A história de uma interpretação

Introdução

TODA IDEIA tem um início. Todavia, é muito comum as pessoas acreditarem numa ideia e desconhecerem completamente seus antecedentes, origem e desenvolvimento. Ignorarem essa história pode fortalecer a convicção de que a ideia é verdadeira, mesmo que não seja. Como ocorre em outros casos, esta ignorância pode prover um solo fértil para o fanatismo.

É verdade que conhecer o desenvolvimento histórico de uma ideia não necessariamente a contradiz, mas tal conhecimento habilita-nos a melhorar nosso julgamento sobre sua validade. Um exemplo claro de uma ideia — neste caso, uma interpretação — obscurecida pela ignorância é um conceito amplamente defendido a respeito dos “tempos dos gentios” mencionados por Cristo em Lucas 21:24:

Cairão a fio da espada e serão levados cativos para todas as nações; e, até que os tempos dos gentios se completem, Jerusalém será pisada por eles. — BEG

Milhões de pessoas internacionalmente vieram a aceitar a crença de que estas palavras proféticas decididamente apontam e estão ligadas a uma data específica do século vinte, e até mesmo baseiam nisso seus planos para o presente e suas esperanças futuras. Qual é a história dessa crença?

O “princípio ano-dia”

A duração do período chamado de “tempos dos gentios” (traduzido como “os tempos designados das nações” na Tradução do Novo Mundo da Sociedade Torre de Vigia) tem sido calculada por alguns expositores, incluindo a Sociedade Torre de Vigia, como sendo 2.520 anos. Este cálculo é baseado no chamado “princípio ano-dia”. Segundo este princípio, em profecias bíblicas relacionadas com o tempo, um dia sempre representa um ano, “exatamente como num mapa uma polegada pode representar cem milhas.”1 Na Bíblia há duas passagens em que períodos proféticos são contados explicitamente dessa maneira: Números 14:34 e Ezequiel 4:6.

Extraído da revista Despertai! de 22 de abril de 1974, pagina 18.

O cálculo dos “tempos dos gentios” como um período de 2.520 anos, começando em 607 A.E.C. e terminando em 1914 E.C., é a base cronológica da mensagem apocalíptica pregada mundialmente pela Sociedade Torre de Vigia.

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No primeiro texto, como punição pelos seus erros, os israelitas tiveram de vaguear pelo deserto durante quarenta anos, contados segundo o número de dias que os espiões haviam espionado a terra, ou seja, quarenta dias, “um dia por um ano”.

No segundo texto, Ezequiel recebeu a ordem de se deitar sobre o seu lado esquerdo durante 390 dias e sobre o seu lado direito durante 40 dias, levando profeticamente os erros de Israel e Judá cometidos durante os anos que correspondem numericamente a esses dias, “um dia por um ano”.

Deve-se notar, porém, que estas interpretações específicas são fornecidas a nós pela própria Bíblia. A expressão “um dia por um ano” não é declarada em parte alguma como um princípio geral de interpretação que se aplica também a outros períodos proféticos.

O desenvolvimento do conceito de que o princípio ano-dia pode ser realmente aplicado a qualquer profecia bíblica relacionada com tempo, tem uma longa história. A natureza aleatória de sua aplicação durante essa história certamente revela algo quanto à sua confiabilidade.

O uso do princípio por eruditos judaicos

Os rabinos judaicos foram os primeiros a aplicar este modo de contar o tempo profético em outras referências, além das duas citadas, e eles fizeram isto com as “setenta semanas” de Daniel 9:24-27, na qual o primeiro versículo diz: “Setenta semanas são decretadas para teu povo e para tua cidade santa, para acabar com a transgressão, pôr fim ao pecado, e para expiar a iniquidade, para trazer justiça eterna, para selar a visão e o profeta e para ungir o lugar santíssimo.”2

Apesar disto, o fato é que a aplicação “ano-dia” só foi expressa como um princípio geral no primeiro século E.C., pelo famoso rabino, Akiba ben José (c. 50-132 E.C.).3

Passaram-se centenas de anos e foi só no início do nono século que vários rabinos judaicos começaram a estender o princípio ano-dia a outros períodos de tempo no livro de Daniel. Estes incluíam as 2.300 “noitinhas e manhãs” de Daniel 8:14, e os 1.290 dias e 1.335 dias de Daniel 12:11, 12, sendo todos os quais encarados como tendo implicações messiânicas.

O primeiro destes rabinos, Nahawendi, considerava as 2.300 “noitinhas e manhãs” de Daniel 8:14 como anos, contando-os desde a destruição de Siló (que ele datou em 942 A.E.C.) até o ano 1358 E.C. Ele esperava que o Messias viesse nesse ano.4

Nahawendi foi logo seguido por outros, tais como Saadia ben José, do mesmo século, e Salomão ben Jeorão, do décimo século. Este último aplicou o princípio ano-dia aos 1.335 dias de Daniel 12:12. Contando-os desde o tempo de Alexandre o Grande, ele chegou ao ano 968 E.C. como a data para a redenção de Israel.

O famoso rabino Rashi (1040-1105), encerrou os 2.300 anos-dias em 1352 E.C., data na qual ele achava que o Messias viria.

Abraão bar Hiyya Hanasi (c. 1065-1136) especulou que os períodos de 2.300, 1.290 e 1.335 anos terminariam em diferentes datas no século quinze. O fim dos 2.300 anos-dias, por exemplo, foi fixado em 1468 E.C.5

Até mesmo no século dezenove, muitos outros eruditos judaicos continuaram a usar o princípio ano-dia para marcar datas para a vinda do Messias.

Ao longo desses dez séculos, os métodos que os eruditos rabínicos usaram ao aplicar o princípio ano-dia foram variados e as datas a que chegaram foram diferentes. Todavia, qualquer que tenha sido o método usado, uma coisa é certa: todas as datas finais passaram sem se cumprirem as predições.

Se o uso do princípio ano-dia era relativamente comum entre as fontes judaicas desde os primeiros séculos, será que este foi também o caso entre os expositores bíblicos cristãos?

Uma questão de maior interesse é a seguinte: Será que a história do uso desse princípio entre a comunidade cristã — e os resultados obtidos — demonstram um contraste, ou seguem um padrão similar? Qual tem sido o resultado? 

O “princípio ano-dia” entre os expositores cristãos

Conforme vimos, o rabino Akiba ben José apresentou o método ano-dia como um princípio já no primeiro século E.C. Todavia, durante os mil anos seguintes não encontramos qualquer aplicação do método — dessa maneira, como princípio — entre os eruditos cristãos.

É verdade que vários expositores do quarto século em diante sugeriram um significado místico ou simbólico para os 1.260 dias de Revelação, mas antes do século 12 eles jamais aplicaram a regra ano-dia a esses dias, nem a qualquer outro período de tempo, com a única exceção dos 3 dias e meio de Revelação 11:9. Esse período foi interpretado como 3 anos e meio por vários expositores, o primeiro dos quais tendo sido Vitorino, no quarto século.6 Isto, é claro, estava longe de ser uma adoção da regra ou princípio ano-dia.

Joaquim de Flora (c. 1130-1202), abade do mosteiro cisterciense de Corace, Itália, foi mui provavelmente o primeiro expositor cristão que aplicou o princípio ano-dia aos diferentes períodos de tempo de Daniel e de Revelação. Isto foi enfatizado durante o século 19 por Charles Maitland, um opositor destacado dessa ideia, em várias obras e artigos. Por exemplo, ao refutar os que defendiam que os 1.260 dias de Revelação 11:3 eram 1.260 anos, Maitland concluiu, após uma investigação cuidadosa, que “nunca se ouviu falar no mundo” desse sistema dos 1260 anos “até que um abade irrefletido sonhou isso em 1190.”7

Embora muitos aderentes do princípio ano-dia no século dezenove tentassem refutar a declaração de Maitland a respeito da novidade do princípio, todas as tentativas deles fracassaram. Depois de um exame muito abrangente de todas as fontes disponíveis, até o mais erudito dos oponentes de Maitland, o Reverendo E. B. Elliott, teve de admitir que “durante os primeiros quatro séculos, os dias mencionados nas profecias de Daniel e do Apocalipse a respeito do Anticristo eram interpretados literalmente como dias, não como anos, pelos Pais da Igreja Cristã.”8 Assim, ele teve de concordar com Maitland quanto a Joaquim de Flora ter sido o primeiro escritor cristão a aplicar o princípio ano-dia aos 1.260 dias de Revelação 11:3, dizendo:

Ao fim do século 12, Joaquim Abbas, como acabamos de ver, fez uma primeira e tosca tentativa nesse sentido: e no século 14, o wycliffita Walter Brute seguiu seu exemplo.9

Joaquim, que foi provavelmente influenciado por rabinos judaicos, contou os 1.260 “anos-dias” desde a época de Cristo e acreditava que terminariam brevemente, numa “era do Espírito”. Embora ele não tenha fixado uma data específica para isto, parece que aguardava ansiosamente o ano 1260 E.C. Depois de sua morte, esse ano veio “a ser considerado pelos seguidores de Joaquim como a data fatídica que iniciaria a nova era, tanto que quando ela passou sem qualquer acontecimento notável, alguns deixaram de acreditar em todos os ensinos dele.”10

As obras de Joaquim deram início a uma nova tradição de interpretação, na qual o “princípio ano-dia” era a própria base das interpretações proféticas. Durante os séculos seguintes foram fixadas inúmeras datas para o segundo advento de Cristo, sendo a maioria delas edificadas com base no princípio ano-dia. Na época da Reforma (no século 16), Martinho Lutero e a maioria dos outros reformadores acreditavam nesse princípio, e ele era amplamente aceito entre os eruditos protestantes até bem dentro do século dezenove. 

O princípio é aplicado aos tempos dos gentios

Como vimos, Joaquim de Flora aplicou o princípio ano-dia aos 1.260 dias de Revelação 11:3. O versículo anterior converte este período em meses, declarando que “as nações . . . pisarão a cidade santa por quarenta e dois meses.” (Revelação 11:2, TNM) Uma vez que esta predição acerca da “cidade santa” é bem parecida com as palavras de Jesus em Lucas 21:24 de que “até que os tempos dos gentios se completem, Jerusalém será pisada por eles” (ALA), alguns dos seguidores de Joaquim logo começaram a associar os “tempos dos gentios” com este período calculado, no qual os 1.260 dias tornaram-se 1.260 anos.

Todavia, como eles acreditavam que Revelação 11:2, 3 e 12:6, 14 trata da igreja cristã, Jerusalém ou a “cidade santa” geralmente era interpretada como significando a igreja de Roma.11 Por isso, eles achavam que o período dos “tempos dos gentios” era o período de aflição da igreja, sendo o fim desta aflição originalmente esperado para 1260 E.C.

Entretanto, outros acreditavam que a “cidade santa” era a cidade literal de Jerusalém. O bem conhecido médico escolástico Arnold de Villanova (c. 1235-1313), identificou os tempos dos gentios com os 1.290 dias de Daniel 12:11, convertendo-os de 1290 dias para 1290 anos. Contando-os desde a extinção dos sacrifícios judaicos após a destruição de Jerusalém pelos romanos em 70 E.C., ele esperava o fim dos tempos dos gentios no século quatorze. As cruzadas ainda estavam ocorrendo na época dele e Arnold associou-as com a aguardada expiração dos tempos dos gentios no futuro próximo, argumentando que, a menos que o fim dos tempos dos gentios estivesse próximo, como poderia o “povo fiel” reconquistar a Terra Santa dos infiéis?12

Ao final do século quatorze, Walter Brute, um dos seguidores de John Wycliffe na Inglaterra, ofereceu ainda outra interpretação. Segundo ele, os “tempos dos gentios” eram o período em que a igreja cristã era dominada por ritos e costumes pagãos. Ele defendia que esta apostasia começou depois da morte do último apóstolo, por volta de 100 E.C. e continuaria por 1.260 anos. Este período, e também os 1.290 “anos-dias”, que ele contava desde a destruição de Jerusalém, 30 anos antes (em 70 E.C.), já tinham expirado em seus dias. Ele escreveu:

Agora, se qualquer homem observar as Crônicas, descobrirá que depois de a destruição de Jerusalém ter acabado e depois de a forte mão do povo santo ter sido completamente dispersa, e depois do estabelecimento da abominação; quer dizer, o Ídolo da Desolação de Jerusalém, dentro do lugar Santo, onde o Templo de Deus estava antes, passaram-se 1290 dias, tomando um dia por um ano, como geralmente se faz nos Profetas. E os tempos do povo Pagão estão cumpridos, sob cujos Ritos e Costumes Deus tolerou que a Cidade Santa fosse pisoteada durante quarenta e dois meses.13

Uma vez que, segundo seus cálculos, os tempos dos gentios já tinham expirado, Brute achou que a segunda vinda de Cristo devia estar muito próxima.

Mudando constantemente as datas

O tempo passou e deixou para trás as muitas datas apocalípticas marcadas, sem se cumprirem as predições associadas a elas. A esta altura, contar os 1.260 ou os 1.290 anos desde a destruição de Jerusalém em 70 E.C., ou desde a morte dos apóstolos, não podia mais produzir resultados significativos. Por isso, o ponto de partida teve de ser adiantado para uma data posterior.

Grupos perseguidos e tachados de heréticos pela Igreja Romana logo começaram a identificar os ‘gentios pisoteadores’ com o papado de Roma. Estes grupos perseguidos geralmente viam a si mesmos como “a verdadeira igreja” — representada em Revelação 12 como uma mulher que teve de fugir para “o deserto” por “mil duzentos e sessenta dias”, o período do pisoteamento da Jerusalém espiritual. (Revelação 12:6, 14) Esta interpretação lhes permitia agora adiantar o ponto de partida, do primeiro século para algum momento do quarto século, quando ocorreu o aumento da autoridade por parte da Igreja Romana.

Esta interpretação “ajustada” era muito comum entre os reformadores. John Napier (1550-1617), eminente matemático e estudante de profecias escocês, iniciou o período por volta de 300 ou 316 E.C., e trouxe o fim dos tempos dos gentios para a última metade do século dezesseis.14

Mais tempo se passou e o ponto de partida foi mais uma vez adiantado, desta vez para o sexto ou sétimo séculos, período em que os papas tinham realmente alcançado uma posição de autoridade. George Bell, por exemplo, escrevendo na Revista Evangélica, de Londres, em 1796, contou os 1.260 anos desde 537 ou desde 553 E.C., e predisse a queda do Anticristo (o Papa) em “1797 ou 1813.”15 A respeito dos 1.260 anos, Bell diz:

A cidade santa será pisoteada pelos gentios, ou papistas, que, embora sejam cristãos de nome, são gentios na adoração e na prática; adorando anjos, santos e imagens e perseguindo os seguidores de Cristo. Estes gentios removem o sacrifício diário e estabelecem a abominação que causa a desolação da igreja visível de Cristo durante o período de 1260 anos.16

Isto foi escrito em 1795, em meio à Revolução Francesa. Pouco tempo depois o Papa foi aprisionado pelas tropas francesas e forçado a ir para o exílio (em fevereiro de 1798). É muito interessante que estes eventos espantosos na França e na Itália tenham sido até certo ponto “preditos” com quase um século de antecedência por vários expositores, sendo o mais conhecido deles o pastor escocês, Robert Fleming Jr. (c. 1660-1716).17 Com certeza, muitos acharam que estes importantes eventos históricos tinham confirmado a exatidão das suas predições! Por causa disto, o ano de 1798 foi logo amplamente apontado entre os comentaristas bíblicos como sendo a data em que terminavam os 1.260 anos.

Esta ideia — com algumas diferenças secundárias — foi adotada também por Charles Taze Russell e seus seguidores. E ela ainda é prevalecente entre os Adventistas do Sétimo Dia. 

Convulsões políticas e sociais estimulam as especulações proféticas

A Revolução Francesa de 1789-1799 teve um impacto extraordinário, que se estendeu muito além das fronteiras francesas. Após a violenta remoção da monarquia francesa e a proclamação da República em 1792, novos líderes extremistas não só causaram um período de terror e caos na própria França, como também inauguraram um período quase ininterrupto de guerras de conquista, que durou até 1815, quando o Imperador Napoleão I foi derrotado em Waterloo. As caóticas consequências da Revolução na Europa e em outras partes do mundo despertaram interesse intensificado no estudo profético, principalmente porque algumas destas convulsões tinham sido parcialmente preditas por expositores das profecias.

Os historiadores reconhecem que a Revolução Francesa marca um momento decisivo na história do mundo. Ela pôs fim a uma longa era de relativa estabilidade na Europa, desarraigando a ordem estabelecida e mudando profundamente o pensamento político e religioso.

Comparando as guerras da Revolução Francesa e de Napoleão Bonaparte com a anterior Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) e a posterior Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o historiador Robert Gilpin diz sobre estas três guerras que “cada uma delas foi uma guerra mundial envolvendo quase todos os estados do sistema [internacional] e, pelo menos em retrospecto, pode ser considerada como tendo constituído um momento decisivo na história humana.”18

Outro historiador bem conhecido, R. R. Palmer, ao discutir o papel importante da Revolução Francesa na história moderna, diz:

Mesmo hoje, em meados do século vinte, apesar de tudo o que aconteceu no período de vida de homens que ainda não são velhos, e até mesmo . . . nos Estados Unidos ou em qualquer outra parte de um mundo no qual os países da Europa não mais gozam de sua anterior posição de liderança, ainda é possível dizer que a Revolução Francesa no fim do século dezoito foi o momento decisivo da civilização moderna.19

O resultante desarraigamento de instituições políticas e sociais europeias bem antigas levou muitos a crer que estavam realmente vivendo nos últimos dias. Homens de muitas formações — ministros, políticos, advogados e leigos — envolveram-se em estudo de profecia. Foi produzido um volumoso conjunto de literatura sobre as profecias, surgiram muitos periódicos proféticos e foram realizadas conferências proféticas em ambos os lados do Atlântico.

O reavivamento apocalíptico começou na Inglaterra, mas logo se espalhou para o continente europeu e para os Estados Unidos da América, culminando nesse país no bem conhecido movimento milerita. Com base nas interpretações de Daniel 8:14, as predições então desenvolvidas apontavam geralmente para 1843, 1844 ou 1847 como sendo a época do segundo advento de Cristo.

Foi nesta atmosfera febril que nasceu uma nova interpretação dos tempos dos gentios, na qual, pela primeira vez, o muito usado número de 1.260 anos, foi duplicado para 2.520 anos.

A tabela apresentada na página seguinte mostra os resultados que o método “ano-dia” de contar períodos de tempo proféticos produziu ao longo de um período de sete séculos. Embora quase todos os trinta e seis eruditos e expositores proféticos alistados estivessem trabalhando a partir do mesmo texto básico das Escrituras, referente aos 1.260 dias, eles muito raramente concordaram com os mesmos pontos inicial e final para o cumprimento do período. As datas finais para os tempos dos gentios estabelecidas por eles ou pelos seus seguidores vão desde 1260 E.C. até 2016 E.C. Contudo, todos apresentaram o que lhes pareciam ser razões convincentes para chegar às suas datas. Quais foram então os resultados de se ter duplicado este número que tem sido relacionado com a declaração de Jesus a respeito dos “tempos dos gentios”?

John Aquila Brown

Na longa história da especulação profética, John Aquila Brown, da Inglaterra, desempenha um papel destacado. Embora não tenha sido encontrada qualquer informação biográfica sobre Brown até agora, ele influenciou fortemente o pensamento apocalíptico de sua época. Ele foi o primeiro expositor que aplicou os supostos 2.300 anos-dias de Daniel 8:14 de forma que terminassem em 1843 (depois 1844).20

TABELA 1: AS MÚLTIPLAS E VARIADAS APLICAÇÕES DOS 1.260 ANOS

ExpositorData da
Publicação
Aplicação (todas são datas E.C.)Observações
Joaquim de Flora11951-1260 
Arnold de Villanova1300c.74-1364Tempos dos Gentios = 1290 anos
Walter Brute1393134-1394 
Martinho Lutero153038-1328Tempos dos Gentios = 1290 anos
A. Osiander1545412-1672 
J. Funck1558261-1521 
G. Nigrino1570441-1701 
Arécio1573312-1572 
John Napier1593316-1576 
D. Pareus1618606-1866 
J. Tillinghast1655396-1656 
J. Artopaeus1665260-1520 
Cocceius1669292-1552 
T. Beverley1684437-1697 
P. Jurieu1687454-1714 
R. Fleming Jr.1701552-17941260 anos de 360 dias
Idem1701606-1848= 1242 anos julianos
William Whiston1706606-1866 
Daubuz1720476-1736 
J. Ph. Petri1768587-1847 
Lowman1770756-2016 
John Gill1776606-1866 
Hans Wood1787620-1880 
J. Bicheno1793529-1789 
A. Fraser1795756-19981242 anos julianos
George Bell1796537-1797 
Idem1796553-1813 
Edward King1798538-1798 
Galloway1802606-18491242 anos julianos
W. Hales1803620-1880 
G. S. Faber1806606-1866 
W. Cuninghame1813533-1792 
J. H. Frere1815533-1792 
Lewis Way1818531-1791 
W. C. Davis1818588-1848 
J. Bayford1820529-1789 
John Fry1822537-1797 
John Áquila Brown1823622-18441260 anos lunares

A tabela apresenta uma amostra das muitas aplicações diferentes dos 1.260 e 1.290 “anos-dias”, desde Joaquim de Flora em 1195 até John Aquila Brown em 1823. Seria fácil ampliar a tabela para incluir expositores posteriores a Brown. Contudo, a tabela termina nele, pois nesta época começou a surgir outra interpretação dos tempos dos gentios, na qual os 1.260 anos foram duplicados para 2.520 anos.

O livro de John Aquila Brown O Anoitecer (em inglês – Londres, 1823), no qual pela primeira vez os “sete tempos” de Daniel 4 foram explicados como significando 2.520 anos.

Esta veio a ser uma data chave para o movimento do Segundo Advento.21 Ele foi também o primeiro que chegou a um período profético de 2.520 anos.

O cálculo de Brown dos 2.520 anos baseou-se em sua exposição dos “sete tempos” que faziam parte do sonho de Nabucodonosor sobre a árvore derrubada, em Daniel capítulo 4. Foi publicado originalmente em inglês em 1823 em sua obra de dois volumes O Anoitecer; ou, Último Triunfo do Abençoado e Único Potentado, o Rei dos Reis, e Senhor dos Senhores.22 Ele diz especificamente que foi o primeiro a escrever sobre o assunto:

Embora tenham sido escritos muitos volumes extensos e eruditos sobre assuntos proféticos durante a sucessão das eras; ainda assim, já que nunca vi alguém tratar do assunto sobre o qual vou fazer algumas observações, eu recomendo este livro à atenção do leitor, não com dúvida, mas com forte convicção de que mais ainda se descobrirá para confirmar a tabela dos períodos proféticos, que se supõe serem a base do cumprimento da profecia.23

Em sua interpretação, Brown divergia de outros expositores posteriores por jamais associar os “sete tempos” do sonho de Nabucodonosor com os “sete tempos” da punição profética aplicada contra Israel, em Levítico 26:12-28. “Nabucodonosor foi um tipo”, escreveu Brown, “dos três reinos sucessivos que haveriam de surgir.” Sobre os “sete tempos,” ou anos, da aflição de Nabucodonosor, ele disse:

[Estes] seriam, portanto, considerados como uma grande semana de anos, formando um período de dois mil quinhentos e vinte anos, e abrangendo a duração das quatro monarquias tirânicas; ao fim do qual elas aprenderão, assim como Nabucodonosor, na “época e tempo” dos dois julgamentos, que “o Altíssimo governa no reino dos homens, e dá o governo a quem Ele quiser”.

Brown calculou os 2.520 anos contando-os desde o primeiro ano de Nabucodonosor, 604 A.E.C., até o ano de 1917, quando “a plena glória do reino de Israel será aperfeiçoada.”24

O próprio Brown não associou este período com os tempos dos gentios de Lucas 21:24. Entretanto, o cálculo dele para os 2.520 anos, bem como o fato de tê-los baseado em Daniel capítulo 4, desempenharam desde então um papel chave em certas interpretações modernas desses tempos dos gentios. 

Os 2.520 anos são associados com os tempos dos gentios

Não demorou muito para que outros expositores começassem a identificar o novo cálculo de 2.520 anos com os “tempos dos gentios” de Lucas 21:24. Mas, assim como no caso dos 1.260 dias, eles apareciam com resultados diferentes.

Nas Conferências Proféticas de Albury Park (realizadas anualmente em Albury, próximo a Guildford, sul de Londres, Inglaterra, de 1826 a 1830), os “tempos dos gentios” foi um dos tópicos considerados. Desde as primeiras discussões em 1826, eles foram associados ao período de 2.520 anos por William Cuninghame. Ele escolheu como ponto de partida o ano em que as dez tribos [de Israel] foram levadas ao cativeiro por Salmaneser (ano este que ele datou em 728 A.E.C.), chegando assim à data final ou terminal 1792 E.C., uma data que já tinha passado naquele momento.25

Muitos comentaristas bíblicos contavam os “sete tempos dos gentios” a partir do cativeiro de Manassés, que eles datavam em 677 A.E.C. Obviamente, isto era feito para que os tempos dos gentios terminassem na mesma data que tinha sido atribuída antes aos 2.300 dias-anos, ou seja, em 1843 ou 1844.26 Em 1835, William W. Pym publicou sua obra Uma Palavra de Aviso nos Últimos Dias (em inglês), na qual finalizou os “sete tempos” em 1847. É interessante que ele elabora seu cálculo dos 2.520 anos dos tempos dos gentios com base tanto nas “sete vezes” mencionadas em Levítico 26 como nos “sete tempos” de Daniel 4:

Em outras palavras, os julgamentos adversos expressos por Moisés, que devem durar pelos sete tempos, ou 2520 anos; e os julgamentos revelados a Daniel, que devem terminar com a purificação do santuário depois de uma parte do número maior 2.520.27

Outros, contudo, aguardavam ansiosamente 1836 E.C., um ano fixado em bases completamente diferentes pelo teólogo alemão J. A. Bengel (1687-1752), e tentaram finalizar os “sete tempos” nesse mesmo ano.28

Para ilustrar o estado de contínuas mudanças então existente, Edward Bickersteth (1786-1850), reitor evangélico de Watton, Hartfordshire, tentou diferentes pontos iniciais para os “sete tempos dos gentios”, chegando a três datas finais diferentes:

Se contarmos o cativeiro de Israel como se iniciando em 727 antes de Cristo, o primeiro cativeiro de Israel sob Salmaneser, o período terminaria em 1793, quando irrompeu a revolução Francesa: e se começarmos por 677 antes de Cristo, o cativeiro deles sob Esar-Hadom (o mesmo período em que Manassés, rei de Judá, foi levado ao cativeiro,) (2 Reis 17:23, 24; 2 Crôn. 33: 11,) o período terminaria em 1843: ou, se contarmos a partir de 602 antes de Cristo, que foi o destronamento final de Jeoiaquim por Nabucodonosor, o período terminaria em 1918. Todos estes períodos podem ter uma referência a eventos correspondentes no seu término, e são dignos de séria consideração.29

NO ALTO: A residência Albury Park, próxima a Guildford, sul de Londres, local das Conferências Proféticas de Albury Park, 1826-1830. Nestas conferências foram desenvolvidas certas ideias que 50 anos depois viriam a se tornar elementos centrais da mensagem da Sociedade Torre de Vigia, particularmente, os tempos dos gentios como um período de 2.520 anos e a ideia da segunda vinda de Cristo como sendo uma presença invisível.

EMBAIXO: Henry Drummond, proprietário de Albury Park e anfitrião das conferências, que também publicou relatórios anuais das discussões (Diálogos Sobre Profecia).

Um dos milenaristas mais bem conhecidos e eruditos do século 19 foi Edward Bishop Elliott (1793-1875), titular da Igreja de Marcos, em Brighton, Inglaterra. É ele quem menciona pela primeira vez a data 1914. No seu monumental tratado Horæ Apocalypticæ (“Horas com o Apocalipse”) ele contou pela primeira vez os 2.520 anos de 727 A.E.C. a 1793 E.C., mas acrescentou:

Naturalmente, se for calculado desde a própria ascensão de Nabucodonosor e invasão de Judá, em 606 A.C., o fim será bem mais tarde, em 1914 A.D.; apenas meio século, ou período de jubileu depois de nossa provável data para o início do Milênio [que ele tinha fixado em “por volta de 1862 A.D.”].30

Um fator que deve ser notado aqui é que na cronologia de Elliott, 606 A.E.C. era o ano de ascensão de Nabucodonosor, enquanto na cronologia posterior de Nelson H. Barbour e Charles T. Russell, 606 A.E.C. era a data atribuída à destruição de Jerusalém por Nabucodonosor no seu 18º ano.

O movimento milerita

As principais obras britânicas sobre profecias foram extensivamente reimpressas nos Estados Unidos e influenciaram fortemente muitos escritores americanos sobre o assunto. Entre estes estava o bem conhecido pregador batista William Miller e seus associados, que apontavam para 1843 como a data da segunda vinda de Cristo. Estima-se que pelo menos 50.000 e talvez tantas quantas 200.000 pessoas vieram a aceitar as interpretações de Miller.31

Praticamente todas as posições que eles sustentavam sobre as várias profecias, tinham sido ensinadas por outros expositores anteriores ou contemporâneos. Miller estava simplesmente seguindo outros ao finalizar os “tempos dos gentios” em 1843. Na Primeira Conferência Geral, realizada em Boston, Massachusetts, em 14 e 15 de outubro de 1840, um dos discursos de Miller abordava a cronologia bíblica. Ele dizia que os “sete tempos,” ou 2.520 anos, estendiam-se de 677 A.E.C. a 1843 E.C.32 A segunda vinda de Cristo era esperada o mais tardar em 1844.

A data predita durante tanto tempo e por tantas pessoas, com suposto apoio bíblico, veio e se foi, sem o cumprimento de quaisquer das expectativas baseadas nela.

Depois do “Grande Desapontamento” de 1844, alguns, e entre eles o próprio Miller, confessaram abertamente que a época estava errada.33

Outros, contudo, insistiram que a época em si estava certa, mas o evento esperado estava errado. Expressando o que veio a se tornar uma justificativa familiar, eles tinham esperado “a coisa errada na época certa.”

Horas Com o Apocalipse, Vol. III (1844), de E. B. Elliott

E. B. Elliott foi mui provavelmente o primeiro expositor a contar os “tempos dos gentios” de 606 A.E.C. a 1914 E.C. Deve-se notar, porém, que na cronologia dele o ponto inicial, 606 A.E.C., era o ano de ascensão de Nabucodonosor, enquanto que na cronologia de Barbour e Russell este era o décimo oitavo ano do reinado de Nabucodonosor. Portanto, suas cronologias eram conflitantes, embora acidentalmente tenha acontecido de as datas resultantes serem as mesmas.

TRADUÇÃO DO TRECHO SUBLINHADO: Naturalmente, se for calculado desde a própria ascensão de Nabucodonosor e invasão de Judá, em 606 A.C., o fim será bem mais tarde, em 1914 A.D.

A tabela “1843” usada por William Miller (no encaixe) e por seus associados ao apresentarem a mensagem sobre 1843. Miller apresentou quinze “provas” diferentes em apoio da sua data 1843, a maioria das quais sendo cálculos baseados nos vários períodos de anos-dias, incluindo os 2300 e os 2520 anos-dias.

Esta posição foi tomada por um grupo que mais tarde veio a ser conhecido como Adventistas do Sétimo Dia. Eles afirmaram que Jesus, em vez de descer à terra em 1844, entrou no lugar mais sagrado do santuário celestial como sumo sacerdote da humanidade, para introduzir o dia da expiação antitípico.34 Este grupo, que se separou dos demais “Segundo Adventistas” no final da década de 1840, causou a primeira grande divisão dentro do movimento original.

Alguns líderes mileritas que também apoiavam a data 1844 — entre eles Apollos Hale, Joseph Turner, Samuel Snow e Barnett Matthias — afirmavam que Jesus tinha realmente vindo como Noivo em 1844, embora de maneira espiritual e invisível, “não por descer pessoalmente do céu, mas por assumir o trono espiritualmente.” Em 1844, diziam eles, o “reino deste mundo” foi dado a Cristo.35 

Ramificações do movimento milerita

Assim, depois de 1844 o movimento milerita do “Segundo Advento” fragmentou-se gradualmente em vários grupos adventistas.36 Uma multiplicidade de novas datas começaram a aparecer: 1845, 1846, 1847, 1850, 1851, 1852, 1853, 1854, 1866, 1867, 1868, 1870, 1873, 1875, e assim por diante, e estas datas, cada uma tendo seus promotores e seguidores, contribuíram para uma fragmentação ainda maior. Um líder do Segundo Adventismo, Jonathan Cummings, declarou em 1852 que tinha recebido uma “nova luz” sobre a cronologia, e que se devia esperar o segundo advento em 1854. Muitos mileritas juntaram-se a Cummings e, em janeiro de 1854 deram início a um novo periódico, o Crise Mundial (em inglês), em defesa da nova data.37

Outros fatores além das datas começaram a desempenhar um papel na composição do movimento do Segundo Advento. Até o presente momento, eles são características distintivas entre vários movimentos que se desenvolveram a partir do Segundo Adventismo, incluindo a Igreja Adventista do Sétimo Dia, as Testemunhas de Jeová e certas denominações da Igreja de Deus. Estes fatores incluem a doutrina da imortalidade condicional — não inerente — da alma, com o consequente dogma de que o destino final dos rejeitados por Deus é a destruição ou aniquilamento, não o tormento consciente. A crença trinitarista também se tornou uma questão entre alguns setores dos Segundo Adventistas. (Para mais detalhes acerca destes desenvolvimentos e seus efeitos em contribuir para a divisão entre as ramificações dos movimentos mileritas, veja o Apêndice ao Capítulo 1.)

A maior parte destes desenvolvimentos já tinha ocorrido quando Charles Taze Russell, ainda em sua adolescência, começou a formação de um grupo de estudo da Bíblia em Allegheny, Pensilvânia. Do fim da década de 1860 em diante, Russell entrou cada vez mais em contato com alguns dos grupos Segundo Adventistas que se haviam desenvolvido. Ele estabeleceu estreitas relações com alguns dos seus ministros e leu alguns dos seus jornais, incluindo o Examinador da Bíblia de George Storrs. Gradualmente, Russell e seus associados adotaram muitos dos ensinos centrais desses grupos, incluindo suas posições condicionalistas e anti-trinitaristas e a maior parte das suas interpretações sobre a “era vindoura.” Por fim, em 1876 Russell também adotou uma versão revisada do sistema cronológico desses grupos, envolvendo a ideia de que os 2.520 anos dos tempos dos gentios expirariam em 1914. Portanto, em todos os aspectos essenciais, o movimento dos Estudantes da Bíblia de Russell pode ser descrito como mais uma ramificação do movimento milerita.

Qual foi então a fonte mais imediata do sistema cronológico que Russell, o fundador do movimento da Torre de Vigia, adotou, incluindo não só o período de 2.520 anos para os tempos dos gentios com término em 1914, como também o ano 1874 para o início de uma presença invisível de Cristo? Essa fonte foi um homem chamado Nelson H. Barbour.

Nelson H. Barbour

Nelson H. Barbour nasceu perto de Auburn, Nova Iorque, em 1824. Ele juntou-se ao movimento milerita em 1843, aos 19 anos de idade. Ele “perdeu sua religião” por completo depois do “Grande Desapontamento” em 1844 e foi para a Austrália, onde se tornou mineiro durante a corrida do ouro ali.38 Depois, em 1859, retornou à América passando por Londres, Inglaterra. Em um retrospecto, Barbour conta como foi que seu interesse nos períodos de tempo proféticos foi novamente despertado durante esta viagem:

O navio partiu da Austrália levando a bordo um irmão adventista [o próprio Barbour], que tinha perdido sua religião e que tinha estado por muitos anos em escuridão total. Para aliviar a monotonia de uma longa viagem no mar, [um] capelão inglês propôs uma leitura sistemática das profecias; com o que o irmão concordou prontamente; por ter sido um milerita em anos anteriores, ele sabia muito bem que havia argumentos que deixariam o capelão perplexo, muito embora a época tivesse passado.39

Durante esta leitura Barbour achou que tinha descoberto o erro crucial na contagem de Miller. Por que Miller iniciou os 1.260 “anos-dias” de Revelação capítulo 11 em 538 E.C. e iniciou os 1.290 e os 1.335 anos-dias de Daniel 12 trinta anos depois, em 508 E.C.? Não deveriam os três períodos começar na mesma data? Sendo assim, os 1.290 anos terminariam em 1828 e os 1.335 anos terminariam — não em 1843, mas — em 1873. “Chegando a Londres [em 1860], ele foi à biblioteca do Museu Britânico e, entre muitas outras obras extensas sobre as profecias, encontrou Horas com o Apocalipse”, de Elliott, na qual o autor havia reproduzido uma tabela, “A Cronologia do Mundo Segundo as Escrituras”, elaborada por seu amigo, o Reverendo Christopher Bowen. A tabela mostrava que 5.979 anos desde a criação do homem terminavam em 1851.40 Somando-se 21 anos aos 5.979 anos, Barbour descobriu que 6.000 anos terminariam em 1873. Ele encarou isto como uma notável e excitante confirmação do seu próprio cálculo do período de 1.335 anos.

Ao voltar para os Estados Unidos, Barbour tentou despertar o interesse de outros Segundo Adventistas em sua nova data para a vinda do Senhor. De 1868 em diante ele começou a pregar e a publicar suas descobertas. Vários artigos dele sobre cronologia foram publicados no Crise Mundial e no Tempos do Advento Cristão, os dois principais jornais da Associação Cristã do Advento. Em 1870 ele publicou também o panfleto de 100 páginas Evidências da Vinda do Senhor em 1873; ou o Grito da Meia-Noite, cuja segunda edição (em inglês) foi citada acima.41 Em 1873 ele iniciou um periódico mensal de sua autoria, intitulado O Grito da Meia-Noite, e Arauto da Manhã (em inglês), cuja circulação chegou a 15.000 cópias em três meses.42 Quando o ano marcado de 1873 estava quase terminando, Barbour adiou o tempo do segundo advento para o outono setentrional de 1874.43 Mas quando esse ano também passou, Barbour e os seus seguidores ficaram muito preocupados:

Quando 1874 chegou e não havia qualquer sinal visível de Jesus nas nuvens literais e numa forma carnal, houve uma reavaliação geral de todos os argumentos sobre os quais o ‘Grito da Meia-Noite’ tinha sido baseado. Como não se conseguiu encontrar qualquer falha ou imperfeição, isto levou a um exame crítico das Escrituras que pareciam ter relação com a maneira da vinda de Cristo, e logo se descobriu que esperar a segunda vinda de Jesus na carne era o erro…44 

Uma “presença invisível”

Um dos leitores do Grito da Meia-Noite, B. W. Keith (que depois foi um dos contribuintes da revista A Torre de Vigia de Sião),

. . . estivera lendo cuidadosamente o capítulo 24 de Mateus, usando a ‘Emphatic Diaglott’, uma nova e muito exata tradução palavra por palavra do Novo Testamento [traduzida e publicada por Benjamim Wilson em 1864]; quando chegou aos versículos 37 e 39 ficou muito surpreso ao descobrir que o texto diz o seguinte: ‘Como os dias de Noé, assim será a presença do Filho do homem’.46

Keith descobriu assim a palavra grega parousia, geralmente traduzida por “vinda,” traduzida aqui por “presença.” Uma ideia amplamente difundida entre os expositores nessa época era que a segunda vinda de Cristo ocorreria em duas fases, a primeira das quais seria invisível.45 Poderia ser o caso de Jesus já ter vindo no outono setentrional de 1874, embora de modo invisível, e estar invisivelmente presente desde então?

Para Barbour, esta explicação não só parecia atraente, como também uma vez que ele e seus associados não haviam conseguido encontrar falhas em seus cálculos, encararam-na como solução para o seu problema. A data estava certa, embora as suas expectativas tivessem sido erradas.

Mais uma vez, isto foi visto como um caso de se ter esperado “a coisa errada na época certa”:

Dessa forma, era evidente que, embora a maneira na qual eles tinham esperado Jesus estivesse errada, ainda assim o tempo, conforme indicado pelo ‘Grito da Meia-Noite’, estava correto, e o Noivo veio no outono setentrional de 1874…46

Entretanto, a maioria dos leitores do Grito da Meia-Noite, e Arauto da Manhã não pôde aceitar esta explicação, e os 15.000 leitores rapidamente “reduziram-se para cerca de 200.” O próprio Barbour estava convencido de que a manhã do Milênio já tinha começado a alvorecer, e por isso achou que Grito da Meia-Noite já não era um título conveniente para o seu periódico. Ele comentou: “Alguém pode me informar como é que se pode dar um ‘Grito da Meia-Noite’ pela manhã?”47 Desse modo, o jornal, que tinha deixado de ser publicado em outubro de 1874, foi reiniciado em junho de 1875 como Arauto da Manhã, dispensando assim a primeira parte do título anterior.

Em um dos primeiros números (o de setembro de 1875), Barbour publicou o seu cálculo dos tempos dos gentios, fazendo-os terminar em 1914 E.C.48 (Veja a página seguinte.)

Arauto da Manhã de setembro de 1875, no qual N. H. Barbour publicou pela primeira vez o ano 1914 como sendo o fim dos 2.520 anos.

TRADUÇÃO DO PARÁGRAFO EM DESTAQUE:

“Creio que, embora a dispensação do evangelho termine em 1878, os judeus só serão restabelecidos na Palestina em 1881; e que os “tempos dos gentios,” ou seja, seus sete tempos proféticos de 2.520 anos ou o dobro de 1.260 anos, que tiveram início em 606 A.C., quando Deus entregou tudo nas mãos de Nabucodonosor, só terminarão em 1914 A.D.; ou daqui a 40 anos”

Charles Taze Russell

Em 1870, Charles Taze Russell, enquanto era um homem de negócios de 18 anos de idade em Allegheny, Pensilvânia, formou uma classe para estudo da Bíblia, juntamente com seu pai Joseph e alguns amigos.49 O grupo foi formado em resultado dos contatos de Russell com alguns dos ex-mileritas mencionados anteriormente, especialmente Jonas Wendell, George Storrs e George Stetson.

Wendell, um pregador da Igreja Cristã do Advento de Edinboro, Pensilvânia, visitou Allegheny em 1869 e por acaso Russell foi a uma de suas reuniões, ficando fortemente impressionado pela crítica de Wendell à doutrina do inferno de fogo. Russell tinha sido educado como calvinista, mas abandonara sua herança religiosa pouco tempo antes, devido às suas dúvidas quanto às doutrinas da predestinação e do inferno de fogo. Ele estava numa séria crise religiosa nessa época e até questionava se a Bíblia era realmente a palavra de Deus. Sua reunião com Wendell e sua leitura posterior da revista de Storrs, Examinador da Bíblia (em inglês), restaurou sua fé na Bíblia. Os artigos publicados nesta revista parecem ter sido discutidos regularmente no grupo de estudo de Russell.

Embora Russell soubesse que alguns adventistas, incluindo Jonas Wendell, esperavam a vinda de Cristo em 1873, ele próprio rejeitou todo o conceito das marcações de tempo e fixação de datas. Daí, em 1876, ele começou a modificar sua posição:

Foi por volta de janeiro de 1876 que minha atenção foi especialmente atraída para o assunto do tempo profético, conforme se relaciona com estas doutrinas e esperanças. Aconteceu do seguinte modo: Recebi um jornal intitulado Arauto da Manhã, enviado por seu editor, o Sr. N. H. Barbour.50

Russell diz que ficou surpreso ao descobrir que o grupo de Barbour tinha chegado à mesma conclusão que o seu próprio grupo acerca da maneira da volta de Cristo — que ela seria “como o ladrão, e não na carne, mas como um ser espiritual, invisível aos homens.”

Russell escreveu imediatamente a Barbour a respeito da cronologia, e mais tarde naquele ano de 1876 fez arranjos para se encontrar com ele em Filadélfia, onde Russell tinha compromissos de negócios naquele verão. Russell queria que Barbour lhe mostrasse, “se fosse capaz, que as profecias indicavam 1874 como a data na qual a presença do Senhor e ‘a colheita’ começaram.” “Ele veio,” diz Russell, “e fiquei satisfeito com a evidência.”51

É evidente que durante estes encontros Russell aceitou não só a data 1874, como também todos os cálculos cronológicos de Barbour, incluindo seu cálculo dos tempos dos gentios.52 Enquanto ainda estava em Filadélfia, Russell escreveu um artigo intitulado “Os Tempos dos Gentios: Quando Terminam?” que foi publicado no periódico Examinador da Bíblia de George Storrs, na edição de outubro de 1876. Referindo-se aos “sete tempos” de Levítico 26:28, 33 e Daniel 4, na página 27 do Examinador, ele determina a duração dos tempos dos gentios como sendo 2.520 anos, que começaram em 606 A.E.C. e terminariam em 1914 E.C. — exatamente as mesmas datas a que Barbour tinha chegado e que começara a publicar um ano antes, em 1875.

Aguardando ansiosamente 1914

O que significaria, exatamente, o fim dos “tempos dos gentios” para a humanidade? Embora se tivesse proclamado que ocorreram eventos monumentais em 1874, relacionados com a vinda de Cristo, dizia-se que todos estes foram invisíveis, ocorrendo no domínio espiritual, não sendo vistos por olhos humanos. Será que ocorreria o mesmo no caso da terminação dos tempos dos gentios em 1914, ou haveria uma mudança visível, tangível, para a terra e para a sociedade humana sobre ela?

No livro Está Próximo o Tempo, publicado em inglês em 1889 (mais tarde chamado de Volume II dos Estudos das Escrituras), Russell afirmou que existia “evidência bíblica provando” que a data 1914 “será o limite extremo do governo dos homens imperfeitos.” Quais seriam as consequências disto? Russell enumerou suas expectativas para 1914 em sete pontos:

Em primeiro lugar, Que nessa data o Reino de Deus… terá obtido pleno controle, universal, e que será então ‘erigido’, ou firmemente estabelecido, na terra.

Em segundo lugar, Provará que aquele a quem pertence o direito de tomar o domínio estará então presente como novo governante da terra…

Em terceiro lugar, Provará que algum tempo antes do fim de 1914 A.D. o último membro da Igreja de Cristo divinamente reconhecida, o ‘sacerdócio real,’ ‘o corpo de Cristo,’ será glorificado juntamente com a Cabeça…

Em quarto lugar, Provará que dessa época em diante Jerusalém não será mais pisoteada pelos gentios, mas levantar-se-á do pó do desfavor divino, para a honra; porque os ‘Tempos dos Gentios’ estarão cumpridos ou completos.

Em quinto lugar, Provará que nessa data, ou antes, a cegueira de Israel começará a ser eliminada; pois sua ‘cegueira parcial’ continuaria apenas ‘até que a plenitude dos gentios tenha entrado’ (Rom. 11:25)…

Em sexto lugar, Provará que o grande ‘tempo de tribulação tal como nunca houve desde que existem nações,’ atingirá sua culminação num reinado mundial de anarquia … e os ‘novos céus e nova terra’ com suas bênçãos pacíficas começarão a ser reconhecidos pela humanidade agitada por problemas.

Em sétimo lugar, Provará que antes dessa data o Reino de Deus, organizado em poder, estará na terra e então golpeará e esmagará a imagem gentia (Dan. 2: 34) – e consumirá completamente o poder destes reis.”53

Estas eram realmente predições bem ousadas. Será que Russell acreditava realmente que todas estas coisas notáveis ocorreriam dentro dos vinte e cinco anos seguintes? Sim, acreditava; na verdade, ele acreditava que sua cronologia era de Deus, não apenas dele mesmo. Em 1894 ele escreveu a respeito da data 1914:

Não vemos qualquer razão para mudar os números — nem poderíamos mudá-los se quiséssemos. Estas são, como cremos, datas de Deus, não nossas. Mas tenham em mente que o fim de 1914 não é a data do início, mas do fim do tempo de tribulação.54

Assim, pensava-se que o “tempo de tribulação” deveria começar alguns anos antes de 1914, “não depois de 1910,” atingindo seu clímax em 1914.55

Todavia, em 1904, apenas dez anos antes de 1914, Russell mudou de opinião sobre este assunto. Em um artigo na edição de 1º de julho de 1904 da Torre de Vigia de Sião, intitulado “Anarquia universal — logo antes ou depois de outubro de 1914 A.D.”, ele argumentou que o tempo de tribulação, com sua anarquia mundial, começaria depois de outubro de 1914:

Agora esperamos que a culminação anárquica do grande tempo de tribulação que precederá as bênçãos milenares será depois de outubro de 1914 A.D. — muito rapidamente depois disso, em nossa opinião — ‘em uma hora,’ ‘subitamente,’ porque não se deve esperar que ‘os nossos quarenta anos’ de colheita, terminando em outubro de 1914 A.D., incluam o terrível período de anarquia que as Escrituras indicam ser o destino da cristandade.56

Esta mudança levou alguns leitores a pensar que poderia haver também outros erros no sistema cronológico — um leitor até sugeriu que a cronologia do Bispo Ussher poderia estar mais correta ao datar a destruição de Jerusalém como tendo ocorrido em 587 A.E.C. em vez de em 606 A.E.C. Isto faria os 2.520 anos terminar por volta de 1934 em vez de em 1914. Mas Russell reafirmou fortemente a sua crença na data 1914, referindo-se a outros alegados “paralelos de tempo” que apontavam para 1914:

Não temos conhecimento de qualquer razão para mudar um número: fazer isso estragaria as harmonias e paralelos tão notáveis entre a era judaica e a era do evangelho.57

Respondendo a outro leitor, ele disse:

A harmonia dos períodos proféticos é uma das provas mais fortes da exatidão de nossa cronologia bíblica. Eles ajustam-se uns aos outros como as rodas dentadas de uma máquina perfeita. Mudar a cronologia, mesmo em um ano que seja, destruiria toda esta harmonia, — de tão exatas que são as várias provas reunidas nos paralelos entre as eras judaica e cristã.58

Estes argumentos foram apoiados adicionalmente por artigos escritos pelos irmãos Edgar, da Escócia.59

Dúvidas crescentes

Assim, em 1904 Russell ainda estava tão convicto da exatidão de suas datas como em 1889, quando escreveu que o entendimento destas características do tempo era a “selagem na testa” mencionada em Revelação 7:3.60

Entretanto, à medida que a data 1914 se aproximava, Russell tornou-se cada vez mais cauteloso em suas declarações. Respondendo à pergunta de um estudante da Bíblia em 1907, ele disse que “nunca alegamos que nossos cálculos são infalivelmente corretos; nunca alegamos que eram conhecimento, nem que eram baseados em evidência, fatos ou conhecimento incontestáveis; nossa alegação sempre tem sido que eles são baseados na .”61

As datas já não pareciam qualificar-se como “datas de Deus”, como ele tinha declarado treze anos antes; agora elas podiam ser falíveis. Russell até considerou a possibilidade de 1914 (e 1915) passarem, sem que ocorressem quaisquer dos eventos esperados:

Mas, suponhamos um caso que está longe das nossas expectativas: suponhamos que 1915 A.D. passe com os assuntos mundiais completamente serenos e com evidência de que os ‘próprios eleitos’ não tenham sido todos ‘mudados’ e sem a restauração do Israel natural ao favor sob o Novo Pacto. (Rom. 11:12, 15) E então? Não provaria isso que nossa cronologia está errada? Sim, certamente! E não seria isso um profundo desapontamento? Realmente seria! … Que golpe isso seria! Uma das cordas de nossa ‘harpa’ estaria completamente partida! Entretanto, queridos amigos, nossa harpa ainda teria todas as outras cordas afinadas e disso nenhuma outra agremiação do povo de Deus na terra pode se gabar.62

Outro ponto de incerteza era se deveria ser incluído um ano zero (entre 1 A.E.C. e 1 E.C.) no cálculo ou não. Este assunto tinha sido mencionado por Russell já em 1904, mas ganhou importância conforme o ano de 1914 se aproximava.

A data 1914 havia sido obtida simplesmente subtraindo-se 606 de 2.520, mas gradualmente se percebeu que não existe ano zero na contagem do tempo de nosso calendário atual. Consequentemente, de 1º de outubro de 606 A.E.C. até o início de janeiro de 1 E.C., são apenas 605 anos e três meses, e do início de janeiro de 1 E.C. até outubro de 1914 são apenas 1913 anos e 9 meses, perfazendo um total de 2.519 anos, não 2.520. Isto significaria que os 2.520 anos terminariam em outubro de 1915, em vez de em outubro de 1914.63 Mas quando a guerra na Europa irrompeu em agosto de 1914, parecia evidentemente uma má ocasião para corrigir este erro. Ele foi mantido.

Em 1913, com 1914 às portas, a cautela com respeito a esse ano tinha aumentado. No artigo “Tornai Manifesta a Vossa Moderação”, que apareceu na edição de 1º de junho de 1913 da revista A Torre de Vigia, Russell alertou seus leitores contra gastar “tempo e energia valiosos em conjeturar o que ocorrerá neste ano, no próximo ano, etc.” A confiança dele no esquema de acontecimentos que tinha publicado antes já não era evidente: “Estas são as boas novas da graça de Deus em Cristo — quer a igreja seja completada antes de 1914 quer não.”64 Ele expressou-se ainda mais vagamente na edição de 15 de outubro do mesmo ano:

Estamos esperando pelo tempo em que o governo do mundo será entregue ao Messias. Não podemos dizer que pode não ser em outubro de 1914 ou em outubro de 1915. É possível que nosso cálculo relacionado com isso esteja errado em vários anos. Não podemos dizer com certeza. Não sabemos. É uma questão de fé, não de conhecimento.65

Antes, 1914 tinha sido uma das “datas de Deus”, e “mudar a cronologia, mesmo em um ano que seja, destruiria toda esta harmonia.” Mas agora eles “poderiam estar errados no cálculo relacionado com isso em vários anos,” e nada poderia ser dito “com certeza” sobre o assunto. Esta foi uma verdadeira reviravolta! Se isso era realmente “uma questão de fé,” podemos apenas nos perguntar em que ou em quem essa fé era baseada.

A fé vacilante do próprio Russell em sua cronologia manifestou-se adicionalmente na revista A Torre de Vigia de 1º de janeiro de 1914, na qual ele declarou: “Como já foi indicado, não estamos de modo algum confiantes de que este ano, 1914, testemunhará mudanças tão radicais e rápidas na dispensação como esperávamos.”66 O artigo “Os Dias Estão Próximos”, na mesma edição, é especialmente revelador:

Se mais tarde for demonstrado que a igreja não está glorificada por volta de outubro de 1914, tentaremos ficar contentes com a vontade do Senhor, qualquer que seja ela…. Se 1915 passasse sem a transferência da igreja, sem o tempo de tribulação, etc., isso pareceria uma grande calamidade para alguns. Não seria assim conosco…. Se na providência do Senhor o tempo tivesse de chegar vinte e cinco anos depois, então seria essa a nossa vontade…. Se outubro de 1915 passasse e nos encontrássemos ainda aqui, com as coisas continuando exatamente como estão no presente, e o mundo aparentemente fazendo progresso no sentido de resolver conflitos, e não houvesse qualquer tempo de tribulação à vista, e a igreja nominal ainda não estivesse federada, etc., diríamos que evidentemente estivemos enganados em alguma parte de nosso cálculo. Nesse caso, faríamos cuidadoso exame adicional das profecias, para ver se poderíamos encontrar um erro. E então pensaríamos, Estivemos esperando a coisa errada no tempo certo? A vontade do Senhor pode permitir isto.67

Novamente, na edição de 1º de maio de 1914 — esquecendo suas declarações anteriores sobre as “datas de Deus” e sobre a “evidência bíblica provando” que os desenvolvimentos preditos ocorreriam em 1914 — Russell disse a seus leitores que “nestas colunas e nos seis volumes de ESTUDOS DAS ESCRITURAS expusemos tudo o que tem relação com os tempos e as épocas numa forma experimental; quer dizer, não positivamente, não alegando que sabíamos, mas meramente com a sugestão de que ‘isto e aquilo’ parece ser o ensino da Bíblia.”68

Dois meses depois, Russell parecia estar a ponto de rejeitar completamente sua cronologia. Respondendo a um colportor, que quis saber se os Estudos das Escrituras estariam em circulação depois de outubro de 1914, “já que o irmão [Russell] tem algumas dúvidas quanto ao cumprimento completo de tudo o que se espera por volta ou antes de outubro de 1914,” Russell respondeu:

Acreditamos que estes livros estarão à venda e serão lidos durante anos no futuro, contanto que a era do Evangelho e seu trabalho continue…. Não tentamos dizer que estes pontos de vista são infalíveis, mas expusemos os processos de raciocínio e de cálculo, deixando a cada leitor o dever e o privilégio de ler, pensar e calcular por si mesmo. Essa será uma questão interessante daqui a cem anos; e se alguém conseguir calcular e raciocinar melhor, ainda estará interessado no que apresentamos.69

Assim, por volta de julho de 1914 Russell parecia pronto a aceitar a ideia de que a data 1914 era provavelmente um fracasso, e que seus escritos sobre o assunto seriam meramente de interesse histórico para os estudantes da Bíblia cem anos depois! 

Reações ao irrompimento da guerra

Com a deflagração da guerra na Europa em agosto de 1914, a confiança vacilante de Russell na cronologia começou a se recuperar. Embora a própria guerra não se encaixasse exatamente no padrão dos eventos preditos — que o “tempo de tribulação” seria uma luta de classes entre o capital e o trabalho, levando a um período de anarquia mundial — ele viu na guerra o prelúdio dessa situação:

Acreditamos que o Socialismo é o fator principal na guerra atualmente em curso, a qual será a maior e mais terrível guerra da terra — e provavelmente a última.70

Mais tarde em 1914, ele escreveu:

Achamos que a atual angústia entre as nações é meramente o princípio deste tempo de tribulação…. A anarquia que se seguirá a esta guerra será o verdadeiro tempo de tribulação. Nossa opinião é que a guerra enfraquecerá de tal maneira as nações que em seguida haverá uma tentativa de introduzir ideias socialistas, e que isto será enfrentado pelos governos – [etc., levando a uma luta de classes e anarquia mundiais].71

Assim como outros autores milenaristas, Russell acreditava que o término dos tempos dos gentios significaria uma restauração da nação judaica na Palestina. Porém, perto do fim de 1914 a Palestina e Jerusalém ainda estavam ocupadas por gentios. Parecia óbvio que a restauração não começaria a ocorrer em 1914 como tinha sido predito. Assim, na edição de 1º de novembro da revista A Torre de Vigia, Russell tentou reinterpretar o fim dos tempos dos gentios como significando o fim da perseguição aos judeus:

O pisoteamento dos judeus cessou. Por todo o mundo os judeus estão agora livres — até mesmo na Rússia. Em 5 de setembro, o Czar da Rússia emitiu uma proclamação a todos os judeus do Império Russo; e isto foi antes de os tempos dos gentios terem terminado. Ela determinou que os judeus poderiam ter acesso aos mais altos postos no exército russo, e que a religião judaica deveria ter a mesma liberdade que qualquer outra religião na Rússia. Onde é que os judeus estão sendo pisoteados agora? Onde é que estão sendo submetidos à humilhação? Atualmente eles não estão sendo perseguidos de modo algum. Acreditamos que o pisoteamento de Jerusalém cessou, porque acabou o tempo para os gentios pisotearem Israel.72

Todavia, o alívio para os judeus na Rússia e em outros lugares, mencionado por Russell, acabou por ser apenas temporário. Ele não podia, naturalmente, prever as violentas perseguições que sobreviriam aos judeus na Alemanha, na Polônia e em outros países durante a Segunda Guerra Mundial.

Desde a deflagração da Primeira Guerra Mundial até sua morte em outubro de 1916, a restaurada confiança de Russell em sua cronologia permaneceu inabalável, conforme se evidencia pelos seguintes trechos de vários números da revista A Torre de Vigia durante esse período:

1º de janeiro de 1915: “. . . a guerra é a que foi predita nas Escrituras como associada com o grande dia do Deus Altíssimo — ‘o dia de vingança de nosso Deus.’”73

15 de setembro de 1915: “Traçando a cronologia das Escrituras até os nossos dias, descobrimos que estamos agora vivendo exatamente na aurora do grande sétimo dia da grande semana do homem. Isto é abundantemente corroborado pelos eventos que ocorrem agora à nossa volta o tempo todo.”74

15 de fevereiro de 1916: “Em ESTUDOS DAS ESCRITURAS, Vol. IV, indicamos claramente as coisas que estão ocorrendo agora, e as condições piores ainda por vir.”75

15 de abril de 1916: “Cremos que as datas se mostraram muito corretas. Cremos que os tempos dos gentios terminaram e que Deus está agora permitindo que os governos gentios se destruam, para preparar o caminho para o reino do Messias.”76

1º de setembro de 1916: “Ainda nos parece claro que o período profético que conhecemos como Tempos dos Gentios, terminou cronologicamente em outubro de 1914. O fato de ter começado o grande dia da ira sobre as nações marca um bom cumprimento de nossas expectativas.”77

Em novembro de 1918, porém, a Primeira Guerra Mundial terminou subitamente — sem ser seguida por uma revolução socialista e anarquia mundiais, como tinha sido predito. O último membro da “Igreja de Cristo divinamente reconhecida” não tinha sido glorificado, a cidade de Jerusalém ainda estava sendo controlada pelos gentios, o reino de Deus não tinha esmagado “a imagem gentia”, e os “novos céus e nova terra” não podiam ser vistos em parte alguma pela humanidade afligida por problemas. Nem sequer uma das sete predições enumeradas no livro Está Próximo o Tempo se tornara realidade.78 Para se dizer o mínimo, os “Estudantes da Bíblia” do Pastor Russell estavam confusos.

No entanto — embora não estivesse entre as predições — algo tinha ocorrido: A Guerra Mundial. Poderia afinal de contas ser o caso de o tempo estar certo, muito embora as predições tivessem falhado? A explicação a que os Adventistas recorreram depois de 1844 e que também foi usada por Barbour e por seus associados depois de 1874 — segundo a qual eles tinham esperado “a coisa errada na época certa” — parecia agora ainda mais apropriada.79 Mas como podia a época estar certa, se tinham falhado todas as predições baseadas nela? Durante anos, muitos dos seguidores de Russell sentiram profunda perplexidade por não terem ocorrido os eventos preditos. Após um lapso de alguns anos, J. F. Rutherford, o sucessor de Russell como presidente da Sociedade Torre de Vigia, começou a explicar, passo a passo, o que “realmente” havia se cumprido de 1914 em diante.

No discurso “Está Próximo o Reino do Céu”, do congresso de Cedar Point realizado de 5 a 13 de setembro de 1922, Rutherford disse à assistência que o Reino de Deus tinha sido realmente estabelecido em 1914, não na terra, e sim nos céus invisíveis!80 E três anos depois, em 1925, ele aplicou Revelação 12 a este evento, dizendo que o Reino de Deus tinha nascido no céu em 1914, segundo esta profecia.81

Antes, as predições da Torre de Vigia tinham sido todas referentes a uma óbvia e claramente visível tomada do governo da terra por Cristo. Agora isto era apresentado como algo invisível, evidente apenas para um grupo seleto.

Também no congresso de Cedar Point em 1922, Rutherford apresentou pela primeira vez a interpretação de que “em 1918, ou próximo disso, o Senhor veio ao seu templo (espiritual).”82 Antes, Russell e seus associados tinham interpretado que a ressurreição celestial ocorrera em 1878. Mas em 1927 Rutherford transferiu esse evento para 1918.83 De maneira semelhante, no início da década de 1930 Rutherford mudou a data do início da presença invisível de Cristo de 1874 para 1914.84

Assim Rutherford gradualmente substituiu as predições fracassadas por uma série de eventos invisíveis e espirituais associados com os anos 1914 e 1918. Noventa anos depois de 1914, as “explicações” de Rutherford ainda são defendidas pelas Testemunhas de Jeová.

Resumo

A interpretação dos “tempos dos gentios” como sendo 2.520 anos, que começaram em 607 A.E.C. (originalmente 606 A.E.C.) e terminaram em 1914 E.C., não foi alguma revelação divina feita ao Pastor Charles Taze Russell no outono setentrional de 1876. Pelo contrário, esta ideia tem uma longa história de desenvolvimento, com suas raízes bem recuadas no passado.

Ela teve sua origem no “princípio ano-dia,” inicialmente proposto pelo rabino Akiba ben José no primeiro século E.C. Do nono século em diante, este princípio foi aplicado aos períodos de tempo de Daniel por vários rabinos judaicos.

Entre os cristãos, Joaquim de Flora, no século 12, foi provavelmente o primeiro a adotar a ideia, aplicando-a aos 1.260 dias de Revelação e aos três tempos e meio de Daniel. Depois da morte de Joaquim, seus seguidores logo identificaram o período de 1.260 anos com os tempos dos gentios de Lucas 21:24, e esta interpretação era então comum entre grupos classificados como hereges pela igreja de Roma durante os séculos seguintes, incluindo os reformadores.

Conforme o tempo foi passando e as explicações anteriores se mostravam erradas, sem se cumprirem as expectativas, o ponto inicial dos 1.260 (ou 1.290) anos foi progressivamente adiantado, para fazer com que os períodos sempre terminassem no futuro próximo.

O primeiro a chegar a um período de 2.520 anos foi evidentemente John Aquila Brown, em 1823. Embora o cálculo dele se baseasse nos “sete tempos” de Daniel 4, ele não igualou esses períodos com os “tempos dos gentios” de Lucas 21:24. Mas isto foi feito logo em seguida por outros expositores. Fixando o ponto inicial em 604 A.E.C., Brown chegou ao ano 1917 como a data final dos sete tempos. Usando pontos iniciais diferentes, outros comentaristas bíblicos nas décadas seguintes chegaram a várias datas finais diferentes. Alguns escritores, que faziam experiências com os “ciclos dos jubileus” bíblicos, chegaram a um período de 2.450 (ou 2.452) anos (49×49+49), que eles defendiam ser o período dos tempos dos gentios.

A tabela acompanhante apresenta uma seleção de aplicações dos 2.520 (e 2.450) anos feitas por vários autores durante o século dezenove e no início do século vinte. Na verdade os cálculos foram tão numerosos, que provavelmente seria difícil encontrar um único ano entre 1830 e 1930 que não tenha sido indicado em algum cálculo como sendo a data final dos tempos dos gentios! Por isso, não admira que vários expositores tenham apontado para 1914 ou outros anos próximos desta data, tais como 1915, 1916, 1917, 1918, 1919, 1922 e 1923. A data 1914 mui provavelmente teria afundado no mar das outras datas fracassadas e já estaria agora esquecida, se por acaso a Primeira Guerra Mundial não tivesse irrompido naquele ano.

TABELA 2: APLICAÇÕES DOS 2.520 (OU 2.450) ANOS

ExpositorDataPublicaçãoAplicação
AEC-EC
Comentários
John Aquila Brown1823O Anoitecer…604-1917= “Sete tempos” de Daniel 4
William Cuninghame1827Diálogos Sobre Profecia, Vol. 1728-1792Relatório das conferências proféticas de Albury Park
Henry Drummond1827Idem722-1798
G. S. Faber1828O Calendário Sagrado de Profecia657-1864 
Alfred Addis1829Céu Aberto680-1840 
William Digby1831Um Tratado Sobre os 1260 Dias723-1793 
W. A. Holmes1833O Tempo do Fim685-1835 
Matthew Habershon1834Uma Dissertação …677-1843 
John Fry1835Profecias Não-Cumpridas…677-1843 
William W. Pym1835Uma Palavra de Alerta…673-1847 
William Miller1842Primeiro Relatório…677-1843 
Th. R. Birks1843Os Fundamentos da Profecia Sagrada606-1843Tempos dos Gentios = 2.450 anos
Edward B. Elliott1844Horas Com o Apocalipse, Vol. III727-1793 
Edward B. Elliott1844Idem606-1914Uma segunda alternativa
Matthew Habershon1844Uma Exposição Histórica676-1844 
Matthew Habershon1844Idem601-1919Uma segunda alternativa
William Cuninghame1847O Cumprimento…606-1847Tempos dos Gentios = 2.452 anos
James Hatley Frere1848A Grande Revolução Continental603-1847Tempos dos Gentios = 2.450 anos
Robert Seeley1849Um Atlas de Profecia606-1914Contados desde “606 ou 607”
Robert Seeley1849Idem570-1950Uma segunda alternativa
Robert Seeley1849Idem728-1792Uma terceira alternativa
Edward Bickersteth1850Uma Ajuda das Escrituras727-1793Outro de seus cálculos era 677-1843
Robert Seeley1850Idem602-1918
Anônimo1856A Torre de Vigia727-1793Um panfleto
Richard C. Shimeall1859Nossa Cronologia Bíblica652-1868 
J. S. Phillips1865O Arco-Íris,1º de março652-1867Um periódico londrino editado por William Leask
“J. M. N.”1865O Arco-Íris,1º de abril658/47-1862/73
Frederick W. Farrar1865O Arco-Íris,1º de novembro654-1866 
Anônimo1870Os Tempos Proféticos, dezembro715-1805Um periódico editado por Joseph A. Seiss et al. Estes são alguns exemplos; o escritor apresenta doze alternativas diferentes!
Anônimo1870Idem698-1822
Anônimo1870Idem643-1877
Anônimo1870Idem606-1914
Anônimo1870Idem598-1922
Joseph Baylee1871Os Tempos dos Gentios623-1896 
“P. H. G.”1871Revista Trimestral de Profecia, abril652/49-1868/71Um periódico londrino editado por Horácio Bonar
Edward White1874Nossa Esperança, junho626-1894Periódico londrino editado por Wm. Maude
N. H. Barbour1875Arauto da Manhã,setembro e outubro606-1914Periódico publicado por Nelson H. Barbour
C. T. Russell1876Examinador da Bíblia, outubro606-1914Editado por George Storrs
E. H. Tuckett1877O Arco-Íris,agosto651/50-1869/70 
M. P. Baxter1880Quarenta Maravilhas Vindouras, 5.ª ed.695-1825 
M. P. Baxter1880Idem620-1900Uma segunda alternativa
H. Grattan Guinness1886Luz Para os Últimos Dias606-1915Estas são apenas algumas das suas muitas análises diferentes
H. Grattan Guinness1886Idem604-1917
H. Grattan Guinness1886Idem598-1923
H. Grattan Guinness1886Idem587-1934
W. E. Blackstone1916Semanário Evangélico,13 de maio606-1915Este artigo resume suas opiniões conforme publicadas muitos anos antes
W. E. Blackstone1916Idem595-1926
W. E. Blackstone1916Idem587-1934

Quando, lá em 1844, E. B. Elliott sugeriu 1914 como uma possível data final para os tempos dos gentios, ele computou os 2.520 anos desde o ano de ascensão de Nabucodonosor, que datou em 606 A.E.C. Entretanto, N. H. Barbour computou os 2.520 anos desde a desolação de Jerusalém, no 18º ano do reinado de Nabucodonosor. Mas, como em 1875 Barbour datou este evento em 606 A.E.C., ele também chegou a 1914 como a data final. Uma vez que as cronologias deles não só conflitavam entre si, como estavam também em conflito com a cronologia historicamente estabelecida para o reinado de Nabucodonosor, o fato de terem chegado ao mesmo ano final foi simplesmente uma coincidência, demonstrando quão arbitrários e infundados seus cálculos realmente eram.

O cálculo de Barbour foi aceito por C. T. Russell no encontro deles em 1876. Barbour tinha então 52 anos de idade, enquanto Russell tinha 24 — ainda muito jovem. Embora seus caminhos se tenham separado novamente em 1879, Russell não abandonou os cálculos de Barbour referentes a datas, e desde essa época a data 1914 tem sido o ponto central nas explicações proféticas entre os seguidores de Russell.

Suplemento ao capítulo 1, a partir da terceira edição em inglês

A informação apresentada neste capítulo tem estado disponível às Testemunhas de Jeová desde 1983, quando a primeira edição deste livro foi publicada em inglês. Além disso, a mesma informação foi resumida por Raymond Franz no capítulo 7 de sua obra amplamente conhecida, Crise de Consciência, publicada em inglês no mesmo ano. Assim, em 1993 — 10 anos depois — a Sociedade Torre de Vigia finalmente se viu obrigada a admitir que nem o cálculo dos 2.520 anos nem a data 1914 se originaram com Charles Taze Russell, como tinha sido defendido até então. Mais ainda, a Sociedade agora admite também que falharam as predições de Russell e de seus associados, referentes a 1914.

Estas admissões encontram-se nas páginas 134-137 de Testemunhas de Jeová — Proclamadores do Reino de Deus, um livro sobre a história do movimento, publicado pela Sociedade Torre de Vigia em 1993. Antes de 1993 transmitia-se a impressão de que Russell tinha sido o primeiro a publicar o cálculo dos 2.520 anos, apontando para 1914, fazendo isto pela primeira vez na edição de outubro de 1876 da revista Examinador da Bíblia, de George Storrs. Dizia-se também que, com décadas de antecedência, Russell e seus seguidores predisseram o irrompimento da Primeira Guerra Mundial em 1914 e outros eventos associados com a guerra. Assim, o livro anterior sobre a história da organização, As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino citou algumas declarações muito genéricas feitas no livro O Plano das Eras (publicado em inglês em 1886) sobre o “tempo de tribulação” (que originalmente se acreditava estender-se de 1874 a 1914) e afirmou:

Embora isto ainda fosse décadas antes da primeira guerra mundial, é surpreendente quão exatamente os eventos que finalmente ocorreram foram realmente previstos. (Ênfase acrescentada.)85

Similarmente, A Sentinela de 1º de fevereiro de 1972 fez as seguintes afirmações pretensiosas na página 84:

As testemunhas de Jeová, à base da cronologia bíblica, já em 1877 apontavam para o ano de 1914 como sendo de grande significado. . . .

Veio então o ano momentoso de 1914 e com ele a Primeira Guerra Mundial, o transtorno mais amplo da história até aquele tempo. Trouxe consigo matança, fome, pestilência e quedas de governos, sem precedentes. O mundo não esperava eventos tão horríveis como ocorreram. Mas as testemunhas de Jeová esperavam tais coisas, e outros reconheceram que as esperavam….

Como podiam as testemunhas de Jeová saber com tanta antecedência o que nem os próprios líderes do mundo sabiam? Apenas por meio do espírito santo de Deus, que lhes dava a conhecer tais verdades proféticas. É verdade que alguns afirmam hoje que tais acontecimentos não eram tão difíceis de predizer, visto que a humanidade por muito tempo tem conhecido diversas tribulações. Mas, se aqueles acontecimentos não eram tão difíceis de predizer, por que não o fizeram todos os políticos, líderes religiosos e peritos de economia? Por que diziam ao povo o contrário?  (Ênfase acrescentada.)

Infelizmente para a Sociedade Torre de Vigia, nenhuma destas afirmações está de acordo com os fatos históricos. Quer isso seja deliberado ou resultado de ignorância, cada uma delas representa uma grave distorção da realidade.

Em primeiro lugar, embora existissem várias predições nas publicações da Torre de Vigia sobre o que ocorreria em 1914, nenhuma delas tinha qualquer similaridade com uma predição do irrompimento de uma guerra mundial naquele ano.

Em segundo lugar, os líderes políticos e religiosos, ao contrário das declarações feitas na Sentinela citada acima, já esperavam muito antes de 1914 que mais cedo ou mais tarde uma grande guerra irromperia na Europa. Já em 1871, Otto von Bismarck, o primeiro Alto Chanceler do Império Alemão, declarou que a “Grande Guerra” viria algum dia. Por décadas antes de 1914, os jornais diários e os semanários ocupavam-se constantemente com o tema. Para citar apenas um exemplo dentre muitos, o número de janeiro de 1892 do altamente respeitado semanário inglês Preto e Branco, explicou numa introdução editorial a um folhetim sobre a vindoura guerra:

O ar está cheio de rumores de Guerra. As nações europeias estão plenamente armadas e preparadas para a mobilização imediata. As autoridades concordam que uma GRANDE GUERRA deve irromper no futuro imediato, e que esta Guerra será travada sob condições novas e surpreendentes. Todos os fatos parecem indicar que o vindouro conflito será o mais sangrento da história e envolverá consequências marcantes para o mundo inteiro. O incidente que precipitará o desastre pode ocorrer a qualquer momento.86

I. F. Clarke, em seu livro Vozes Profetizando Guerra 1763-1984 (em inglês), explica até que ponto a Primeira Guerra Mundial “estava sendo preparada na realidade e na ficção”:

De 1871 em diante, as principais potências europeias preparavam-se para a grande guerra que Bismarck tinha dito que viria um dia. E por cerca de meio século, enquanto os gabinetes gerais dos ministérios discutiam sobre armas, estimativas e táticas, a história da guerra por vir era um tema dominante no campo da ficção especulativa…. O período desde a década de 1880 até o longamente esperado irrompimento da guerra seguinte em 1914 viu o surgimento do maior número destas histórias sobre conflitos vindouros que já havia aparecido na ficção europeia.87

Portanto, as pessoas daquela época não podiam evitar ser expostas a constantes predições sobre uma vindoura guerra na Europa. A questão não era se a Grande Guerra irromperia, mas sim quando. Neste particular havia lugar para especulações e muitos contos e novelas fictícias sugeriam datas diferentes. Às vezes datas específicas eram indicadas até nos próprios títulos dos livros, como por exemplo, Europa in Flammen. Der deutsche Zukunftskrieg 1909 [A Europa em Chamas. A Vindoura Guerra Alemã de 1909], de Michael Wagebald, publicado em 1908, e A Invasão de 1910, de W. LeQueux, publicado em inglês em 1906.

Políticos e estadistas também tentaram algumas vezes determinar o ano específico do irrompimento da grande guerra que se esperava. Um dos mais sortudos foi M. Francis Delaisi, um membro da Câmara Francesa de Deputados. Em seu artigo “La Guerre qui Vient” [A Vindoura Guerra], publicado no periódico parisiense La Guerre Sociale em 1911, ele discutiu extensivamente a situação diplomática, concluindo que “uma guerra terrível entre a Inglaterra e a Alemanha está se configurando.” Conforme mostram os trechos de seu artigo apresentados a seguir, algumas de suas previsões políticas revelaram-se notavelmente exatas:

Está se configurando um conflito que fará o horrível massacre da Guerra Russo-Japonesa [em 1904-1905] parecer uma brincadeira de criança, em comparação.

Em 1914 as forças [navais] da Inglaterra e da Alemanha serão quase iguais.

Um corpo do exército prussiano avançará em marchas vigorosas para ocupar Antuérpia.

Nós, os franceses, teremos de travar o combate nas planícies belgas.

Todos os jornais imprimirão em cabeçalhos tão grandes como sua mão estas palavras proféticas: VIOLADA A NEUTRALIDADE DA BÉLGICA. O EXÉRCITO PRUSSIANO MARCHA SOBRE LILLE.88

Na esfera religiosa, eram especialmente os “milenaristas” que apresentavam predições da proximidade do fim do mundo. Este movimento incluía milhões de cristãos de diferentes quadrantes, batistas, pentecostais, e assim por diante. O Pastor Russell e seus seguidores, os “Estudantes da Bíblia,” eram apenas um pequeno ramo deste amplo movimento. Um fator comum a todos eles era sua visão pessimista do futuro. Em seu livro Armagedom Agora!, Dwight Wilson descreve a reação deles quando irrompeu a Grande Guerra em 1914:

A guerra em si mesma não foi um choque para estes oponentes do otimismo pós-milênio; eles não só esperavam o apogeu da era no Armagedom, como também antecipavam ‘guerras e rumores de guerras’ como sinais da proximidade do fim.89

Wilson então prossegue citando um deles, R. A. Torrey, deão do Instituto Bíblico de Los Angeles que, em 1913, um ano antes do início da guerra, escreveu em seu livro A Volta do Senhor Jesus (em inglês): “Falamos de desarmamento, mas todos nós sabemos que ele não virá. Todos os nossos atuais planos de paz acabarão na mais terrível das guerras e conflitos que este velho mundo já viu!”90

Conforme Theodore Graebner diz no seu livro A Guerra à Luz da Profecia (em inglês), a guerra de 1914 mal tinha começado e uma grande hoste de escritores de várias procedências religiosas se levantou, alegando que a guerra tinha sido predita:

Logo foi dado o anúncio por vários pesquisadores: “ELA FOI PREDITA”. Imediatamente, milhares de cristãos bíblicos se interessaram. Imediatamente também, outros se puseram a discutir sobre Gogue de Magogue, Armagedom, as Setenta Semanas, 666, 1.260, etc., e logo os periódicos religiosos, neste país e no estrangeiro, continham a mensagem, anunciada com maior ou menor convicção, “ELA FOI PREDITA”. Apareceram panfletos e tratados promulgando a mesma mensagem, e logo estavam no mercado vários livros, com 350 páginas cada, que não só continham muita ‘prova’ circunstancial para suas afirmações, como também anunciavam da mesma forma o momento exato em que a guerra terminaria, quem seriam os vencedores, e o significado da guerra para a Igreja Cristã, que agora (segundo se dizia) estava para entrar em seu período milenar.91

Graebner, que se sentiu induzido a examinar um grande número destes argumentos, concluiu, depois de uma investigação muito extensa, que:

. . . todo o aglomerado de literatura milenarista que floresceu durante a Primeira Guerra Mundial — e foi um aglomerado tremendo — foi definitiva, completa e absolutamente refutada pelos acontecimentos. Nem num único ponto a Primeira Guerra Mundial se desenrolou como seria de esperar depois de se ler os intérpretes quiliastas [milenaristas]. Nem [um] único deles predisse o desfecho da guerra. Nem [um] único deles predisse a entrada dos Estados Unidos. Nem [um] único deles predisse a Segunda Guerra Mundial.92

As especulações do Pastor Russell sobre a vindoura grande guerra na Europa não diferiam consideravelmente das feitas pelos escritores de novelas e expositores milenaristas contemporâneos. Na Torre de Vigia de Sião de fevereiro de 1885, ele escreveu: “Nuvens tempestuosas estão ficando espessas sobre o velho mundo. Isto faz parecer que uma grande guerra europeia é uma das possibilidades do futuro próximo.”93

Dois anos depois, comentando sobre a situação prevalecente no mundo, ele concluiu na edição de fevereiro de 1887: “Tudo isto parece indicar que no próximo verão [1888] estará em andamento uma guerra que poderá envolver todas as nações da Europa.”94 Na edição de 15 de janeiro de 1892, ele adiou a guerra para “por volta de 1905”, frisando ao mesmo tempo que esta Grande Guerra nada tinha que ver com 1914 e com as expectativas ligadas a essa data. Em 1914 ele esperava — não uma guerra europeia geral — mas o clímax da “batalha do Armagedom” (que ele achava que tinha começado em 1874), quando todas as nações da terra seriam esmagadas e substituídas pelo reino de Deus. Ele escreveu:

Os jornais diários, os semanários e os mensários religiosos e seculares, estão continuamente discutindo as perspectivas da guerra na Europa. Eles notam as queixas e ambições das várias nações e predizem que a guerra é inevitável num dia não muito distante, que ela pode começar a qualquer momento entre as grandes potências, e que as perspectivas são de que ela por fim envolverá a todas….

Mas, apesar destas predições e dos bons motivos que muitos veem para fazê-las, não compartilhamos delas. Ou seja, não achamos que as perspectivas de uma guerra europeia geral sejam tão manifestas como geralmente se supõe…. Mesmo que uma guerra ou revolução irrompesse na Europa antes de 1905, nós não a consideramos como parte das severas tribulações preditas. . . . [A] nuvem da guerra, escura como nunca, vai se precipitar com toda a sua fúria destrutiva. Porém, considerando-se o intervalo aproximado que se exige para os eventos preditos, não esperamos esta culminação antes de 1905, apesar do rápido progresso neste sentido que é agora possível.95

A amplamente esperada Grande Guerra finalmente veio em 1914. Mas provavelmente ninguém tinha predito que ela viria naquele ano. Mesmo que alguém tenha feito isso, tal pessoa não foi Charles Taze Russell ou algum dos seguidores dele. Os eventos bem diferentes que ele e seus associados “Estudantes da Bíblia” tinham atribuído a essa data não ocorreram. Assim como as predições de muitos outros escritores milenaristas contemporâneos, as predições de Russell foram “definitiva, completa e absolutamente refutadas pelos acontecimentos.”

Afirmar depois, como a Sociedade Torre de Vigia fez repetidamente até 1993, que eles, e somente eles, tinham predito “exatamente” o irrompimento da guerra em 1914 e outros eventos “por meio do espírito santo de Deus”, e que “todos os políticos, líderes religiosos e peritos de economia… diziam ao povo o contrário”, é comprovadamente uma grosseira distorção dos fatos históricos.

Conforme explicado anteriormente, algumas dessas pretensiosas alegações foram finalmente abandonadas em 1993, no novo livro Testemunhas de Jeová — Proclamadores do Reino de Deus. O livro foi apresentado nas assembleias de distrito das Testemunhas de Jeová daquele ano como uma “visão cândida” da história do movimento. Todavia, as admissões são inseridas num contexto mínimo de informação que é, além disso, apresentada de maneira tão apologeticamente tendenciosa e deturpada que muitas vezes esconde mais do que revela.

É verdade que a Sociedade finalmente admite que Russell obteve seu cálculo dos tempos dos gentios de Nelson H. Barbour, que o tinha publicado um ano antes de Russell, “nas edições de Herald of the Morning [Arauto da Manhã], de agosto, setembro e outubro de 1875”.96 No parágrafo anterior o livro até procura alistar os expositores do século 19 que apresentaram o cálculo dos 2.520 anos em apoio da data 1914. Esta impressão é reforçada ainda mais na frase em negrito, à esquerda do parágrafo: “Entenderam que 1914 estava claramente marcado pelas profecias bíblicas.” Todavia, a apresentação da história está estritamente limitada a poucos expositores cuidadosamente selecionados, cujos cálculos são parcialmente obscurecidos, ajustados e arranjados de modo a criar a impressão de que o cálculo dos 2.520 anos apontava unicamente para 1914. Não se mencionam quaisquer das muitas outras datas finais a que chegaram os expositores anteriores a Russell. Desse modo, embora se diga que John A. Brown tenha obtido os 2.520 anos “já em 1823”, a aplicação particular que ele fez do período é completamente escondida e distorcida nas frases subsequentes:

Mas ele não discerniu claramente a data em que o período profético começou, ou quando terminaria. Contudo, relacionou esses “sete tempos” com os Tempos dos Gentios de Lucas 21:24.97

Muito pelo contrário, conforme se mostrou anteriormente neste capítulo, Brown declarou expressamente sua firme convicção de que o período dos 2.520 anos começou em 604 A.E.C. e terminaria em 1917. Ademais, embora a Sociedade tenha colocado a declaração em itálico, Brown não relacionou os 2.520 anos com os Tempos dos Gentios de Lucas 21:24, porque, conforme foi indicado antes neste capítulo, ele defendia que os tempos dos gentios mencionados neste texto eram 1.260 anos (lunares), não “sete tempos” de 2.520 anos. De modo que as duas declarações sobre o cálculo de Brown são comprovadamente falsas.

Além de John A. Brown, a Sociedade menciona no mesmo parágrafo Edward B. Elliott e Robert Seeley, ambos os quais mencionaram 1914 como uma das datas possíveis para o fim dos “sete tempos”. Na verdade, porém, ambos preferiam 1793 (mais tarde mudado para 1791 por Elliott) como a data final.98

Por fim, afirma-se que uma publicação com título não mencionado, editada por Joseph Seiss e outros apresentava cálculos que indicavam 1914 como uma data importante, “embora o raciocínio contido se baseasse numa cronologia que C. T. Russell mais tarde rejeitou.”99

Página 134 de Testemunhas de Jeová — Proclamadores do Reino de Deus (1993), o novo livro da Sociedade Torre de Vigia sobre a história da organização.

Todavia, o fato é que isto se aplica aos quatro expositores mencionados pela Sociedade. Todos eles usaram uma cronologia que datava a desolação de Jerusalém em 588 ou 587 A.E.C. (não em 606 A.E.C. como nos escritos de Russell). Brown só chegou a 1917 como a data final porque contou os 2.520 anos desde o primeiro ano de Nabucodonosor (604 A.E.C.) em vez de computar a partir do seu 18º ano, como fizeram Barbour e Russell. E os outros três expositores chegaram a 1914 por contarem desde o ano de ascensão de Nabucodonosor, que eles dataram em 606 A.E.C. (em vez de em 605 A.E.C., a data estabelecida por historiadores modernos).100

Embora todos eles baseassem seus cálculos em cronologias que foram rejeitadas por Russell e seus seguidores, a Sociedade alega que estes expositores “entenderam que 1914 estava claramente marcado pelas profecias bíblicas”. Como eles “entenderam” isso “claramente” usando cronologias que a Sociedade ainda diz serem falsas é realmente intrigante. Naturalmente, para um leitor descobrir esses raciocínios inconsistentes, teria de verificar as obras destes expositores. O problema é que os autores da Sociedade geralmente evitam dar referências específicas. Esta prática torna virtualmente impossível que a grande maioria dos leitores descubra os métodos sutis que são usados para defender interpretações insustentáveis e esconder evidência embaraçosa.

Conforme já mencionado, a Sociedade, ao contrário das afirmações passadas, reconhece no novo livro que as predições associadas a 1914 falharam. Como se mostrou neste capítulo, as predições bem específicas e claras sobre 1914 foram resumidas em sete pontos nas páginas 76-78 do Vol. II de Aurora do Milênio, publicado originalmente em inglês em 1889. Estas predições foram apresentadas lá em termos nada incertos. A discussão está repleta de palavras e frases tais como “fatos”, “prova”, “evidência bíblica”, e “verdade estabelecida”. Por exemplo, que 1914 presenciaria “a desintegração do governo dos homens imperfeitos” é apresentado como “um fato firmemente estabelecido pelas Escrituras.”101

O que faz o novo livro de história da Sociedade com as afirmações pretensiosas e com os termos bem categóricos que apareciam originalmente no contexto destas predições? Elas são totalmente atenuadas ou escondidas. Referindo-se à mencionada abordagem sobre os tempos dos gentios no Vol. II do Aurora do Milênio  mas sem citar qualquer das verdadeiras afirmações que se fizeram  a Sociedade pergunta: “Mas o que significaria o fim dos Tempos dos Gentios?” A surpreendente resposta que se dá é que os Estudantes da Bíblia “não estavam plenamente seguros do que aconteceria”!

Embora algumas das predições sejam brevemente mencionadas, a Sociedade evita cuidadosamente chamá-las de “predições” ou “profecias”. Russell e seus associados nunca “predisseram” ou “previram” coisa alguma, nunca alegaram apresentar “prova” ou “verdade estabelecida”. Eles só “pensaram”, “sugeriram”, “esperavam” ou “passaram a esperar sinceramente” que isto ou aquilo ocorreria, mas “não estavam plenamente seguros.”102 Assim as predições são embaladas numa linguagem que disfarça completamente a verdadeira natureza da ativa mensagem apocalíptica proclamada ao mundo pelos Estudantes Internacionais da Bíblia por mais de um quarto de século antes de 1914. É claro que disfarçar as predições presunçosas com essas palavras e frases vagas e despretensiosas, torna mais fácil admitir “humildemente” que elas falharam.

Notas

 1 A Fé Profética dos Nossos Pais, LeRoy Edwin Froom (em inglês – Washington, D.C.: Review and Herald Publishing Association, 1948), Vol. II, pág. 124.

 2 Embora esta profecia fale em semanas, isto por si só não significa que ela dê margem para uma aplicação do “princípio ano-dia”. Para um judeu, a palavra hebraica para “semana”, shabû’a, nem sempre significa um período de sete dias como em português. Shabû’a significa literalmente um “(período de) sete”, ou uma “héptada”. Os judeus tinham também uma “semana” (shabû’a) de anos. (Levítico 25:3, 4, 8, 9) É verdade que quando se referia a “semanas de anos”, a palavra para “anos” era geralmente acrescentada. Mas no hebraico antigo esta palavra era frequentemente omitida, por estar subentendida. Quando a referência era a “semanas de dias”, a palavra para “dias” podia às vezes ser acrescentada, como na outra passagem de Daniel em que se menciona shabû’a. (10:2, 3) Portanto, Daniel 9:24 afirma simplesmente que “setenta períodos de sete são determinados”, e a partir do contexto (a alusão aos “setenta anos” no versículo 2) pode-se concluir que “setenta períodos de sete anos” é a ideia que se pretendia transmitir. É por causa desta evidente conexão textual — e não por causa de algum “princípio ano-dia” — que algumas traduções em inglês (Moffatt, Goodspeed e outras) dizem “setenta semanas de anos” em Daniel 9:24.

3 Froom, Vol. II, págs. 195, 196.

Ibid., pág. 196. Nahawendi também contou os 1.290 dias de Daniel 12:11 como sendo um período de anos, começando com a destruição do segundo templo [70 E.C.] e chegando com isso à mesma data, 1358 E.C.

Ibid., págs. 201, 210, 211.

Horæ Apocalypticæ, E. B. Elliott, 3.ª ed. (em inglês – Londres, 1847), Vol. III, págs. 233-240.

A Escola de Interpretação Profética dos Apóstolos, Charles Maitland (em inglês – Londres, 1849), págs. 37, 38.

8 E. B. Elliott, Horæ Apocalypticæ, 3.ª ed. (Londres, 1847), Vol. III, págs. 233.

9 Ibid., pág. 240. O falecido Dr. LeRoy Edwin Froom, que foi um defensor moderno da teoria ano-dia, chegou a uma conclusão similar em sua extensa obra de quatro volumes, A Fé Profética dos Nossos Pais. No Volume I (1950), página 700, ele diz: “Até então, durante treze séculos, as setenta semanas tinham sido geralmente reconhecidas como semanas de anos. Mas os primeiros mil anos da Era Cristã não produziram quaisquer aplicações adicionais do princípio entre os autores cristãos, exceto um ou dois vislumbres dos ‘dez dias’ de Revelação 2:10 como sendo dez anos de perseguição, e os três dias e meio de Revelação 11 como três anos e meio. Mas agora Joaquim aplicava pela primeira vez o princípio ano-dia à profecia dos 1260 dias.”

10 Froom, Vol. I, pág. 716.

11 Ibid., págs. 717, 723, 726, 727. A informação aqui é baseada na obra De Seminibus Scripturarum, fol. 13v, col. 2 (conforme abordada por Froom), que foi escrita em 1205 A.D. O manuscrito é conhecido como Vat. Latin 3813.

12 Tractatus de Tempore Adventus Antichristi (“Tratado Sobre o Tempo da Vinda do Anticristo”), de Arnold de Villanova, parte 2 (1300); reimpresso em Aus den Tagen Bonifaz VIII, de Heinrich Finke (Münster in W., 1902), págs. CXLVIII-CLI, CXLVII. (Veja também Froom, Vol. I, págs. 753-756.)

13 Extraído de Registrum Johannis Trefnant, Episcopi Herefordensis (que contém os autos do julgamento de Walter Brute por heresia), conforme traduzido em Atos e Monumentos, de John Foxe, 9.ª ed. (em inglês – Londres, 1684), Vol. I, pág. 547. (Veja também Froom, Vol. II, pág. 80.)

14 Uma Plena Descoberta de Toda a Revelação de São João, John Napier, (em inglês – Edimburgo, 1593), págs. 64, 65. (Veja Froom, Vol. II, pág. 458.)

15 “A Queda do Anticristo”, G. Bell, Revista Evangélica (em inglês – Londres), 1796, Vol. 4, pág. 54. (Veja Froom, Vol. 2, pág. 742.) Embora publicado em 1796, o artigo foi escrito em 24 de julho de 1795.

16 G. Bell, Ibid., pág. 57. (Veja Froom, Vol. II, pág. 742.)

17 A Ascensão e a Queda do Papado, Robert Fleming Jr. (em inglês – Londres, 1701), pág. 68. (Para comentários adicionais sobre esta predição, veja o Capítulo 6, Seção D: “1914 em perspectiva.”)

18 “A Teoria da Guerra Hegemônica”, Professor Robert Gilpin, Revista de História Interdisciplinar (publicada em inglês em Cambridge, MA e Londres, Inglaterra), Vol. 18:4, primavera [setentrional] de 1988, pág. 606. (Ênfase acrescentada.)

19 R. R. Palmer em seu prefácio à obra de George Lefebvre O Advento da Revolução Francesa (em inglês – Nova Iorque: Vintage, 1947), pág. v.

20 Brown publicou originalmente sua cronologia num artigo do mensário londrino O Observador Cristão, de novembro de 1810. Segundo o seu entendimento dos tempos dos gentios, os “gentios pisoteadores” eram os maometanos (ou muçulmanos), e por isso ele encarava os tão frequentemente comentados 1.260 anos como sendo anos lunares maometanos, correspondendo a 1.222 anos solares. Ele contava este período de 622 E.C. (o primeiro ano da era muçulmana da Hégira) até 1844, data na qual ele esperava a vinda de Cristo e a restauração da nação judaica na Palestina. — O Anoitecer, J. A. Brown, Vol. 1 (1823), págs. vii, xi, 1-60.

21 Esperava-se que o segundo advento ocorreria durante o ano 1843/44, contado de primavera a primavera [setentrional] como se fazia no calendário judaico. Argumentou-se que os expositores nos Estados Unidos chegaram à data 1843 como sendo o fim dos 2.300 anos independentemente de Brown. Embora isso possa ser verdade, não pode ser provado, e é interessante que O Observador Cristão, de Londres, Inglaterra, um periódico iniciado em 1802 que tratava frequentemente de profecias, tinha também uma edição americana publicada em Boston, que publicava simultaneamente artigo por artigo da edição britânica. Portanto o artigo de Brown sobre os 2.300 anos poderia ter sido lido por muitos nos Estados Unidos já em 1810. Logo depois disso, a data 1843 começou a aparecer em exposições proféticas americanas.

22 Publicado em Londres; a matéria pertinente encontra-se no Vol. II, págs. 130-152.

23 Alguns talvez estejam inclinados a contestar esta afirmação, tendo em conta a tabela nas páginas 404 e 405 do livro de Froom A Fé Profética dos Nossos Pais (em inglês), Volume IV. É verdade que esta tabela parece mostrar James Hatley Frere como o primeiro a escrever sobre os 2.520 anos, em 1813. Mas a parte da tabela que está mais à direita, na página 405, intitulada “Datação de outros períodos de tempo”, não tem qualquer relação direta com a coluna “Data de publicação”, na página 404. Ela simplesmente diz qual era a posição geral do autor com respeito a outros períodos de tempo. Ademais, Frere nunca sustentou que os tempos dos gentios (ou “sete tempos”) constituem um período de 2.520 anos. Em seu primeiro livro sobre profecias, Um Exame Conjunto das Profecias de Daniel, Esdras e S. João (em inglês – Londres, 1815), ele não comenta Daniel 4 nem Lucas 21:24. A “cidade santa” de Revelação 11:2 é explicada por ele como sendo “a igreja visível de Cristo” sendo que “durante o período dos 1260 anos, a totalidade desta cidade é pisoteada pelos gentios, com exceção dos pátios interiores do seu templo.” (página 87) Muitos anos depois, Frere calculou os tempos dos gentios como um período de 2.450 anos, de 603 A.E.C. a 1847 E.C. Veja por exemplo, seu livro A Grande Revolução Continental, Que Marca a Expiração dos Tempos dos Gentios A.D. 1847-8 (em inglês – Londres, 1848). Note especialmente as páginas 66-78. É claro que John A. Brown estava bem familiarizado com os muitos escritos contemporâneos sobre profecias, e Frere era um dos expositores mais bem conhecidos na Inglaterra. Assim, não parece haver qualquer razão para duvidar da própria afirmação de Brown de sua primazia no que se refere aos 2.520 anos.

24 O Anoitecer, Vol. II, págs. 134, 135; Vol. I, págs. XLIII, XLIV.

25 Diálogos Sobre Profecia, Henry Drummond (em inglês – Londres, 1827), Vol. I, págs. 33, 34. Neste relatório das discussões em Albury, são dados nomes fictícios aos participantes. Cuninghame (“Sophron”) chega aos 2.520 anos por duplicar os 1.260 anos, e não por fazer referência aos “sete tempos” de Daniel 4 ou Levítico 26. Para apoiar isto, ele se refere à autoridade de Joseph Mede, um expositor que viveu no século 17. Embora Mede tenha sugerido que os tempos dos gentios poderiam se referir aos quatro reinos que começaram com Babilônia, ele nunca afirmou que o período era 2.520 anos. (As Obras, Mede, Londres, 1664, Livro 4, págs. 908-910, 920, em inglês.) Numa discussão posterior, “Anastasius” (Henry Drummond) associa os 2.520 anos com os “sete tempos” de Levítico 26 e, “retificando” o ponto inicial de Cuninghame de 728 para 722 A.C., ele chega a 1798 E.C. como sendo a data final. (Diálogos, Vol. I, págs. 324, 325)

26 John Fry (1775-1849) estava entre os que faziam isto, em seu livro Profecias Não Cumpridas das Escrituras, publicado em inglês em 1835.

27 Trecho encontrado na página 48 de sua obra. Citado em Froom, Vol. III, pág. 576.

28 Assim fez W. A. Holmes, chanceler de Cashel, em seu livro O Tempo do Fim, publicado em inglês em 1833. Ele datou o cativeiro de Manassés sob Esar-Hadom em 685 A.E.C., e contando os 2.520 anos a partir dessa data, finalizou os “sete tempos” em 1835-1836.

29 Edward Bickersteth, Uma Ajuda das Escrituras, publicado originalmente em inglês em 1815. Depois de 1832 Bickersteth começou a pregar sobre as profecias, o que também influenciou edições posteriores de Uma Ajuda das Escrituras. A citação é extraída da vigésima edição (Londres, 1850), pág. 235.

30 E. B. Elliott, Horas com o Apocalipse, 1ª ed. em inglês (Londres: Seeley, Burnside e Seeley, 1844), Vol. III, págs. 1429-1431. O trabalho de Elliott teve cinco edições (1844, 1846, 1847, 1851 e 1862). Nas duas últimas ele não mencionou diretamente a data 1914, embora ainda sugerisse que os 2.520 anos poderiam ser contados desde o início do reinado de Nabucodonosor.

31 David Tallmadge Arthur, “Saí de Babilônia”: Um Estudo do Separatismo e Denominacionalismo Milerita, 1840-1865 (tese de doutorado em inglês, não publicada, Universidade de Rochester, 1970), págs. 86-88.

32 William Miller, “Uma Dissertação sobre Cronologia Profética” no Primeiro Relatório da Conferência Geral de Cristãos à Espera do Advento do Senhor Jesus Cristo (em inglês – Boston, 1842), pág. 5. Outros mileritas que enfatizavam os 2.520 anos incluíam Richard Hutchinson (editor de A Voz de Elias) em um panfleto em inglês de 1843, O Trono de Judá Perpetuado em Cristo, e Filêmon R. Russell (editor do Jornal e Arauto Cristão), no número de 19 de março de 1840 desse periódico, em inglês. Os 2.520 anos também aparecem em tabelas usadas por evangelistas mileritas. (Veja Froom, Vol. IV, págs. 699-701, 726-737.)

33 “Que estive enganado quanto ao tempo, confesso abertamente; e não tenho o desejo de defender minha atuação a não ser dizendo que agi com motivações puras, e isso resultou em glória para Deus. Estou convicto de que Deus perdoará os meus enganos e erros….” (Apologia e Defesa de William Miller, Boston, 1845, págs. 33, 34, em inglês.) George Storrs, que tinha sido um dos líderes na última fase do movimento milerita, o chamado “movimento do sétimo mês,” no qual o advento fora finalmente marcado para 22 de outubro de 1844, foi ainda mais franco. Não só confessou e lamentou aberta e repetidamente o seu erro, como também declarou que Deus não tinha estado no movimento “tempo específico”, que eles tinham sido “hipnotizados” por mera influência humana e que “a Bíblia não ensina de maneira alguma um tempo específico.” (Veja D. T. Arthur, op. cit., págs. 89-92.)

34 Para uma abordagem esclarecedora sobre o desenvolvimento desta doutrina, veja A Última Trombeta. Um estudo histórico-genético de alguns capítulos importantes na formação e desenvolvimento da Igreja Adventista do Sétimo Dia, do Dr. Ingemar Lindén (em inglês – Frankfurt-sobre-o-Meno, Las Vegas: Peter Lang, 1978), págs. 129-133. Anos depois a doutrina foi modificada para significar que o chamado “juízo investigativo” dos crentes — mortos e vivos — começou em 22 de outubro de 1844.

35 Froom, Vol. IV, pág. 888. Uma discussão detalhada destas interpretações é apresentada pelo Dr. D. T. Arthur, op. cit., págs. 97-115.

36 Em 1855 um proeminente Segundo Adventista, J. P. Cowles, estimou que havia “umas vinte e cinco divisões do que havia sido antes o corpo unificado do Advento.” (Veja D. T. Arthur, op. cit., pág. 319.)

37 A História da Mensagem do Segundo Advento, Isaac C. Wellcome (em inglês – Yarmouth, Maine, Boston, Nova Iorque, Londres, 1874), págs. 594-597.

38 Evidências da Vinda do Senhor em 1873; ou o Grito da Meia-Noite, Nelson H. Barbour, 2ª ed. em inglês (Rochester, N.I., 1871), pág.32.

39 Ibid., pág. 32.

40 Ibid., pág. 33; E. B. Elliott, Horas com o Apocalipse, 4.ª ed. em inglês (Londres: Seeleys, 1851), Vol. IV; folha avulsa anexa à pág. 236. O livro de Elliott nessa época, 1860, era uma obra padrão que defendia 1866 como a época da vinda do Senhor.

41 Arauto da Manhã, de Nelson H. Barbour (Rochester, Nova Iorque), setembro de 1879, pág. 36, em inglês. Na realidade, a nova data de Barbour para o segundo advento foi adotada por um crescente número de Segundo Adventistas, principalmente da Igreja Cristã do Advento, com a qual Barbour evidentemente se associou durante vários anos. Uma razão para esta prontidão em aceitar a data 1873 foi que esta não era uma novidade para eles. Conforme Barbour indica em Evidências … (págs. 33, 34), o próprio Miller mencionara 1873 depois do fracasso de 1843. Antes de 1843, vários expositores na Inglaterra tinham finalizado os 1.335 anos em 1873, como por exemplo, John Fry em 1835 e George Duffield em 1842. (Froom, Vol. III, págs. 496, 497; Vol. IV, pág. 337) Já em 1853 o adventista da “era vindoura”, Joseph Marsh, de Rochester, Nova Iorque, concluiu, assim como outros expositores antes dele, que o “tempo do fim” era um período de 75 anos que começara em 1798 e terminaria em 1873. (D. T. Arthur, op. cit., pág. 360) Em 1870 o bem conhecido pregador do Advento Cristão, Jonas Wendell, incluiu a cronologia de Barbour no seu folheto A Verdade Presente; ou, Alimento na Época Devida (em inglês – Edinboro, PA, 1870). O crescente interesse na data fez com que a Igreja Cristã do Advento promovesse uma conferência especial de 6 a 11 de fevereiro de 1872 em Worcester, Massachussets, para se examinar o tempo da vinda do Senhor e especialmente a data 1873. Muitos pregadores, incluindo Barbour, participaram nas discussões. Conforme relatado no periódico Tempos do Advento Cristão de 12 de março de 1872, “O ponto no qual parecia haver alguma unanimidade geral era o fim dos mil trezentos e trinta e cinco anos em 1873.” (pág. 263 em inglês).

42 O Grito da Meia-Noite, e Arauto da Manhã, Nelson H. Barbour, (Boston, Massachussets) Vol. I: 4 de março de 1874, pág. 50, em inglês.

43 “A Época 1873”, N. H. Barbour, Tempos do Advento Cristão, 11 de novembro de 1873, pág. 106, em inglês.

44 A Torre de Vigia de Sião, outubro e novembro de 1881, pág. 3 (=Reimpressões, pág. 289, em inglês).

45 Esta ideia sobre a volta de Cristo foi originalmente apresentada por volta de 1828 por um banqueiro e expositor de profecias em Londres, Henry Drummond. Ela tornou-se logo muito popular entre os expositores de profecias durante o resto do século, especialmente entre os darbistas, que fizeram muito para popularizá-la. Foi muito discutida nos principais periódicos milenaristas; na Inglaterra, na Revista Trimestral de Profecia (1849-1873) e em O Arco-Íris (1864-1887), e nos Estados Unidos no Tempos Proféticos (1863-1881). O principal editor deste último periódico (que também era amplamente lido em círculos adventistas, incluindo o de C. T. Russell e seus associados) era o bem conhecido ministro luterano Joseph A. Seiss. — Um exame da origem e da difusão da ideia da “presença invisível” encontra-se na revista A Jornada Cristã (em inglês – Christian Renewal Ministries, San Jose, CA), Vol. 1:2, 1988, págs. 37-59, e Vol. 2:1, 1989, págs. 47-58.

46 A Torre de Vigia de Sião, fevereiro de 1881, pág. 3, e outubro-novembro de 1881, pág. 3 (= Reimpressões, págs. 188 e 289), em inglês.

47 Ibid., abril de 1880, pág. 7 (=Reimpressões, pág. 88), em inglês.

48 Na realidade, Barbour já tinha feito alusão a esse cálculo na edição de junho de 1875 do Arauto da Manhã, ao declarar que os tempos dos gentios começaram no fim do reinado de Zedequias em 606 A.C., embora não tenha mencionado diretamente a data final (pág. 15). Na edição de julho, ele declarou que os tempos dos gentios “continuariam ainda por quarenta anos.” Embora isto pareça apontar para 1915, as edições posteriores deixam claro que Barbour tinha em mente o ano de 1914. A edição de agosto contém um artigo sobre “Cronologia” (págs. 38-42), mas os tempos dos gentios não são discutidos. A data 1914 é mencionada diretamente pela primeira vez na edição de setembro de 1875, na qual se encontra a seguinte declaração na página 52: “Creio que embora a dispensação do evangelho termine em 1878, os judeus só serão restabelecidos na Palestina em 1881; e que os “tempos dos gentios,” ou seja, seus sete tempos proféticos de 2.520 anos ou o dobro de 1.260 anos, que tiveram início em 606 A.C., quando Deus entregou tudo nas mãos de Nabucodonosor, só terminarão em 1914 A.D.; ou daqui a 40 anos.” Uma longa discussão do cálculo foi então publicada na edição de outubro de 1875, págs. 74-76.

49 Os pais de Charles, Joseph L. e Ann Eliza (Birney) Russell, eram ambos de origem escocês-irlandesa. Eles deixaram a Irlanda durante a grande fome irlandesa de 1845-1849, quando um milhão e meio de pessoas morreram de fome e outro milhão emigrou para o exterior. Joseph e Eliza estabeleceram-se em Allegheny em 1846, onde Charles nasceu em 1852, sendo o segundo de três filhos. Como Eliza morreu por volta de 1860, Joseph teve de cuidar da educação dos filhos. Quando jovem, Charles passava a maior parte do seu tempo livre na loja de roupas de seu pai, e numa idade precoce tornou-se parceiro de negócios de Joseph. A bem sucedida companhia deles, “J. L. Russell & Son, Gents’ Furnishing Goods”, tornou-se por fim uma cadeia de cinco lojas em Allegheny e Pittsburgh. — Para notas biográficas adicionais sobre Russell, veja Apocalipse Adiado. A História das Testemunhas de Jeová, de M. James Penton, (Toronto, Buffalo, Londres: Editora da Universidade de Toronto, 1985, 1997), págs. 13-15, em inglês.

50 A Torre de Vigia de Sião, 15 de julho de 1906, págs. 230, 231 (=Reimpressões, pág. 3822), em inglês.

51 Ibid. Num “Suplemento à Torre de Vigia de Sião” de duas páginas, enviado “Aos leitores do ‘Arauto da Manhã’” com o primeiro número de A Torre de Vigia de Sião e Arauto da Presença de Cristo de 1º de julho de 1879, Russell apresenta um relato de seu encontro com Barbour e com seu associado John Paton em 1876 e sua colaboração posterior durante os três anos seguintes em espalhar a “mensagem da Colheita,” e explica porque teve de terminar a colaboração com Barbour e começar sua própria revista.

52 Isto é também indicado pelo próprio Russell, que declara: “… quando nos reunimos pela primeira vez”, ele tinha muito a aprender de mim sobre a plenitude da restauração baseada na suficiência do resgate dado por todos, assim como eu tinha muito a aprender dele sobre cronologia.” — A Torre de Vigia de Sião, 15 de julho de 1906, pág. 231 (=Reimpressões, pág. 3822), em inglês.

53 Está Próximo o Tempo, C. T. Russell (=Vol. II da série Aurora do Milênio; mais tarde chamada de Estudos das Escrituras), Pittsburgh: Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, 1889, págs. 77, 78, em inglês. Algumas das predições foram ligeiramente alteradas em edições posteriores.

54 A Torre de Vigia de Sião, 15 de julho de 1894 (=Reimpressões, pág. 1677), em inglês.

55 Ibid., 15 de setembro de 1901 (=Reimpressões, pág. 2876), em inglês.

56 Ibid., 1º de julho de 1904, págs. 197, 198 (=Reimpressões, pág. 3389).

57 Ibid., 1º de outubro de 1904, págs. 296, 297 em inglês (=Reimpressões, págs. 3436, 3437).

58 Ibid., 15 de agosto de 1904, págs. 250, 251 em inglês (=Reimpressões, pág. 3415).

59 Ibid., 15 de novembro de 1904, págs. 342-344 em inglês; 15 de junho de 1905, págs. 179-186 em inglês (=Reimpressões, págs. 3459, 3460, 3574-3579). Ênfase acrescentada.

60 C. T. Russell, Está Próximo o Tempo, pág. 169 em inglês.

61 A Torre de Vigia de Sião, 1º de outubro de 1907, págs. 294, 295 em inglês (=Reimpressões, pág. 4067).

62 Ibid.

63 A Torre de Vigia, 1º de dezembro de 1912, em inglês (=Reimpressões, págs. 5141, 5142). Como a Primeira Guerra Mundial irrompeu em 1914 e este ano foi mantido como o fim dos tempos dos gentios, o ponto inicial desses tempos precisava ser recuado um ano, de 606 para 607 A.E.C. para preservar o total de 2.520 anos. Embora alguns seguidores da Sociedade tivessem indicado este fato muito cedo (veja, por exemplo, a nota de rodapé da página 32 do livro dos irmãos John e Morton Edgar, As Passagens da Grande Pirâmide, 2ª ed. em inglês, 1924) este ajuste necessário só foi feito pela Sociedade Torre de Vigia em 1943, quando foi apresentado no livro A Verdade Vos Tornará Livres [publicado em português em 1946], página 242. Veja também o livro Está Próximo o Reino, 1953, pág. 184. Para detalhes adicionais, veja o próximo capítulo deste livro, página 92.

64 A Torre de Vigia, 1º de junho de 1913, págs. 166, 167 em inglês (=Reimpressões, pág. 5249).

65 Ibid., 15 de outubro de 1913, pág. 307 em inglês (=Reimpressões, pág. 5328). Ênfase acrescentada.

66 Ibid., 1º de janeiro de 1914, págs. 3, 4 em inglês (=Reimpressões, pág. 5373).

67 Ibid., págs. 4, 5 (= Reimpressões, pág. 5374). Ênfase acrescentada.

68 Ibid., 1º de maio de 1914, págs. 134, 135 em inglês (=Reimpressões, pág. 5450). Ênfase acrescentada.

69 Ibid., 1º de julho de 1914, págs. 206, 207 em inglês (=Reimpressões, pág. 5496). Ênfase acrescentada.

70 Ibid., 15 de agosto de 1914, págs. 243, 244 em inglês (=Reimpressões, pág. 5516).

71 Ibid., 1º de novembro de 1914, págs. 327, 328 em inglês (=Reimpressões, pág. 5567).

72 Ibid., págs. 329, 330 em inglês (=Reimpressões, pág. 5568).

73 Ibid., 1º de janeiro de 1915, págs. 3, 4 em inglês (=Reimpressões, pág. 5601).

74 Ibid., 15 de setembro de 1915, págs. 281, 282 em inglês (=Reimpressões, pág. 5769).

75 Ibid., 15 de fevereiro de 1916, págs. 51, 52 em inglês (=Reimpressões, pág. 5852).

76 Ibid., 15 de abril de 1916 (=Reimpressões, pág. 5888).

77 Ibid., 1º de setembro de 1916, págs. 263, 264 em inglês (=Reimpressões, pág. 5950).

78 Veja as páginas 58 e 59 deste capítulo. Por muito tempo depois de 1914, sustentou-se que o “tempo de tribulação” (Mateus 24:21, 22) tinha começado realmente naquele ano, mas esta interpretação foi por fim abandonada pela Sociedade Torre de Vigia em 1969. (Veja A Sentinela de 15 de julho de 1970, págs. 433-439.)

79 A Fé em Marcha, A. H. Macmillan (em inglês – Nova Iorque: Prentice Hall, Inc., 1957), pág. 48.

80 Novos Céus e Uma Nova Terra (Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, publicado em português em 1957), págs. 232, 233 (parágrafo 16). Até 1922, ou seja, por quarenta anos, os Estudantes da Bíblia tinham acreditado e ensinado que o reino de Deus começara a ser estabelecido no céu em 1878. Daí, este evento foi transferido para 1914. — Veja Está Próximo o Tempo (= Vol. II de Aurora do Milênio), 1889, pág. 101, em inglês.

81 Veja o artigo “O Nascimento da Nação” em A Torre de Vigia de 1º de março de 1925, em inglês.

82 A Torre de Vigia de 1º de outubro de 1922, pág. 298; 1º de novembro de 1922, pág. 334.

83 Do Paraíso Perdido ao Paraíso Recuperado (Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, 1959), pág. 192, parágrafos 30-32.

84 Por volta de 1929 a Sociedade Torre de Vigia ainda ensinava que “a segunda presença do Senhor Jesus Cristo começou em 1874 A.D.” (Profecia, Brooklyn, Nova Iorque: Associação Internacional dos Estudantes da Bíblia, 1929, pág. 65, em inglês.) É difícil determinar com precisão quando foi feita a transferência da segunda vinda de 1874 para 1914. Por algum tempo encontram-se declarações conflitantes nas publicações. Talvez a primeira indicação de uma mudança seja a declaração na revista A Idade de Ouro de 30 de abril de 1930, página 503 em inglês, segundo a qual “Jesus tem estado presente desde o ano de 1914.” Porém, A Torre de Vigia de 15 de outubro de 1930, diz um tanto vagamente na página 308 que “o segundo advento do Senhor Jesus Cristo ocorreu por volta de 1875.” Daí, em 1931, o folheto O Reino, a Esperança do Mundo [em inglês – Em português foi intitulado O Reino de Deus é a Felicidade do Povo], indica novamente que a segunda vinda ocorreu em 1914. E em 1932 o folheto O Que é Verdade? diz claramente na página 48, em inglês: “A profecia da Bíblia, completamente apoiada pelos fatos físicos em cumprimento dela, mostra que a segunda vinda de Cristo ocorreu no outono do ano de 1914.”

85 As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino (Brooklyn, Nova Iorque: Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, 1959), pág. 31, em inglês.

86 Citado por I. F. Clarke em Vozes Profetizando Guerra 1763-1984 (em inglês – Londres: Editora da Universidade de Oxford, 1966), págs. 66, 67.

87 Ibid., pág. 59.

88 Citado por Theodore Graebner em seu livro A Guerra à Luz da Profecia. “Foi Predita?” Uma Resposta ao Milenarismo Moderno (em inglês – St. Louis, Mo.: Concordia Publishing House, 1941), págs. 14, 15.

89 Dwight Wilson, Armagedom Agora! (em inglês – Grand Rapids: Baker Book House, 1977), págs. 36, 37.

90 Ibid., pág. 37.

91 Graebner, op. cit., págs. 8, 9.

92 Ibid., págs. 9, 10.

93 Reimpressões, pág. 720.

94 Reimpressões, pág. 899.

95 Reimpressões, págs. 1354-1356.

96 Testemunhas de Jeová – Proclamadores do Reino de Deus (Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, 1993), pág. 134.

97 Ibid., pág. 134.

98 A Sociedade Torre de Vigia não apresenta qualquer referência específica. E. B. Elliott publicou originalmente seus cálculos em Horas Com o Apocalipse, 1ª ed. (Londres: Seeley, Burnside e Seeley, 1844), Vol. III, págs. 1429-1431, em inglês. Robert Seeley publicou seus cálculos em Um Atlas de Profecia: Sendo as Profecias de Daniel e S. João (em inglês – Londres: Seeley’s, 1849), pág. 9. Veja também a nota de rodapé 30 do capítulo 1.

99 A publicação com título não mencionado é a revista Os Tempos Proféticos (em inglês). O cálculo foi apresentado no artigo “Tempos Proféticos. Uma Investigação sobre as Datas e Períodos da Profecia Sagrada”, escrito por um colaborador anônimo e publicada na edição de dezembro de 1870, págs. 177-184. O autor, nas páginas 178 e 179, apresenta 12 pontos iniciais diferentes para os tempos dos gentios, estendendo-se de 728 a 598 A.E.C., chegando desse modo a 12 diferentes datas finais, que vão de 1792 a 1922 E.C.! O ano de 1914 é a penúltima destas datas finais. O cálculo que aponta para 1914 é contado a partir do ano de ascensão de Nabucodonosor, que o autor, assim como Elliott e Seeley, fixa em 606 A.E.C. Assim, ele também seguiu uma cronologia que data a destruição de Jerusalém em 588 ou 587 A.E.C., não em 606 A.E.C. como nos escritos de Russell, ou em 607 A.E.C., como em publicações posteriores da Torre de Vigia.

100 Conforme mostrado neste capítulo, Barbour e Russell também iniciaram os tempos dos gentios em 606 A.E.C., embora defendessem que esta era a data da desolação de Jerusalém no décimo oitavo ano de Nabucodonosor. A data 606 A.E.C. não é mencionada em parte alguma do livro Proclamadores, provavelmente porque hoje a Sociedade usa 607 A.E.C. como ponto inicial. De forma que recordar aos leitores a data anterior poderia parecer confuso, especialmente para aqueles que jamais ouviram falar dela. O modo como a Sociedade, em 1944 (no livro Está Próximo o Reino [publicado em português em 1953], pág. 175) manobrou para alterar o ponto inicial de 606 para 607 A.E.C. e ainda reter 1914 como a data final, tem uma estranha história particular, que foi recontada no folheto A Sociedade Torre de Vigia e a Cronologia Absoluta (em inglês – Lethbridge, Alberta, Canadá, 1981), da autoria de “Karl Burganger” (um pseudônimo que usei na época). Veja também o próximo capítulo, págs. 90-98.

101 Está Próximo o Tempo (=Vol. II de Aurora do Milênio, mais tarde chamado de Estudos das Escrituras), Pittsburgh: Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, 1889, págs. 76-102, em inglês.

102 Testemunhas de Jeová — Proclamadores do Reino de Deus (1993), página 135.

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Imagem em destaque: Livro O Que a Bíblia Realmente Ensina (Watch Tower Bible and Tract Society of Pennsylvania), 2005, pág. 216.

2 thoughts on “A história de uma interpretação

  • março 29, 2021 em 3:10 am
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    “Atrevidos, obstinado, não receando blasfermar das dignidades; Enquanto os anjos sendo maiores em força e poder não pronunciam contra eles juízo blasfemo diante do Senhor. Mas estes como animais irracionais…blasfema do que não entendem, perecerão na sua corrupção”
    2 Pedro 2: 10-12

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  • junho 16, 2021 em 10:19 pm
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    Chutaram, chutaram e chutaram.. e a bola nem perto da grande área chegou….. especularam centenas de datas, mas ninguém se atentou para a interpretação histórica judaica do texto de Daniel 8 das 2300 tardes e manhas que não se tratavam de anos , mas sim de 1150 dias literais ou 2300 sacrifícios que não foram realizados devido a contaminação do templo pelo exército Selecucida de Antóco Epifanes em 167 a.e.c. A guerrilha judaica liderada pelos bravos Macabeus conseguiram vencer os exército Seleucida e após 1150 sem sacríficios, purificaram o templo, sendo lembrado e celebrado até hoje pela comunidade judaica na festa de Chanuká. Jesus, pelo que consta na bíblia cristã, celebrava esta festa ….JESUS NA FESTA DA DEDICAÇÃO – João 10:22-24. Nem todas as profecias bíblicas devem ser aplicadas no critírio dia/ano, quando isso acontecia, o próprio profeta indicava.
    Quando aos 7 tempos de Nabucodonosor, eram 7 anos literais aplicados a ele….vejo que contiuam fazendo uma salada com especulações apocalípticas, misturando profecas fora do contexto. Precisa ter muita imaginação para relacionar os 7 tempos (anos literais) com a profecia das 2300 tardes e manhãs, que tratavam de assuntos independentes um do outro. O resultado está aí, chutam, chutam e chutam e nada aconteceu e ainda teimam em chutar.

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