O “Terceiro Céu”

Em sua segunda carta aos Coríntios, o apóstolo Paulo fez referência ao “terceiro céu”, dizendo: “Conheço um homem em Cristo que há catorze anos foi arrebatado ao terceiro céu. Se foi no corpo ou fora do corpo, não sei; Deus o sabe.” (2 Coríntios 12:2) Foi Paulo “arrebatado” aos próprios céus, como alguns cristãos crêem? Ou poderia haver alguma outra explicação para esta experiência dele?

As Escrituras usam a palavra “céu” ou “céus” de pelo menos seis modos diferentes. Portanto, é mais importante primeiro analisar cada uso, pois isso irá lançar luz sobre o tema da nossa consideração.

Os céus físicos:

Gênesis 1:1 fala dos céus físicos, quando afirma: “No princípio criou Deus os céus e a terra.” Outro exemplo dos céus físicos é encontrado no Salmo 19:1, que diz: “Os céus declaram a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos.”

O apóstolo Paulo falou da obra criativa de Deus em Romanos 1:19,20, e disse: “pois o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. Pois desde a criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, têm sido vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas criadas, de forma que tais homens são indesculpáveis.”

A palavra céu é também usada para descrever o espaço nas proximidades de nosso planeta Terra.

Como exemplo, temos a referência de Jesus aos “pássaros do céu” em Mateus 6:26. Jesus está, obviamente, falando do firmamento. Outro exemplo disso é encontrado em 2 Reis 2:11, onde se diz que “Elias foi levado aos céus num redemoinho.” Eliseu teria visto Elias ir para o céu e desaparecer de vista. Que isso se refere apenas ao firmamento fica claro com base em João 3:13, onde Jesus disse: “Ninguém jamais subiu ao céu, a não ser aquele que veio do céu: o Filho do homem.”

Outra aplicação da palavra céus, é a dimensão invisível, a “morada” ou o “trono” de Deus.

Salmos 33:13,14 diz: “Dos céus olha o Senhor e vê toda a humanidade; do seu trono [“da sua morada”, Almeida Revisada] ele observa todos os habitantes da terra.” Salmos 2:4, afirma: “Do seu trono nos céus o Senhor põe-se a rir e caçoa deles.” E em Salmos 20:6, o rei Davi disse: “Agora sei que o Senhor dará vitória ao seu ungido; dos seus santos céus lhe responde com o poder salvador da sua mão direita.”

Uma quarta aplicação da palavra céu é em referência a uma posição espiritual muito elevada.

Um exemplo desse uso encontra-se em Efésios 2:6 que diz: “e [Deus] nos ressuscitou juntamente com ele [Cristo], e com ele nos fez sentar nas regiões celestes (literalmente “lugares celestiais”, em grego) em Cristo Jesus.” Outro exemplo é encontrado em Apocalipse 4:1, onde se diz que o apóstolo João viu uma porta aberta no céu, e ouviu uma voz dizendo: “Suba para cá, e lhe mostrarei o que deve acontecer depois dessas coisas.” Todo esclarecimento espiritual vem do céu, de Deus. As pessoas que recebem esse esclarecimento são, portanto, “erguidas” ou elevadas, em sentido espiritual.

A palavra céu é usada também como um sinônimo para o próprio Deus.

Na parábola do filho pródigo, o homem arrependido disse: “Pai, pequei contra o céu e contra ti.” (Lucas 15:18) Outro exemplo é a frequente referência de Jesus ao reino, como o “reino de Deus”, como ele faz em Lucas 4:43. No entanto, em outros momentos ele se refere a ele como “o reino dos céus”, como em Mateus 4:17. Em outras palavras, Jesus usou os dois termos como sinônimos. [1]

A última aplicação da palavra céus é em referência ao governo.

Temos um exemplo disso na Ageu 2:6,7 que diz: “Assim diz o Senhor dos Exércitos: “Dentro de pouco tempo farei tremer o céu, a terra, o mar e o continente.” (Ele explica) “Farei tremer todas as nações, que trarão para cá os seus tesouros, e encherei este templo de glória”…” Daí, o profeta mostra o que isso significa. Ele prossegue: (nos versículos 21 e 22) “… eu farei tremer o céu e a terra. Derrubarei tronos e destruirei o poder dos reinos estrangeiros. Virarei os carros e os seus condutores; os cavalos e os seus cavaleiros cairão, cada um pela espada do seu companheiro”.

O que vemos aqui é que “céus” significa os “tronos” e ‘reinos das nações estrangeiras.’ Em Hebreus 12:26,27 esta profecia é mencionada, e ainda explicada. O escritor diz: Aquele cuja voz outrora abalou a terra [no Monte Sinai], agora promete: “Ainda uma vez abalarei não apenas a terra, mas também o céu”. O versículo 27 prossegue: “As palavras “ainda uma vez” indicam a remoção do que pode ser abalado, isto é, coisas criadas, de forma que permaneça o que não pode ser abalado.” E o que  significa isso? Ele responde no versículo 28: Portanto, já que estamos recebendo um Reino inabalável…” Note-se que o que é abalado e removido é a “terra” e o “céu”.

O apóstolo Pedro abordou este mesmo ponto em 2 Pedro 3:5-7 e escreveu: “… há muito tempo, pela palavra de Deus, existiam céus e terra, esta formada da água e pela água. E pela água o mundo daquele tempo foi submerso e destruído.” (O “mundo daquele tempo”, que foi “submerso e destruído”, foi a administração governamental e os habitantes da Terra. Só Noé e sua família sobreviveram).

Pedro continua: “Pela mesma palavra os céus e a terra que agora existem estão reservados para o fogo, guardados para o dia do juízo e para a destruição dos ímpios.” O ponto que Pedro está apresentando é que, assim como Deus destruiu um ‘mundo’, um sistema, composto por pessoas e seus governantes, (terra e céu), trazendo o dilúvio, assim também em nossos dias, ele reservou este mundo para “o dia do juízo e da destruição dos homens ímpios.” Em outras palavras, assim como os “céus” e a “terra” chegaram ao fim no dilúvio, assim também o “céu” e a “terra” (atuais) também chegará ao fim, ainda que de uma maneira diferente.

Quando Isaías profetizou, dizendo: “Pois vejam! Criarei novos céus e nova terra, e as coisas passadas não serão lembradas. Jamais virão à mente!” (Isaías 65:17), ele estava profetizando a mesma coisa que Pedro disse. E para mostrar adicionalmente que os ‘céus e terra’ se referem a um sistema de “governantes” e “súditos”, Isaías disse também: (Isaías 1:2) “Ouçam, ó céus! Escute, ó terra! Pois o Senhor falou: “Criei filhos e os fiz crescer, mas eles se revoltaram contra mim.”

Por fim, quando as Escrituras falam de “mundo”, conforme o uso em 2 Pedro 3:5-7, essa palavra é traduzida da palavra grega “kosmos”. A Concordância de Strong dá como significado dela: “um arranjo ordenado” (por implicação, “o mundo em sentido amplo ou restrito.”) Em outras palavras, o “mundo” e seu equivalente “kosmos”, ao qual Pedro se referiu, na verdade consiste de um “céu” (administração governamental), e de uma “terra”, “(os que estão sob o domínio dessa administração). Antes do dilúvio, conforme Pedro mostra, isso era o que existia e posteriormente pereceu no dilúvio. E realmente significou a “destruição dos homens ímpios.” Desta forma, aquele mundo chegou ao fim. Depois do dilúvio, um novo kosmos ou mundo teve início.

Antes de prosseguirmos para identificar o “terceiro céu” é preciso considerar o aspecto das “eras”, conforme usado nas Escrituras. Em Mateus 12:32 Jesus disse que “se alguém falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado, nem neste mundo [grego: era], nem no vindouro.” (Almeida Revisada) Claramente, Jesus está falando de duas eras, ou seja, esta era, e a vindoura. Há diversos exemplos bíblicos disso.

Em Mateus 13:39 Jesus disse que “a colheita é o fim desta era”. E em Lucas 18:29,30, ele disse que aqueles que o seguem agora, terão a vida eterna na “era futura”.

Certamente, esse período antes do dilúvio foi uma era que chegou ao fim. O ‘mundo’ ou sistema atual também é composto por um céu e uma terra (as mesmas representações), os quais Pedro disse que estão sendo “guardados para o dia do juízo e para a destruição dos ímpios.” Esta é a era atual. Resta, portanto, a “era vindoura” ou a “era que há de vir”. Assim como as duas eras anteriores, ela também será composta de “céus” e “uma terra”, ou seja, uma administração, composta de Jesus Cristo, o Rei, e sua noiva, (os “reis e sacerdotes” associados), a quem ele dá autoridade para governar sobre as nações. Essas nações (a humanidade em geral), formarão a nova terra sob o domínio de Cristo Jesus, com sua “noiva” (Veja: Apocalipse 2:26,​​27, Lucas 22:28-30). Este reino “não será abalado”, conforme mostra Hebreus 12. Ele vai prevalecer, e cumprir o propósito de Deus para esta terra.

Tendo em vista o exposto, parece bem óbvio que o “terceiro céu” na verdade consiste de Jesus Cristo e sua noiva. Ademais, eles são a administração para a nova “terra”. Portanto, parece razoável supor que foi isso o que Paulo vislumbrou. Em Efésios 1:9,10 Paulo fez referência ao “mistério” (“plano secreto”, Bíblia na Linguagem de Hoje) e em seguida, explicou que haverá uma administração para “fazer convergir em Cristo todas as coisas, celestiais ou terrenas.” Essa administração (“dispensação”) é o reino de Deus sobre o qual Jesus falou enquanto estava na terra, e são as boas notícias desse reino que nós, como cristãos, devemos declarar nesta era. (Mateus 24:14).

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As referências bíblicas neste artigo são da NVI, a menos que se especifique outra versão.


N.T.: Outro exemplo é o que diz Daniel 4:26: “A ordem para deixar o toco da árvore com as raízes significa que o teu reino [o de Nabucodonosor, rei de Babilônia] te será devolvido quando reconheceres que os Céus dominam.” A referência aqui é claramente a Deus. Que Ele é o verdadeiro governante o rei Nabucodonosor teve de aprender por experiência.

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