“Um Espírito Não Tem Carne Nem Ossos…”

Os Discípulos de Jesus Acreditavam em Fantasmas?

Os discípulos de Jesus acreditavam em “fantasmas”? Com isto queremos dizer: eles acreditavam que espíritos imortais de pessoas falecidas poderiam circular entre nós? Na tentativa de manter a doutrina da imortalidade da alma, alguns autores parecem acreditar justamente nisso. Consideremos a seguinte citação de Robert Morey:

É óbvio que os judeus durante o primeiro século, bem como durante a era do Antigo Testamento, acreditavam na sobrevivência da mente ou alma do homem após a morte do corpo porque eles claramente acreditavam em ‘fantasmas’ (Lucas 24:37). Death and the Afterlife [Morte e Vida Após a Morte], pág. 62

Declarações como esta parecem ser válidas quando tomadas com base na leitura superficial, mas quando examinamos atentamente as evidências das Escrituras, surge um quadro muito diferente. Consideremos primeiramente o trecho de Lucas citado acima:

Enquanto falavam sobre isso, o próprio Jesus apresentou-se entre eles e lhes disse: “Paz seja com vocês!” Eles ficaram assustados e com medo, pensando que estavam vendo um espírito [grego: pneuma]. Ele lhes disse: “Por que vocês estão perturbados e por que se levantam dúvidas em seus corações? Vejam as minhas mãos e os meus pés. Sou eu mesmo! Toquem-me e vejam; um espírito não tem carne nem ossos, como vocês estão vendo que eu tenho”. Tendo dito isso, mostrou-lhes as mãos e os pés. – Lucas 24:36-40 (Nova Versão Internacional)

Em primeiro lugar, deve-se notar que este trecho simplesmente não diz o que alguns como Morey gostariam que ele dissesse; ou seja, que os discípulos acreditavam estar vendo o espírito de um homem morto. Já vimos várias vezes como palavras como “alma” e “espírito” evocam imagens mentais que podem ou não ser verdadeiras em relação ao ensino das Escrituras. É evidente que Robert Morey está presumindo que os discípulos acreditavam que estavam vendo o espírito consciente de um homem morto, simplesmente por causa do modo como ele entende a palavra “espírito” neste texto. Mas é claro que esse raciocínio não prova absolutamente nada.

No entanto, creio que precisamos perguntar: Se os discípulos acreditavam que estavam vendo o “fantasma” de Jesus, por que então eles ficaram tão aterrorizados? Ademais, as mesmas pessoas que tentam usar este trecho para ensinar a imortalidade da alma também ensinam que a parábola do Rico e Lázaro foi a descrição mais completa de Jesus sobre a condição dos mortos. Isto cria uma dificuldade séria. Se os discípulos entenderam a parábola do Rico e Lázaro como um ensinamento literal e enfático sobre a condição dos espíritos dos mortos, certamente eles entenderiam que a aparição de tal espírito no meio deles era impossível!

Não há qualquer dificuldade nesse trecho a partir do momento em que paramos de ler suposições e ideias que simplesmente não estão no texto. Como já vimos muitas vezes, os homens NUNCA são chamados de “espíritos” na Bíblia. Pelo contrário, sempre se traça a linha entre a natureza carnal e a natureza espiritual. Os homens são convertidos a uma natureza espiritual apenas na ressurreição, quando a união da carne e do espírito é consumada. Mas mesmo assim eles são HOMENS de natureza espiritual, não espíritos. “Semeia-se um corpo natural, é levantado um corpo espiritual.” (1 Cor 15:44) Mas ainda há um corpo, embora mudado.

À luz disso, o texto diante de nós faz todo o sentido:

Vejam as minhas mãos e os meus pés. Sou eu mesmo! Toquem-me e vejam; um espírito não tem carne nem ossos, como vocês estão vendo que eu tenho.

Os discípulos certamente não acreditavam que estavam vendo o “fantasma” de um homem morto. Alguns podem ter dificuldade em compreender isso porque é difícil para eles entender que os homens nunca são referidos como “espíritos” nas Escrituras depois de nos terem ensinado esse erro por tanto tempo. O homem tem um espírito, ou seja, sua mente, vontade, sede das emoções etc; a área de seu pensamento que é capaz de discernir o certo e o errado e se comunicar com Deus, mas isso está longe do ensino de que o homem tem um “fantasma” que habita dentro de sua carne.

Toda vez que “espírito” é usado em referência a um ser consciente, é sempre uma referência a Deus (“Deus é espírito”, João 4:24), anjos (“não são todos eles espíritos que ministram…?”, Hebreus 1:14), demônios (“e quando o espírito impuro o sacudiu”, Marcos 1:26), ou à natureza do homem APÓS a ressurreição. A Bíblia simplesmente não admite um ‘pneuma’ existindo como um ‘fantasma’ consciente entre a morte e a ressurreição.

Além disso, se compararmos este trecho de Lucas com outro trecho, podemos ver claramente que os discípulos não acreditavam que estivessem vendo o espírito de um homem morto.

Mas, à quarta vigília da noite, Jesus foi até eles, andando sobre o mar. E quando os discípulos o viram andando sobre o mar, eles perturbaram-se, dizendo: É um espírito [grego: phantasma]; e gritaram de medo.Mas imediatamente Jesus falou com eles, dizendo: Tende bom ânimo, sou eu, não temais.” –  Mateus 14:25-27 (Versão Rei Jaime)

A linguagem aqui é quase paralela à de Lucas. Em ambos os casos, os discípulos acreditavam que estavam vendo algo diferente de Jesus. No entanto, neste caso, a palavra grega que foi traduzida como “espírito” é phantasma, da qual obtemos nossa palavra “fantasma”.

Se é difícil para o leitor compreender que os homens nunca são chamados de “espíritos” na Bíblia, então certamente devemos pelo menos ser capazes de entender que os homens nunca são referidos como “fantasmas”, estejam eles vivos ou mortos. A Bíblia jamais fala de um homem morto se transformando em um fantasma. Portanto, em ambos os casos, os discípulos obviamente acharam que estavam vendo uma aparição de um ser espiritual, não o fantasma de um homem morto.

Biblicamente, então, temos apenas três opções: Eles pensaram que estavam contemplando Deus, eles pensaram que estavam vendo um anjo, ou acharam que estavam vendo uma manifestação demoníaca.

Logicamente, a terceira opção é a única que faz sentido e harmoniza TODAS as evidências bíblicas. Quando Jesus morreu, os discípulos sabiam que ele estava realmente morto; que ele não poderia aparecer a eles. Portanto, faz todo o sentido que eles ficariam aterrorizados quando algo que acreditassem ser um “espírito” surgisse no meio deles. Eles sabiam que não poderia ser Jesus, então eles acharam que estavam vendo uma manifestação demoníaca.

Temos também evidências externas para mostrar que isto é exatamente o que eles acreditavam. Inácio que morreu por volta de 100 DC escreveu para os que estavam em Esmirna:

Pois sei e creio que ele estava na carne mesmo depois da ressurreição; e quando ele veio a Pedro e àqueles que o acompanhavam, ele lhes disse: “Toquem-me e vejam que eu não sou um demônio desencarnado.”

Isto prova que houve um entendimento muito precoce de que esta era a verdadeira interpretação do texto. Portanto, todas as linhas de evidência, interna, externa e lógica, apontam para o fato simples de que as Escrituras de modo algum ensinam que os discípulos de Jesus acreditavam em fantasmas; pelo menos não no sentido de estes serem espíritos conscientes de homens mortos.

Extraído de Man Became a Living Soul – Appendix C (O Homem Tornou-se Uma Alma Vivente – Apêndice C)

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