como se o amo entrasse sorrateiramente na área e começasse invisivelmente a julgar o que os seus servos estavam fazendo, para só depois se revelar a eles. Pelo contrário, o regresso do amo, embora talvez seja inesperado, torna-se rapidamente evidente para todos os seus servos, os fiéis e os infiéis, e manifesto desde o princípio, e o julgamento dele não é feito a partir de algum lugar invisível escondido, e sim de uma maneira muito aberta. – Compare com Mateus 24:45-51; 25:14-30; Marcos 13:32-37; Lucas 12:35-48; 19:12-27.
Assim, a evidência das traduções mais antigas, bem como das traduções modernas e dos léxicos do idioma grego, e especialmente do contexto e de trechos relacionados, atestam todos que o uso de parousia em Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 3, não pode se referir a uma “presença invisível” de uma “vinda em duas fases”, mas se refere à futura chegada e aparecimento de Cristo como Rei para julgamento, “com poder e grande glória” e acompanhado por seus santos anjos.
FONTE
Este artigo é o Apêndice B do livro O Sinal dos Últimos Dias – Quando, de Carl Olof Jonsson e Wolfgang Herbst, publicado originalmente em 1987.
Versão em português brasileiro, com revisões e atualizações: Julho/2022.
NOTAS
1 – Para uma investigação detalhada sobre a origem e o desenvolvimento da ideia da “presença invisível” e de como veio a ser adotada por Russell e seus seguidores, veja os artigos A origem e a natureza da doutrina da parousia de Cristo como uma presença invisível e Charles Taze Russell e o arrebatamento secreto, ambos publicados neste site.
2 – Jornal milenarista britânico The Rainbow [O Arco-Íris], junho de 1866, pág. 265 e julho de 1866, pág. 302. O Arco-Íris, mais do que qualquer outro jornal milenarista na Inglaterra, cedeu espaço aos expositores da ideia do arrebatamento secreto, e Govett teve muitos artigos dele publicados nesse jornal. O principal trabalho de Govett sobre o assunto foi O Arrebatamento dos Santos para a Presença do Senhor Jesus, de 357 páginas, publicado em inglês em 1852. Toda a abordagem ao longo do livro se baseia na mudança que Govett faz da palavra “vinda” para “presença”!
3 – Veja o livro Historical Waymarks of the Church of God [Marcos Históricos da Igreja de Deus], publicado pela sede do movimento em Oregon, Illinois 61061, em 1976. O grupo defende pontos de vista similares aos dos Cristadelfianos e das Testemunhas de Jeová em assuntos tais como a trindade, a alma e o inferno de fogo.
4 – Veja a nota de rodapé 2 deste artigo. Rotherham foi editor de O Arco-Íris de 1885 a 1887. Veja também Reminiscences [Reminiscências] de Rotherham, compilado por seu filho, J. George Rotherham (Londres, pouco depois de 1906), págs. 76-79.
5 – Que pelo menos alguns destes tradutores foram influenciados por sua aderência à doutrina da “presença invisível” é ilustrado pela tradução que Dymond faz de Mateus 24:3: “Mas, nesse meio tempo dize-nos que outros acontecimentos indicarão que tu voltaste à terra para estar invisivelmente presente.”
6 – Veja Bibliorum Sacrorum Latinae Versiones Antiquae (As Antigas Versões Latinas das Escrituras Sagrados), D. Petri Sabatier, publicado originalmente em 1743. O fac-símile impresso em Munique, Alemanha em 1974 foi consultado para esta consideração.
7 – Veja as extensas considerações de Bruce M. Metzger em As Versões Antigas do Novo Testamento, Oxford 1977, págs. 3-82 em inglês, e de Matthew Black em Die alten Übersetzungen des Neuen Testaments, editado por K. Aland, Berlim, Nova Iorque, 1972, págs. 120-159 em alemão.
8 – Een Semasiologisch onderzoek van Parousia met betrekking tot het gebruik in Mattheus 24 (Uma pesquisa semântica sobre a parousia, com destaque para seu uso em Mateus 24), Pieter Leendert Schooheim, Aalten, Holanda, 1953, págs. 20-22, 259. Acredita-se geralmente que o manuscrito Curetoniano é uma revisão do anterior texto siríaco Sinaítico, que por sua vez foi originalmente escrito em Antioquia, no norte da Síria. Por esta razão, o siríaco destes manuscritos, sendo um dialeto do aramaico, é provavelmente bem próximo do dialeto aramaico palestiniano usado por Jesus e por seus apóstolos.
9 – As antigas versões Copta, Etíope e Armênia não foram pesquisadas.
10 – Citado da 4ª edição de Light from the Ancient East [Luz do Antigo Oriente], de L. R. M. Strachan, reimpresso pela Casa Publicadora Baker, Grand Rapids, Michigan, 1978, p. 368.
11 – “Some Observations on the parousía.” [Algumas Observações sobre a parousia], B. M. Nolan, The Irish Theological Quarterly [Publicação Trimestral Teológica Irlandesa], Vol. XXXVI, maio de 1969, pág. 288.
12 – Deissmann, pág. 371. É significativo que a palavra grega epipháneia, “aparecer”, normalmente aplicada à segunda fase da vinda de Cristo pelos adeptos da ideia do arrebatamento secreto, foi também usada em certa época nas “moedas-advento” gregas como um equivalente do latim adventus! (Deissmann, pág. 373.)
13 – O estudo lingüístico mais completo do termo parousia é o de Pieter Leendert Shoohein, Een semasiologisch onderzoek van Parousia (Uma pesquisa semântica sobre a Parousia), Aalten, Holanda, 1953. Esta obra tem aproximadamente 300 páginas, incluindo um resumo em inglês de 33 páginas.
14 – Veja por exemplo, o Theological Dictionary of the New Testament [Dicionário Teológico do Novo Testamento], Kittel/Friedrich, Vol. V, págs. 858-871, e o longo artigo no Dictionnaire de la Bible, Supplément (Dicionário da Bíblia, Suplemento), em francês, editado por L. Pirot, A. Robert e H. Cezalles, Paris-VI, 1960, págs. 1332-1420. Outro estudo interessante é o feito por J. T. Nélis em Bibel-Lexikon (Léxico Bíblico), Tübingen, Alemanha, 1968, págs. 1304-1312.
15 – The Parousia [A Parousia], D. D., Israel P. Warren, Portland, Maine, EUA, 1879, págs. 12-15.
16 – F. F. Bruce citado no livro de Percy O. Ruoff, intitulado W. E. Vine, His Life and Ministry [W. E. Vine, Sua Vida e Ministério], Londres 1951, págs. 75, 76.
17 – A Sentinela de 1º de agosto de 1965, pág. 479 (Perguntas dos Leitores). A mesma conclusão é apresentada em A Sentinela de 15 de julho de 1974, pág. 434: “Quando perguntaram a Jesus: ‘Qual será o sinal da tua presença,’ eles não sabiam que a sua presença futura seria invisível.”
18 – Isto refuta o argumento às vezes usado pela liderança das Testemunhas de Jeová de que “se a segunda presença de Jesus havia de ser visível e tangível, dificilmente haveria necessidade de um sinal” – Veja a Despertai! de 8 de junho de 1968, página 28.
19 – No livro Aproximou-se o Reino de Deus de Mil Anos (1975), página 169, a liderança das Testemunhas de Jeová faz uma tentativa de adaptar o uso técnico de parousia à sua doutrina da “presença invisível” ao dizer que, “Uma ‘visita’ inclui mais do que apenas a ‘chegada’. Inclui uma ‘presença.” É evidente que isto é verdade. Mas eles tentam obscurecer a diferença óbvia entre os dois usos de parousia. Numa visita real a chegada do rei ou imperador era a fase mais espetacular da visita, algo que chamava a atenção de todos. Se os discípulos, conforme mostra a evidência, pediram o sinal da visita oficial, real, visível de Cristo, eles deviam ter em mente algo que antecederia essa visita. Não haveria qualquer sentido em pedir um sinal que mostraria que o rei já tinha chegado.
20 – Embora o manuscrito seja apenas do 5.º ou 6.º século D.C., suas variantes textuais têm muitas vezes apoio nos Pais da Igreja do segundo século e nas versões Latina Antiga e Siríaca. Alguns eruditos até mesmo o encaram como um representante mais fiel do texto original do que o [manuscrito] Vaticano ou Sinaítico. Conforme demonstrado por A. J. Wensinck, ele é influenciado por expressões idiomáticas aramaicas com mais freqüência do que o [manuscrito] Vaticano ou Sinaítico e, segundo o Dr. Matthew Black, ele representa, por esse motivo, “mais fielmente o contexto aramaico da tradição Sinóptica do que os manuscritos não-Ocidentais.” – Matthew Black, An Aramaic Approach to the Gospels and Acts [Uma Abordagem Aramaica aos Evangelhos e Atos], 2.ª ed., 1954, págs. 26-34, 212, 213.
21 – Schoonheim, págs. 16-28, 259, 260. Isto refutaria a afirmação na Tradução do Novo Mundo – Com Referências de 1986, revisada, página 1517 de que “As palavras parousia e éleusis não são usadas intercambiavelmente.”