ArtigosEnsinos e História das Testemunhas de Jeová

Evidência Bíblica Contra a Cronologia das Testemunhas de Jeová

Introdução

Entre as doutrinas fundamentais da organização das Testemunhas de Jeová estão as relacionadas com 1914. Elas são a base da autoridade espiritual que os líderes delas reivindicam sobre a comunidade inteira. Este artigo examina de maneira breve as evidências bíblicas, com um pouco de apoio secular, para explicar porque essa cronologia de 1914 está errada.

A organização ensina que em 1914, no final dos “tempos dos gentios” (também conhecidos como “tempos determinados das nações”; Lucas 21:24), Cristo retornou invisivelmente (Mateus 24:3) e recebeu o Reino Messiânico. Afirma que começaram os “últimos dias” (Atos 2:17; 2 Timóteo 3:1; 2 Pedro 3:3; etc.) a “conclusão do sistema de coisas”, um grande trabalho de colheita de cristãos verdadeiros e que entre 1914 e 1919 ocorreu um período de “inspeção espiritual” por parte de Jesus que havia retornado. Ela ensina também que em 1919 a “verdadeira congregação cristã” foi restaurada, em 1919 o “escravo fiel e discreto” foi nomeado sobre todos os “domésticos” de Jesus (Mat. 24:45) e que em 1919 a “religião falsa” (também conhecida como “Babilônia, a Grande”; Apo. 14:8) caiu. Essas doutrinas foram cruciais para a afirmação deles ao longo do século 20 de que em 1919 todos os “cristãos ungidos” foram designados como “o escravo fiel e discreto de todos os bens de Cristo” na Terra (esse ensino foi mudado na edição de 15 de julho de 2013 de A Sentinela).

Desde 1876, a frase “tempos dos gentios” e a data de 1914 foram âncoras doutrinárias para o fundador da organização, C. T. Russell, e têm sido assim para os seguidores da organização desde então. 1914 continua sendo a data-chave no ensino do “fim dos tempos”, embora eles tenham revisado ou abandonado a maior parte de suas alegações iniciais sobre 1914.

Em 1879, C. T. Russell começou a publicar o que se tornou a atual revista The Watchtower (A Sentinela) e nessa publicação ele promoveu a data de 1914. Ainda antes, em 1876, ele publicou um artigo no pequeno periódico religioso The Bible Examiner [O Examinador da Bíblia] que defendia a data de 1914 como o fim dos tempos dos gentios. Russell tomou emprestadas essas ideias de Nelson Barbour, um “Segundo Adventista” semi-independente que originou a combinação das ideias de 1914 e dos tempos dos gentios na edição de junho de 1875 de sua revista Herald of the Morning [O Arauto da Manhã].

A data de 1914 é determinada da seguinte forma (conforme A Sentinela de 1° de outubro de 2014, pág. 10; “Quando o Reino de Deus começou a governar? — Parte 1”): A organização interpreta o sonho do rei babilônico Nabucodonosor, descrito em Daniel 4, sobre uma grande árvore no centro da Terra, como significando que o governo direto de Deus sobre os seres humanos foi interrompido, mas seria restaurado depois de passarem “sete tempos”. Alega-se que a interrupção começou em 607 A.E.C., com a destruição de Jerusalém, e terminou em 1914. Lucas 21:24 é interpretado como significando que o governo de Deus, representado por Jerusalém, corresponde a esse período, que é chamado de “os tempos determinados das nações” ou “os tempos dos gentios”. Eles calculam a duração como 2.520 anos, com base na declaração de Daniel de que Nabucodonosor ficaria louco por “sete tempos”, mais uma declaração em Apocalipse 12 de que três tempos e meio equivalem a 1.260 dias. Em seguida, eles aplicam o chamado princípio “um dia por um ano”. Portanto, 1.260 dias (3 ½ tempos) x 2 = 2.520 dias. Um dia por um ano equivale a 2.520 anos. A passagem de 2.520 anos a partir de 607 A.E.C. leva a 1914 E.C. (sem o ano zero).

A organização deriva o ano 607 começando pela data universalmente aceita de 539 A.E.C. para a conquista da cidade da Babilônia pelo rei persa Ciro, o Grande, e observando que em seu primeiro ano de reinado ele emitiu um decreto que permitia que os judeus retornassem a Judá. Em seguida, eles supõem que os judeus retornaram a Judá no outono de 537 A.E.C. Em seguida concluem que “os 70 anos” de que Jeremias falou (Jer. 25:11, 12; 29:10) são um período de desolação da terra de Judá e de exílio e cativeiro dos judeus, e que esse período terminou quando os judeus retornaram a Judá em 537. Retrocedendo 70 anos, chega-se a 607 A.E.C., quando a destruição de Jerusalém causou o início da desolação de Judá.

É claro que a história secular — apoiada pela própria Bíblia — mostra que Jerusalém foi destruída em 587 A.E.C. Portanto, líderes das Testemunhas de Jeová e seus apologistas se esforçam ao máximo para rebater as evidências seculares e interpretar a Bíblia de acordo com a tradição da organização. Este artigo apresenta a evidência bíblica que mostra por que a tradição da religião está errada. As referências no Apêndice detalham as volumosas evidências contra essa tradição, incluindo as seculares, assim como as referências a alguns excelentes recursos on-line.

Obviamente, a data de 1914 se baseia em uma série de suposições questionáveis. Interpretações duvidosas das Escrituras, como a equiparação dos tempos dos gentios de Lucas 21:24 com os sete tempos da loucura de Nabucodonosor, e assim por diante, não se prestam a uma resolução objetiva, portanto este artigo não as considerará. Em vez disso, serão examinadas as alegações da organização sobre várias datas e períodos de tempo derivados de trechos bíblicos que são passíveis de uma resolução erudita e objetiva.

A cronologia da organização tem vários problemas, muitos dos quais, individualmente, sendo fatais para a cronologia como um todo e que, tomados em conjunto, mostram de forma incontestável que essa cronologia é falha. A experiência tem mostrado que nem os líderes das Testemunhas nem seus apologistas conseguem abordar honestamente estes problemas. Na maioria dos casos, eles simplesmente os ignoram.

Este resumo não é, de forma alguma, um tratado completo sobre todas as razões pelas quais a cronologia da organização está errada. Há muitos recursos on-line excelentes para o leitor interessado, incluindo o livro de Carl Olof Jonsson, Os Tempos dos Gentios Reconsiderados. O leitor pode consultar a lista no Apêndice.

A data de 607 A.E.C. para a destruição de Jerusalém não tem apoio bíblico

(1) Não há qualquer boa evidência de que 537 A.E.C. foi o ano em que os judeus exilados retornaram a Judá. A organização só diz que “evidentemente” (Livro “Toda a Escritura”, pág. 85) ou “provavelmente” (Enciclopédia Estudo Perspicaz, V. 1, p. 850) ou “sem dúvida” (revista A Sentinela de 1° de agosto de 1964, pág. 464) essa foi a data, mas não fornece evidência alguma. Na maior parte das discussões, eles simplesmente encobrem a falta de evidência (veja A Sentinela de 1° de outubro de 2011, pág. 28).

(2) O sincronismo entre Josefo e o livro de Esdras é uma evidência sólida de que os judeus retornaram a Judá em 538 A.E.C. Ambos se referem ao lançamento dos alicerces do templo cerca de meio ano depois de os judeus terem se estabelecido em suas cidades no mês de tisri (outono). Esdras só fornece uma data relativa em termos judaicos, enquanto Josefo fornece uma data em termos dos anos do reinado de Ciro, que está solidamente estabelecida. Essa data é a primavera de 537 A.E.C.; portanto, os judeus devem ter retornado meio ano antes, no outono de 538. Veja o diagrama abaixo e o apêndice para uma discussão mais detalhada.

Observe que os judeus usavam um calendário secular que começava no sétimo mês de tisri (setembro/outubro) e um calendário religioso que começava no primeiro mês de nisã (março/abril). O calendário babilônico começava em nisã.

Esdras 1 diz que Ciro, em seu primeiro ano (usando o sistema de ano de ascensão), decretou que os judeus poderiam retornar a Judá. O primeiro ano de Ciro foi de nisã de 538 A.E.C. a adar de 537 A.E.C. Esdras 3:1-7 diz que, no sétimo mês de tisri, os judeus estavam estabelecidos em suas cidades e, nessa época, reuniram-se em Jerusalém para iniciar a reconstrução do templo. Portanto, o ano que terminou imediatamente antes de tisri foi o primeiro ano da volta dos judeus para casa, e o novo ano que começou em tisri foi o segundo ano.

Esdras 3:8, 10 afirma que os alicerces do templo foram lançados no segundo mês desse segundo ano. Em Contra Apião I,21, Josefo afirma que “no segundo ano do reinado de Ciro foram lançados os alicerces [do templo]”. Portanto, esse segundo ano judaico coincide com o segundo ano de Ciro. Uma vez que o segundo ano de Ciro começou em nisã de 537 A.E.C., o segundo mês também foi em 537, e o primeiro ano do retorno dos judeus foi em 538 A.E.C. — não 537 como a organização alega.

O diagrama abaixo ilustra os conceitos que foram apresentados.

(3) Considerando os pontos (1) e (2), a cronologia da organização não tem qualquer fundamento comprobatório; pelo contrário, as evidências disponíveis estão contra ela. Se os judeus retornaram do exílio em 538, a data de 607 está errada, assim como a cronologia inteira. Se 607 está errado, 1914 está errado. Se 1914 está errado, a escatologia da organização está errada, assim como todas as doutrinas baseadas nela.

(4) Fatos bíblicos linguísticos, contextuais e históricos mostram que Jeremias predisse que Judá e as nações ao seu redor, como um grupo, serviriam à dinastia de Nabucodonosor por 70 anos (Jer. 25:8-12; 27:6-7). O trecho-chave é Jer. 25:11: “Estas nações terão de servir ao rei da Babilônia por setenta anos”. A Bíblia e a História mostram que Judá e várias nações serviram individualmente por menos de 70 anos, dependendo de quando foram conquistadas pela primeira vez e de como se mede “servir”. Deus, por meio de Jeremias e outros profetas, deu a cada nação a opção de servir em sua própria terra ou no exílio (Jer. 27:7-11, 17; 40:9-10). Para servir em sua própria terra, elas teriam de se submeter a Nabucodonosor. Os judeus, sob o comando de vários reis, recusaram-se; por isso, foram levados para o exílio em várias ocasiões, de 605/4 a 582 A.E.C. (Dan. 1:1-2; Jer 52:28-30). Portanto, não houve 70 anos de exílio, cativeiro ou desolação de Judá.

(5) Os 70 anos de supremacia babilônica terminaram em 539 A.E.C., quando Jeová “ajustou contas” contra, ou puniu, a dinastia de Nabucodonosor (Jer. 25:12) ao permitir que o Império Medo-Persa, sob o comando de Ciro, conquistasse Babilônia e pusesse fim à dinastia de Nabucodonosor. Isto é declarado diretamente em Daniel 5, onde os versículos 28-30 dizem: “O teu reino foi dividido e entregue aos medos e aos persas… naquela mesma noite foi morto Belsazar, o rei caldeu”. Em contraste, a liderança das Testemunhas de Jeová alega que a dinastia de Nabucodonosor foi chamada a prestar contas dois anos depois da morte deste rei, quando os persas libertaram os judeus para voltarem para casa (A Sentinela de 15/05/1980, págs. 23-24; Despertai! de maio de 2013, pág. 13), mas isso é um absurdo. Não haveria como punir uma dinastia que não existia mais.

(6) 2 Crônicas 36:20 afirma que os oficiais de Nabucodonosor levaram os judeus para Babilônia, e esses judeus permaneceram servos da dinastia de Nabucodonosor até que os persas, sob o comando de Ciro, assumiram o poder, após o que eles foram servos de Ciro e seus oficiais até que Ciro os deixou voltar para Judá. Isto confirma novamente que os 70 anos foram um período de supremacia babilônica, e não o período de desolação de Judá. Essa desolação ocorreu durante os 70 anos. Isto é consistente com Jeremias 25:8, 11, 12, que declara que os judeus e as nações ao redor seriam servos de “Nabucodonosor e seus filhos” até que Deus os chamasse para prestar contas.

(7) Uma vez que Jeremias falou de Jerusalém sendo devastada ou arruinada (hebraico chorbah; Jer. 25:18) logo após a conquista de Nabucodonosor em 605 A.E.C., a devastação de Judá começou nessa época. Ainda que a interpretação desse trecho seja controversa, a palavra hebraica chorbah significa basicamente “arruinado”, mas não especifica em que sentido algo é arruinado. Pode ser em sentido absoluto ou relativo. Pode significar arruinado no sentido de não ser mais intocado, como uma cidade conquistada por um invasor estrangeiro, mas não necessariamente arrasada; a Bíblia frequentemente usa a palavra nesse sentido.

(8) Uma vez que os judeus foram levados para o exílio em 605/4, 597, 587 e 582 A.E.C., e libertados em 538, não houve um único período de exílio ou cativeiro. Portanto, é errado falar de um exílio ou cativeiro de 70 anos. Da mesma forma, é errado falar de uma desolação de Judá por 70 anos, pois Jerusalém foi arruinada (chorbah) em sentido relativo do ponto de vista judaico quando Nabucodonosor levou pela primeira vez alguns cativos (incluindo Daniel) em 605/4 A.C., e em sentido completo depois que a maioria dos judeus deixou a terra entre 587 e 582 A.E.C.

(9) Na Tradução do Novo Mundo, Jeremias 29:10 diz: “Pois assim disse Jeová: ‘De acordo com o cumprimento de setenta anos em Babilônia (hebraico le-babel), voltarei minha atenção para vós, e vou confirmar para convosco a minha boa palavra por trazer-vos de volta a este lugar.’” Foi demonstrado de forma conclusiva, em várias publicações, que, neste contexto, a frase le-babel deve ser traduzida como “para Babilônia” e não “em Babilônia”. Esta última é uma tradução errada baseada na versão Rei Jaime (em inglês). A liderança das Testemunhas de Jeová tem dado grande ênfase à sua tradução (veja, por exemplo, o Apêndice ao capítulo 14 do livro “Venha o Teu Reino”, de 1981) para fazer valer sua alegação de que os 70 anos de Jeremias foram um período de exílio dos judeus (veja, porém, A Sentinela de 1° de outubro de 2011, pág. 27, onde a tradução correta é reconhecida, mas depois ignorada). Porém, a questão da tradução, além de muitas outras considerações, mostra que os judeus como um grupo não estiveram no exílio em Babilônia por 70 anos, e sim que vários contingentes judaicos estiveram no exílio por períodos que variaram entre 44 e 69 anos.

(10) Uma consideração cuidadosa dos textos bíblicos favoritos dos apologistas das Testemunhas de Jeová para interpretar erroneamente, ou seja, Daniel 9:2 e 2 Crônicas 36:21, mostra que estes trechos são ambíguos exatamente no que eles querem dizer sobre os 70 anos. Por serem ambíguos, outros textos e informações que não são ambíguos devem ser usados para determinar o que eles significam e, quando se faz isso, a ambiguidade é resolvida. Os apologistas da organização entendem isso totalmente ao contrário. Seguindo Russell e seus antepassados espirituais, eles começam interpretando os trechos ambíguos de acordo com a tradição da organização e, daí, distorcem o significado dos trechos não ambíguos para que eles se encaixem na tradição.

Os dez pontos acima provam que a Bíblia não apoia a data-âncora dos líderes das Testemunhas de Jeová para a cronologia de 1914 — ou seja, 607 A.E.C. — como a data da destruição de Jerusalém. Em vez disso, como os eruditos concordam, Jerusalém foi destruída em 587 A.E.C. (alguns dizem 586, mas a discrepância se deve à ambiguidade da própria Bíblia e pode ser resolvida em favor de 587; veja o Apêndice para referências). Portanto, a cronologia da Torre de Vigia está errada, assim como todas as doutrinas que se baseiam nela.

Apêndice

Referências

Já se publicou uma grande quantidade de material que refuta a cronologia de 1914 (tanto em formato impresso como online). Alistam-se a seguir algumas dessas referências.

A análise mais abrangente das evidências seculares, com muitos comentários bíblicos, é o livro de Carl Olof Jonsson. Grande parte desse livro está disponível on-line, em vários idiomas:

Clique na capa para acessar o conteúdo em sueco:

Clique na capa para acessar o conteúdo em português:

Clique na capa para acessar o conteúdo em inglês:

Os extensos escritos de Jonsson sobre a cronologia de 1914 também estão disponíveis em vários idiomas, nestes sites:

Clique no link para acessar os escritos em sueco:

Clique no link para acessar os escritos em português:

Clique no link para acessar os escritos em inglês:

Um resumo das evidências bíblicas e seculares (em inglês) pode ser encontrado no Handbook of Biblical Chronology (Manual de Cronologia Bíblica) de Jack Finegan  (Várias edições, Hendrickson Publishers). Clique na capa, para acessar informações sobre este livro no site da distribuidora Amazon:

Uma obra clássica sobre cronologia bíblica é The Mysterious Numbers of the Hebrew Kings [Os Misteriosos Números dos Reis Hebraicos], de Edwin R. Thiele (várias edições desde 1951). Clique na capa, para acessar informações sobre este livro no site da distribuidora Amazon:

Uma abrangente refutação das alegações bíblicas da organização Torre de Vigia (incluindo refutações detalhadas de artigos recentes da revista A Sentinela), juntamente com algum material secular (em inglês), está disponível no link abaixo:

Num artigo (em inglês) publicado originalmente em The Journal of the Evangelical Theological Society [Revista da Sociedade Teológica Evangélica] 47/1 (março de 2004), págs. 21–38, o erudito Rodger Young apresentou provas de que 587 A.C. é a data da destruição de Jerusalém. Acesse o artigo dele abaixo.

QUANDO JERUSALÉM CAIU?

O erudito Adventista do Sétimo Dia Ross E. Winkle oferece dois artigos (publicados originalmente em inglês, 1987):

OS SETENTA ANOS PARA BABILÔNIA DE JEREMIAS: UMA REAVALIAÇÃO. PARTE I: OS DADOS BÍBLICOS

OS SETENTA ANOS PARA BABILÔNIA DE JEREMIAS: UMA REAVALIAÇÃO. PARTE II: OS DADOS HISTÓRICOS

Outra análise da evidência bíblica e secular contra a cronologia da Torre de Vigia é o artigo seriado Notes on the Gentile Times and 1914 (Observações Sobre os Tempos dos Gentios e 1914).

Outra refutação é: Refutation of Appendix in Let Your Kingdom Come (Refutação do Apêndice em Venha o Teu Reino).

C. T. Russell originalmente usou 606 A.E.C. em vez de 607 como a data da destruição de Jerusalém e o início dos tempos dos gentios. Embora Russell e seus seguidores soubessem que a data de 607 estava correta (em termos das interpretações da organização) já em 1904, e ela tenha sido usada em um punhado de publicações da Torre de Vigia e relacionadas depois disso, foi só em 1943 que a organização mudou oficialmente a data do início dos tempos dos gentios, e só em 1944 que mudou a data da destruição de Jerusalém para 607. Os críticos da organização não ficarão surpresos ao descobrirem mentiras deslavadas no centro da mudança, mostradas neste artigo que examina os detalhes de como a liderança da organização mudou as datas, The Evolution of 606 to 607 B.C.E. in Watchtower Chronology (A Evolução de 606 para 607 AEC na Cronologia da Torre de Vigia):

A organização produziu muita matéria afirmando que os sinais dos tempos provam que o mundo entrou nos últimos dias desde 1914. Essas alegações são completamente refutadas no livro The Sign of the Last Days – When? [O Sinal dos Últimos Dias – Quando?] (Carl Olof Jonsson e Wolfgang Herbst, 1987). Clique na capa para acessar o conteúdo disponível em português:

Josefo e Esdras provam que os judeus retornaram em 538 e não em 537 A.E.C.

Um sincronismo entre Josefo e o livro de Esdras fornece forte evidência de que os judeus retornaram a Judá em 538 A.E.C. Ambos fazem referência ao lançamento dos alicerces do templo, aproximadamente meio ano depois de os judeus terem se estabelecido em suas cidades no mês de tisri (outono). Esdras só fornece uma data relativa em termos judaicos, enquanto Josefo fornece uma data em termos dos anos do reinado de Ciro, que está solidamente estabelecida. Essa data é a primavera de 537 A.E.C.; portanto, os judeus devem ter retornado meio ano antes, no outono de 538. Abaixo estão os detalhes. O diagrama a seguir ilustra os conceitos.

Esdras 1 afirma que Ciro, em seu primeiro ano (usando o sistema de ano de ascensão para datar os reinados dos reis), decretou que os judeus poderiam retornar a Judá. O primeiro ano de Ciro foi de nisã (março/abril) de 538 A.E.C. a adar (fevereiro/março) de 537 A.E.C. A Bíblia não diz exatamente quando ele emitiu esse decreto.

Esdras 3:1-7 afirma que no sétimo mês judaico, tisri (setembro/outubro), os judeus estavam estabelecidos em suas cidades e, nessa época, reuniram-se em Jerusalém para oferecer sacrifícios e coletar dinheiro para a reconstrução do templo. A partir disso, deduzimos que, seja qual for o ano do calendário moderno, os judeus retornaram no ano judaico anterior, já que o ano judaico secular começava em tisri (lembre-se de que o calendário judaico sagrado começava com seis meses de diferença de tisri, em nisã, e os meses judaicos eram numerados a partir de nisã). Em outras palavras, o ano em que os judeus retornaram foi o primeiro ano de sua volta para casa, e o novo ano que começou em tisri, mencionado em Esdras 3:1, foi o segundo ano de sua volta para casa.

Esdras 3:8, 10 afirma que um pouco mais tarde, naquele segundo ano, os alicerces do Templo foram lançados:

No segundo mês do segundo ano depois de chegarem ao templo de Deus em Jerusalém, Zorobabel, filho de Sealtiel, Jesua, filho de Jozadaque, e o restante dos seus irmãos, os sacerdotes, os levitas e todos os que tinham voltado do cativeiro para Jerusalém, começaram o trabalho, designando levitas de vinte anos para cima para supervisionarem a construção do templo do Senhor.

Quando os construtores lançaram os alicerces do templo do Senhor, os sacerdotes, com suas vestes e suas trombetas, e os levitas, filhos de Asafe, com címbalos, tomaram seus lugares para louvar o Senhor, conforme prescrito por Davi, rei de Israel.

A informação crucial aqui é que os alicerces do Templo foram lançados no segundo mês (íiar; abril/maio) do mesmo ano em que os judeus se reuniram em Jerusalém logo depois de retornarem a Judá.

A Bíblia não relaciona explicitamente essas  ocorrências com algum evento que possa ser datado solidamente em nosso calendário moderno. Porém, um exame cuidadoso dos dados históricos indica que era prática geral de Ciro libertar os cativos das nações que conquistava logo depois de garantir sua autoridade. Como ele capturou  Babilônia em outubro de 539 A.E.C., os habitantes sabiam de sua prática geral e esperavam que ele logo começasse a libertar os cativos babilônicos, inclusive os judeus. É um bom palpite que, para fins políticos, Ciro teria feito isso na época da celebração do início de seu primeiro ano de reinado. Se os livros de Daniel e Jeremias contiverem informações históricas válidas sobre a queda da Babilônia (Dan 9:1, 2; Jer 29:10), os judeus teriam esperado ser libertados logo após a entrada de Ciro na cidade, no final de outubro de 539 AEC.

Uma leitura cuidadosa de Esdras 1-3 indica que pode ter havido muito pouco intervalo entre a emissão do decreto de Ciro e a partida dos cativos judeus para Judá. Como o primeiro ano de reinado de Ciro começou em nisã, e os judeus chegaram em tisri, se tudo isso ocorreu em 538 A.E.C., teria havido no máximo seis meses para que os judeus concluíssem seus preparativos e a viagem e se estabelecessem em Judá. Como a viagem leva cerca de três a quatro meses para uma caravana normal, há tempo suficiente para que esses eventos tenham ocorrido em 538 A.E.C.

Com base em sua tradição, a liderança das Testemunhas de Jeová especula que Ciro emitiu seu decreto em algum momento no final de 538 ou início de 537 A.E.C., ainda em seu primeiro ano de reinado. Daí eles afirmam que os judeus voltaram para Judá em 537 A.E.C.

Como, então, é possível decidir se os judeus retornaram em 538 ou 537?

Josefo fornece o critério de desempate. Em Against Apion [Contra Apião] I,21, ele afirma:

Estes relatos estão de acordo com as histórias verdadeiras em nossos livros, pois neles está escrito que Nabucodonosor, no décimo oitavo ano de seu reinado, deixou nosso templo desolado, e assim ele permaneceu naquele estado de sombras por cinquenta anos; mas que no segundo ano do reinado de Ciro seus alicerces foram lançados, e ele foi concluído novamente no segundo ano de Dario.

A informação crucial é que as fundações do templo foram lançadas no segundo ano do reinado de Ciro.

Combinando isso com a informação de Esdras de que as fundações do templo foram lançadas no segundo mês (íiar) do segundo ano do retorno dos judeus à sua terra, devemos concluir que esse segundo ano corresponde ao segundo ano de Ciro. Como o segundo ano de Ciro começou em nisã de 537 A.E.C., e íiar foi o segundo mês desse ano de reinado, o primeiro ano do retorno dos judeus foi 538 A.E.C. Isso também funciona se for usada a datação de tisri para o reinado de Ciro, como alguns podem argumentar que Josefo fez.

Em outras palavras, Josefo, com Esdras como ponto de partida, forneceu as informações cruciais para determinar que 538 e não 537 A.E.C. foi o ano do retorno dos exilados a Judá.


Imagem em destaque: O que a cronologia bíblica indica sobre o ano de 1914? (artigo do site jw.org)

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